Venancio Junior
Acho
muito engraçado quando chega uma notificação de “sugestão de amizade”. Quem
disse que eu quero ser amiga daquela pessoa? E quem disse que alguém quer que
eu seja amiga dela? É o meio mais banal e raso de se arrumar um amigo.
Conheço pessoas que fizeram amizade desta forma e se mantiveram amigas de
verdade. Também conheço casais que se conheceram pelas redes sociais e
continuam firmes e fortes no relacionamento conjugal e tem até filhos. A maneira
como se faz a amizade, de certa forma, é irrelevante, pois, nas extremidades da
rede há duas pessoas que não se conhecem e podem tranquilamente desenvolver uma
amizade profunda e até um relacionamento afetivo.
Antigamente
tinha as festas de família e de amigos, os encontros nas reuniões da igreja e
no cotidiano do trabalho que proporcionavam encontros muito interessantes.
Acontecem também os encontros casuais. Já aconteceu comigo. Uma amiga de uma
amiga estava sem dinheiro para o ônibus e, de repente, lá estava eu pagando a
passagem dela e nos conhecemos e desenvolvemos uma boa amizade. Nos dias
atuais, ter amigos é muito relativo. Basta acessar o perfil das redes sociais e
verificar se alguém está na lista de “amigos”. Na verdade, alguns poucos que
são, de fato, amigos. Os demais, a maioria talvez nem seja amigo do amigo do
amigo. Muitos querem ter o maior número de amigos nas redes sociais porque
este é o principal índice de popularidade e o meio mais eficaz para satisfazer um ego decadente. Pelo menos é esta a impressão que muitos têm de si mesmo. Tentam
afugentar o ostracismo social e, muitas vezes, espantar a tristeza e a
frustração em não ser popular. Todos buscam ser populares para justificar algo
que não fará a menor diferença no seu cotidiano. Ninguém vai perguntar o porquê
sumiu das redes sociais. Ninguém quer saber se está bem e se tem algo a
confidenciar. Quem confiaria uma confidência a alguém que se relaciona somente
nas redes sociais? Por incrível que pareça, tem muita gente expondo os seus males
no mundo virtual. Expõe o que é e o que não é de fato. Acontecem muitos
suicídios e o máximo que os outros acham é que poderia ter ajudado se soubesse
do problema. Tantos outros vivem em depressão e se distraem vendo o sucesso dos
outros nas redes e assumem a alegria alheia para si, como se no dia seguinte
nada daquela sua condição frágil existiria mais. Muitas solicitações de amizades
são aceitas com o propósito de ampliar a vitrine e se expor com verdades e
mentiras. Algumas verdades não são para serem expostas porque não interessa a
ninguém tudo o que acontece na vida. As mentiras jamais devem ser expostas
porque são mentiras e são sustentadas no vácuo emocional. É para abandonar as redes sociais e nada publicar? Não foi isto que quis dizer. Existem as exposições frívolas e outras que faz parte do compartilhar da alegria em ver os filhos crescendo ou de alguma conquista. Pode ser também o aniversário de algum familiar, uma viagem que proporcionou prazeres imensuráveis e até reencontros de familiares e, logicamente, de amigos. O que deve ser também compartilhado são exemplos de vida que faz muita diferença e que poderá ser seguido por outras pessoas não somente nos perfis, mas, aplicando nas suas próprias vidas. Isto deve ser compartilhado se não tornaremos o mundo social insuportável e as redes sociais nos permitem com muita simplicidade utilizar os meios para um determinado fim de forma ágil.
O
esforço é muito grande para conquistar pessoas para que sejam suas amigas. Quem
não tem amigos, talvez não tenha a extensão de si mesmo. Esta frase revela que
afinidades é o que aproxima as pessoas umas das outras. O diferente é
interessante, mas, no sentido de inovação e vanguarda não o contraditório. O
que nos mantém unidos, não necessariamente juntos é aquilo que gostamos de
fazer juntos. Conheço grupo de amigos que se conhecem desde criança e ainda
fazem programas juntos. Até mesmo suas novas famílias se tornaram parte do
grupo e acampam juntas, viajam juntas e comemoram aniversário juntas. Não
conheço familiares que tem esta mesma dinâmica e predisposição. No livro de
Provérbios lemos que “há amigos mais chegados que irmãos”. Este termo “irmãos”
a que o texto de Salomão se refere é irmão de sangue mesmo. Nesta época ainda
não havia o conceito de irmãos de fé.
O
que nos atrai em alguém? No relacionamento afetivo, a aparência, a princípio é
o que chama a atenção e o jeito da pessoa é o que mantém a conexão. No caso de
amizade, a aparência não importa. É fato que amigo de verdade não se escolhe,
simplesmente acontece. Manter a amizade é uma escolha e depende de inúmeros
fatores. O bom relacionamento é aquele em que não há cobrança de qualquer espécie.
Quem não gosta de estar com os amigos? Eu tenho uma frase relativa a amizade:
“Se não existe falso inimigo, será que existe verdadeiro amigo?”. Se for amigo,
obviamente o relacionamento é verdadeiro.
