quinta-feira, 14 de abril de 2022

AS FACETAS DE JESUS


Venancio Junior

O homem Jesus seria indecifrável, caso não se revelasse à humanidade através do processo natural do nascimento, vida e morte. Como humano, Jesus foi um ser como outro qualquer com suas instabilidades emocionais, dificuldades, necessidades fisiológicas, desejos e dores e também as suas qualidades, tais como, equilíbrio, sensatez, sabedoria e inteligência. Uma pessoa envolta ainda em mistério e a cada leitura bíblica onde se encontra a maioria dos relatos arqueológicos da sua vida, surge alguma peculiaridade sua que provoca uma busca mais aprofundada. Sempre será assim, uma fonte inesgotável de virtudes. Jesus desenvolveu o seu ministério e se envolveu em todas as camadas de atuação da vida humana. Todo este processo foi parte dos planos de Deus para o resgate sobrenatural da humanidade.

O assunto é muito vasto que permite aprofundar nos fatos, mas, o propósito desta simples reflexão é expor uma leitura resumida das principais situações envolvidas conforme o contexto bíblico nos diversos aspectos da sua vida. 

 

Jesus no contexto histórico - O filho de José (Lucas 2:4) 

Jesus nasceu num ambiente pobre. Seus pais moravam em Nazaré na Galileia e César Augusto, o imperador romano decretou um novo recenseamento e José e Maria que estava grávida foram até Belém na Judéia, porém, chegou a hora do filho nascer e não havia mais lugar na hospedaria e Jesus nasceu numa manjedoura que é o lugar onde colocam a comida dos animais. Quem governava o reino de Judá era Herodes que sabendo do ocorrido chamou os sábios e falou secretamente para saber onde estava o menino e os enviou porque gostaria de saber o local exato para que pudesse adorá-lo também. Chegando ao local onde estava o menino Jesus, os sábios o adoraram e entregaram-lhe os presentes, ouro, incenso e mirra. Estes sábios foram avisados através de revelação divina em sonhos para que não voltassem a Herodes e voltaram por outro caminho. Logo que nasceu, a família de Jesus, seguindo a orientação de um anjo, teve de fugir para o Egito a fim de proteger o seu filho recém-nascido, pois, o rei Herodes, um tirano vaidoso não aceitava que um outro qualquer fosse declarado rei. Na iminência do nascimento e já desesperado e inseguro quanto ao futuro, reuniu os principais sacerdotes e mestres da lei para saber onde exatamente nasceria o Cristo. Responderam que seria em Belém da Judéia. Parece que quem mais acreditava que Jesus seria o novo “súdito” era o rei Herodes. Porém, a sua visão era periférica, estava preocupado exclusivamente com o seu trono. Ele temia ser destituído e utilizou da sua influência real e colocou o seu exército para matarem Jesus. Como se sentiu enganado pelos sábios porque a família de Jesus conseguiu fugir, o rei Herodes mandou matar todas as crianças até dois anos em Belém numa tentativa absurda em conseguir matar Jesus. Muitas crianças inocentes foram ceifadas pela sua grande maldade. Até então, além dos seus pais, poucos sabiam do nascimento do seu filho e da importância na história. Os anjos antecipadamente falaram quem seria o menino e depois quando nasceu avisaram do perigo que estava correndo, mas, enquanto os fatos relacionados a sua divindade não começavam, Jesus era somente o filho de José e Maria. Parece que também os sacerdotes e mestres da lei não criaram muita expectativa quanto ao que estava acontecendo. Herodes foi quem, na verdade, despertou a atenção para o nascimento de Jesus. Afinal, era só um bebê e porque destacar toda uma corporação real para matar uma criança? Isto causou um alvoroço nas pessoas e começou as conversas de botequim, nas rodas de amigos e no cabeleireiro e se tornou o assunto mais importante da época. O que tinha de tão importante neste menino que nasceu em Belém, cuja família fugiu para o Egito que durante séculos era o país que escravizou exatamente o povo judeu de onde descendia Jesus? Desde o nascimento, Jesus já incomodava líderes e reinos da história. 