No
caso dos irmãos de fé, por que a amizade não é automática quando se professa a
mesma fé? A comunhão tão incentivada por Jesus não é um grau elevado de
amizade? Neste caso, a comunhão exige propensão ao sacrifício sem exigir nada
em troca. Mas, a amizade não é assim também? É, mas, a comunhão tem de se
conviver e até amar a quem não gosta sem a obrigatoriedade da convivência. Que
pena, neste ponto, a amizade vai por outro caminho. Comunhão não deve ter a motivação pelas afinidades
como a amizade, com exceção da fé. A amizade é recheada de afinidades, inclusive, constroem-se
ou descobrem-se outras afinidades juntos.
Outra
questão polêmica, quem não é amigo, então, é inimigo? Muitas pessoas aplicam
este conceito, principalmente nos dias atuais em que os relacionamentos se
tornaram líquidos. Antigamente se dizia sobre a prática da boa vizinhança.
Mesmo morando na casa ou no apartamento ao lado, isto não significa que o
relacionamento deva ser o mais estreito possível, sequer precisa ter
relacionamento. Respirar o mesmo ar não se subentende que as pessoas devam ser
próximas.
Até
mesmo Jesus tinha o seu parceiro preferido que nos termos bíblicos ficou
conhecido como o “discípulo amado”. Por que Jesus apregoando que não faz
acepção de pessoas tinha preferência por alguém? É uma questão de contexto. No
contexto de amar em cumprimento a sua missão não há diferença de pessoas. Mas,
Jesus veio como ser humano e viveu todas as agruras da sua condição humana.
Jesus tinha sentimentos, vontades e preferências. O apóstolo João,
provavelmente era o seu confidente. Eles eram tão chegados que no findar da
vida na cruz, Jesus falou para que sua mãe cuidasse de João. Será que a
predileção de Jesus era recíproca para João? Será que João tinha o mesmo grau
de sentimento por Jesus? Conforme o texto de João 13:23 em que os discípulos
estavam reunidos com Jesus que falou que um deles iria traí-lo e João estava
reclinado sobre o peito de Jesus demonstrando terem uma amizade muito íntima e
recíproca, tanto é que Pedro pediu para João perguntar a Jesus que confidenciou
a João quem o iria traí-lo. Esta profunda ligação entre João e Jesus levanta
uma suspeita e poderia ser considerada como homossexual, porém, sabendo da
postura e responsabilidade dos dois, creio ser improvável considerar este nível
de relacionamento. Da mesma forma especulativa, também existe a suspeita sobre
o nível de relacionamento com Maria Madalena da qual Jesus havia expulsado sete
demônios. Alguns afirmam que houve um affair e tudo não passa de especulação.
Voltando ao relacionamento com João, a única coisa que se sabe é sobre a
declaração de discípulo amado e o episódio do único contato físico conhecido
com os discípulos onde houve a revelação de Jesus de quem iria traí-lo.
Por que Jesus escolheu o apóstolo João para ser o seu amigo amado? Não confundir com João Batista que viveu no deserto e depois batizou Jesus. Amigo não se escolhe. É mais fácil escolher quem não se queira como amigo. Por que não escolheu um dos seus irmãos, por exemplo, Tiago que era uma pessoa inteligente e foi líder do templo de Jerusalém? Poderia ser também um outro discípulo. Dizem que Pedro era o mais chegado. Na verdade, Pedro era afoito e este ímpeto o levava sempre a estar com Jesus e por isto que transparecia mais intimidade. Os demais eram mais discretos e reservados. Este temperamento não significa distanciamento, pelo contrário, intimidade tem tudo a ver com discrição e reserva de comportamento. Para que haja confidências, é preciso que não chame muito a atenção. Por exemplo, o temperamento de uma pessoa extrovertida geralmente não consegue guardar segredos. A pessoa extrovertida é muito popular e tem mais pessoas de todos os tipos no seu círculo de amizade o que é um grande risco para confiar segredos. Já a pessoa introvertida não se expõe e naturalmente não expõe o segredo de outros. Ser introvertido não significa incapacidade de se relacionar. O círculo social deste tipo de temperamento é bem mais reduzido e poderia dizer seleto. Saiba que nada disto é regra.
É quase que impossível descobrir os
motivos da escolha de alguém para ser amigo. A escolha de um cônjuge é menos
complexa porque envolve razão e coração e a convivência exige um intencional
grau de confiança necessário para se viver a dois. A questão da amizade é mais
complicada porque não há compromisso de se conviver. A convivência é, de certa
forma, esporádica. Como confiar em alguém que não compartilha o mesmo espaço de
moradia? Como confiar em alguém sem a obrigação de se confiar e ter algum
vínculo? Na relação de amizade, ninguém vai exigir confiança um no outro.
Porque o compromisso é espontâneo e depositar confiança é uma entrega muito
arriscada.
Utilize
de todos os meios cordatos para fazer amizades, invista nelas e usufrua o
melhor que a pessoa pode oferecer e deixe que os outros também usufruam o
melhor de você. Caso nada tenha oferecer, reconsidere as amizades e a si mesmo
para não gerar fissuras na relação e emocionais. Reflita no pensamento abaixo:
“Eu não gosto de ter inimigos, mas, eles são importantes para as minhas convicções”.
Um texto inteligente, proveniente de uma mente lúcida e amigável. Aguardo com curiosidade, as próximas publicações.
ResponderExcluirmuitíssimo obrigado pela consideração ☺
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