Com a morte de Herodes, a situação se acalmou e a família de Jesus retornou para a Galileia e pode cumprir com a cerimônia da purificação conforme a lei de Moisés para os recém nascidos. E a família se dirigiu até Jerusalém para que Jesus fosse separado e dedicado ao Senhor no templo. Havia um homem bom e piedoso chamado Simeão que o Espírito Santo havia prometido que ele o apresentaria no templo antes de morrer. Este homem cria na redenção de Israel através do Messias. Simeão pegou o menino e louvou a Deus com uma oração. José e Maria ouvindo a oração parece que ainda não tinham mensurado a importância de Jesus porque ficaram admirados com tudo que falou na oração. Havia uma profetisa viúva e idosa por nome Ana que não saia do templo e falava a todos os que chegavam ao templo sobre o menino Jesus que era a esperança de libertação de Israel. Após terminarem tudo, José e Maria voltaram para casa em Nazaré. Jesus crescia e ficava forte. Segundo relato bíblico, tinha muita sabedoria e era abençoado por Deus. Imagino que Jesus cumpria com as suas obrigações de filho e aprendeu com o pai a profissão de carpinteiro. Não se tem qualquer menção de Jesus menino, exceto o episódio do templo quando tinha apenas doze anos em que, demonstrou a sua messianidade ainda inconteste. O mais provável em não ter relatos da vida de Jesus na infância, adolescência e juventude até os seus 30 anos quando se apresentou como o Messias seja, primeiramente por não ser relevante como propósito histórico e também, como sua família morava em Nazaré, cidade com fama de pobre e distante da região central urbana e "civilizada" onde era possível ficar sabendo dos acontecimentos mais importantes e da vida das pessoas. Jesus era de família humilde e sem qualquer influência nas diversas camadas da sociedade da época e isto deixou no ostracismo esta fase do seu desenvolvimento. Mesmo sendo Jesus, criança é sempre criança. Jesus deve ter feito xixi na fralda, deve ter tido cólica como qualquer criança e deve ter tido os seus confrontamentos com seus pais como qualquer outro adolescente. Jesus era humano e deveria agir conforme a sua natureza humana, pelo menos era o que os seus pais esperavam. No episódio do templo, Jesus já tinha plena consciência de quem era, tanto é que respondeu aos seus pais que estava na casa do Pai dele. Talvez este comportamento de Jesus na conversa com os doutores da lei tenha sido um impulso natural de um menino prodígio, tal como, um garoto que chega numa festa e tem um piano e começa a tocar e todos ficam admirados, menos aqueles exímios musicistas que, nesta história seriam os doutores e mestres da lei, que se sentiram ultrapassados pelo prodigioso conhecimento do menino. Jesus era um garoto obediente, conforme o relato bíblico e ainda era uma pessoa comum neste período. Por enquanto, deveria passar incólume a sua divindade até que crescesse e se tornasse adulto onde começou, de fato, a sua missão. 

 

Jesus no contexto cultural - O Judeu (Mateus 2:5) 

Este episódio único da infância de Jesus no seu confronto com os doutores da lei judaica demonstra que a sua família seguia fielmente as tradições culturais judaicas. Participavam de festas e eventos comemorativos como uma família comum. Neste tempo, parece que o menino Jesus foi temporariamente esquecido de sua real importância. Não há qualquer relato de algum episódio que trouxesse esta lembrança. Imagine, este é o menino que o grande rei Herodes tentou matar! Absolutamente nenhum relato. Durante toda a sua vida, Jesus nunca criticou o judaísmo no seu aspecto cultural. Tanto é que seguia radicalmente os seus costumes e suas tradições. As festas judaicas eram eventos que mudavam a rotina de toda uma região composta por diversas cidades e vilarejos. As famílias se envolviam nos preparativos para estas festas. Jesus nunca confrontou os valores do seu povo até que estes costumes perderam a característica cultural e se tornaram tradições religiosas. Leia o texto de Marcos 7:9 quando Jesus adverte os fariseus e mestres da lei: “Vocês sempre estão encontrando uma maneira de por de lado os mandamentos de Deus, a fim de obedecerem as suas tradições!”. Com certeza, em meio as invencionices humanas tinham os excessos de rituais e Jesus claramente distinguiu a tradição e mandamentos. Não há críticas à tradição, mas, em substituir os mandamentos de Deus pelas tradições. Por exemplo, o primeiro milagre de Jesus não aconteceu num evento onde houve um chamamento para demonstração gratuita do seu poder. E também não foi uma ressurreição, expulsão de demônios, a cura de um leproso ou de um cego, mas, foi num contexto cultural, uma badalada festa de casamento muito animada, tanto é que o anfitrião ficou preocupado porque a festa estava no seu apogeu e o vinho havia acabado. Felizmente Jesus estava lá aproveitando também a festa e se sensibilizou com a situação e resolveu “divinamente” se manifestar. Por que Jesus começou por ali o seu ministério na prática? Era uma festa comum e ninguém sairia prejudicado ou precisava urgente de um milagre. Lógico que todos ficaram sabendo deste fenômeno. Os festeiros gostaram muito e já deve ter incluído Jesus em todas as festas como convidado cativo. Ninguém é unânime e houve aqueles que não gostaram, talvez por ciúme, inveja ou por causa da religião. Muitas delas julgam que festa não é para cristãos. Sabendo disto, os sacerdotes já tinham “chutado o balde”. Este cara não é sério, como pode usar de um poder divino por causa de uma festa? Estes confrontos eram muito “atraentes” para Jesus. Ele precisa deles para desmistificar de que Deus está muito próximo e que faz parte da nossa vida comum. Na minha interpretação, acredito que foi o extraordinário de Deus agindo no ordinário humano.  

 

Jesus no contexto social - O bom Pastor (João 10:11) 

As parábolas de Jesus são recheadas de fundamentos do cotidiano social. Jesus o bom pastor. É um tema muito famoso e que revela uma das características de Jesus. O título de pastor no contexto bíblico é inspirado na cultura pecuária dos judeus quando tinha o pastor que cuidava das ovelhas. Jesus sempre ilustrava seus fundamentos com algo que era familiar ou conhecido para os judeus. É a sabedoria de Jesus para que sua mensagem fosse melhor compreendida. Nesta época, já tinham os pobres e marginalizados pela sociedade judia. Quem mais atraia Jesus era esta classe discriminada. Ele mesmo afirmou que quem precisa de médico eram os doentes e não os que tinham saúde. Como onisciente, sabia da condição de cada um e também sabia de quem estava em busca de respostas efetivas para as suas necessidades. Estas pessoas viram em Jesus o bom pastor que necessitavam e ele as recebia no seu convívio. Quando Jesus falou da parábola da ovelha perdida, foi criticado pelos fariseus e os mestres da lei porque os que também ouviam eram os coletores de impostos e, segundo eles, as pessoas de má fama. Toda atitude de Jesus era quebra de paradigma. Qual o melhor exemplo de cuidado do que o de um pastor pelas suas ovelhas? Enfrenta leões, lobos devoradores, chuva, calor intenso, frio e outros perigos que comprometem a segurança do rebanho. Além de tudo, fornecia o alimento para o rebanho. Jesus trouxe para a sua mensagem esta metáfora do bom pastor que dá a vida pelas ovelhas. Ele próprio era o bom pastor no relato e se antecipou à crucificação dizendo que daria a vida pelas suas ovelhas. Lógico que ninguém entenderia nada ainda. Para quem está necessitado, ter alguém que se sacrifique para atender os doentes, os pobres e os famintos é fundamental para mudar a expectativa da vida resgatando a esperança. A parábola do bom samaritano também revela outra faceta do bom pastor. Não deixou literalmente à margem quem estava impossibilitado de reagir após sofrer assalto e agressão. Houve um empenho pessoal, inclusive com dinheiro do próprio bolso para cobrir as despesas do cuidado médico. Por acaso alguém conhece um pastor que utiliza o próprio dinheiro para ajudar quem mais precisa? Pastor não é um mero título, mas, revela alguém com atitude de um verdadeiro coração transformado pelo chamado de Deus. Jesus sempre teve esta preocupação com o próximo marginalizado e menosprezado. Não se importou com o que iriam dizer quando conversou no poço com a mulher samaritana que era adúltera e esta conversa teve um desfecho prodigioso quando a mulher se abriu com Jesus falando da sua vida conjugal instável. Para a sociedade da época, este episódio foi um escândalo. Primeiro que homem nenhum conversava com mulher estranha e ainda em público e Jesus já era famoso para os que precisavam dele e difamado pelos religiosos. Esta situação foi uma decisão, por sinal, intencional de Jesus que a maioria optaria em se distanciar deste tipo de pessoa. Ela era uma mulher samaritana mal vista que, além de adúltera, era de outra linhagem étnica. Um claro exemplo de inclusão através do amor. Jesus não parou por aí em confrontar os frágeis valores da sociedade e não se importou quando foi à casa de Zaqueu, um cobrador de impostos que era taxado de ladrão. Que absurdo este comportamento de Jesus! Ele sempre desafiava aqueles que ainda tinham dúvidas a quem deveriam amar e dizia que é uma atitude sem distinção social e nem de raça. No texto de Tiago 2:15 há um claro exemplo de que não se deve agir com diferença no trato com as pessoas e não adianta desejar que alguém vá em paz se ela estiver precisando de roupa e comida, tipicamente fé sem obras. Certo, isto serve para os pobres, mas, e os nossos inimigos e quem nos persegue? O principal argumento para estes casos foi, como podem dizer que amam a Deus que não vêem e não amar os seus inimigos que vêem? Nos dois exemplos trata-se de uma fé forjada. O amor é a principal característica do discípulo que esteja preocupado com o próximo. Surgiu, então, a curiosidade. Se, teoricamente, a religião de Deus o judaísmo estava sendo questionado por Jesus que se dizia o próprio filho de Deus, então, qual era a religião de Jesus? Parece que Jesus sempre estava esperando estas perguntas porque tinha resposta para todos os questionamentos humanos. Mais uma vez, desconstruiu a religião dos homens que era meramente ritualística e recheada de tradição e afirmou que a verdadeira religião são atitudes em atender os órfãos e as viúvas e não se contaminar com a corrupção do mundo. Este não é o sentido literal de qual a verdadeira religião. Os órfãos que estavam sem o cuidado dos pais e as viúvas que perderam os recursos do esposo falecido estavam, não somente dependentes financeiramente, mas, também fragilizados emocionalmente e representavam as pessoas mais necessitadas e que a demonstração de amor revelaria a religação com Deus. Este exemplo de Jesus demonstrou que a igreja na época não cumpria com o seu papel de provedor. Atualmente, a função de pastor perdeu muito do seu brilho e está muito longe do propósito original. Muitos dos pastores faz uso da igreja em benefício próprio em busca de poder e influência. Será que a igreja está preparada para receber os mendigos, as prostitutas, os homossexuais e os transgêneros? Jesus demonstrou que a igreja que está dentro da religião dos homens é a errada e a que está fora é a certa. 

 

Jesus no contexto político - O Pacificador (Mateus 22:21) 

À César o que é de César! Talvez este episódio demonstre que Jesus não era um alienado político. Em todos os episódios da vida de Jesus há a evidente confrontação com os poderes tendo sempre como base os fundamentos da mensagem de Deus. A religião oficial, o judaísmo, representada pelos sacerdotes era muito influente na administração pública e até definia quem cometeu e quem não cometeu crimes. Os mandatários nunca decidiam sem antes consultar os sacerdotes. Pelo menos naquela região da Judéia. Estes mesmos sacerdotes eram defensores da lei e questionavam Jesus de que queria mudar as leis. Jesus deu uma resposta inesperada de que não veio mudar as leis, mas, cumpri-las (Isaías 53:1 a 12). Como assim, cumprir as leis? A expectativa da religião era que o maior impacto da intervenção do Messias seria no campo político, literalmente tomando o poder de Roma ou no mínimo resgatando a autonomia política da Judéia. Eles ainda não tinham se convencido de que Jesus era, de fato, o Messias prometido para outro tipo de libertação até então desconhecida dos sacerdotes legalistas. Jesus já estava cumprindo o predito milênios antes e confundiram messias com herói e acreditavam que seria o "fiel da balança" no cenário político, se afastaram e mudaram de estratégia e agora se tornaram inimigos declarados. Quando perceberam que nada do que esperavam e queriam aconteceu, desanimaram e se tornaram os principais adversários de Jesus porque o próprio judaísmo estava correndo um sério risco de perder a sua influência política. Porém, continuavam não sendo amigos do poder público, mas, agora precisa dele para desmistificar o messias. Se os sacerdotes declarassem total independência tanto de Jesus como também do poder público, Jesus ganharia força política através do apoio popular porque tanto o imperador César, como também o rei Herodes Antipas e o governador Pilatos não tinham qualquer interesse em crucificar Jesus. Os sacerdotes agora procuravam algum questionamento para provocar um deslize. Afinal, esperavam um ativista revolucionário e que confrontasse os poderes romanos. Os sacerdotes queriam poder absoluto sobre a Judéia e queriam alguém que desafiasse o imperador romano César. A acusação, condenação e morte de Jesus foi por motivação política. O sumo sacerdote buscando evidências para a condenação de Jesus utilizou de um artífice religioso para fins políticos e perguntou a Jesus se era o Messias filho de Deus e Jesus confirmou que sim, porque não poderia negar-se a si mesmo, afinal, esta era a missão que lhe foi designada. Era tudo o que o sumo sacerdote queria e esperava ouvir e não tinha mais dúvidas na condenação de Jesus. Outra acusação que foi apresentada por Pilatos era se Jesus se declarava como o rei dos judeus e, imediatamente respondeu que era ele que dizia. Jesus havia afirmado que o reino dele estava próximo, mas, nunca se autoproclamou rei. Parece que Jesus se eximiu desta culpa, mas, o ambiente era político, as intenções da acusação e condenação eram igualmente políticas e ninguém compreenderia o significado do Reino de Deus. Confundiram tudo porque os seus seguidores queriam um rei justo e libertador e o nascimento do Messias prometido despertou este desejo e o proclamaram rei, mas, era apenas um clamor popular. Os sacerdotes que, obviamente, representavam os religiosos estavam fortemente influenciados pela política e usou a política para defender os seus interesses e não os de Deus. A política era um forte aliado e se mantiveram confiantes se opondo ao “subversivo” discurso de Jesus. Quanto à condenação de Jesus, como já havia dito, nem o rei Herodes Antipas da Judeia para o qual levaram Jesus a fim de uma posição oficial e nem o governador Pilatos que o questionou no dia do julgamento não encontraram motivos que justificasse a condenação e este último  "lavou as mãos" como demonstração de não assumir a responsabilidade na condenação.  Este gesto, na visão dos sacerdotes, deu força momentânea para Jesus e seus aliados marginalizados. Os sacerdotes achavam que era muito arriscado deixar alguém que protegia os pobres, os miseráveis e os marginalizados, tais como as prostitutas, adúlteras e ladrões influenciar a política e sair vivo deste julgamento. O que seria da religião oficial se este discurso ganhasse força com uma possível inocência de Jesus? Seriam desmoralizados, perderiam influência porque os pobres tomariam o poder. Imagine pobre frequentando o palácio e as festas sociais? Imagine pobre elegendo políticos para defenderem os seus interesses? O que diriam se prostitutas, adúlteras, ladrões, homossexuais, pobres e ladrões de repente começassem a frequentar a sinagoga?

Jesus ainda tinha uma chance remota para ser liberto da condenação através do direito de consuetudinário. Por ocasião da Páscoa, era tradição soltar um dos presos. Por forte influência dos sacerdotes e pressão popular optaram por libertar Barrabás que era um bandido muito conhecido pelas suas atrocidades.

Jesus foi condenado, morto e sepultado no túmulo cedido por José de Arimatéia que cria no Reino de Deus e foi um dos que não concordaram com a condenação de Jesus. Era um comerciante muito rico e um dos membros do Sinédrio que era a corte suprema de Jerusalém composta por anciãos, sacerdotes e escribas. Inclusive, ninguém ainda havia sido sepultado neste túmulo. Será que foi coincidência ou foi comprado exclusivamente para este fim? Segundo as escrituras, José de Arimatéia era um seguidor secreto de Jesus. Provavelmente por causa da sua posição política e empresarial não expos publicamente sua crença pelo evangelho de Jesus. Porém, a predisposição em ceder um túmulo mesmo sendo membro da corte que julgou Jesus demonstram que alguma simpatia tinha pela mensagem do evangelho.

Com a morte de Jesus, os sacerdotes ficaram temporariamente aliviados porque o messias agora só é parte da história e tudo iria continuar como gostariam. Alguns lembraram que faltava um evento neste processo, a ressurreição. Ele havia dito que no terceiro dia voltaria a vida. Isto, de fato aconteceu três dias depois conforme o próprio Jesus falou. Mas, quando chegaram no túmulo pela manhã, a pedra estava removida e o corpo havia sumido. Logo começaram as especulações para desviar a atenção deste efeito sobrenatural. Uns diziam que roubaram o corpo e o esconderam. Uma das primeiras pessoas a encontrar o túmulo vazio foi Maria Madalena acompanhada de Salomé (ou Joana) e Maria, mãe de Tiago. Jesus apareceu primeiramente a Maria Madalena que o confundiu com o jardineiro e da qual havia expulsado sete demônios e ela quem contou aos discípulos que o corpo de Jesus havia sumido. As mulheres tinham vez e voz na vida de Jesus que foi outra quebra de barreiras na exclusão de mulheres nas decisões da sociedade. Mesmo assim, os apóstolos achavam que era loucuras delas, talvez, por serem mulheres. Se fossem homens, provavelmente Pedro lembraria que Jesus havia dito que ressuscitaria. Enquanto isto, outros que ainda não sabiam da ressurreição, ficaram na expectativa de alguma evidência real que deveria aparecer. Jesus não deu “ponto sem nó” e apareceu aos discípulos em carne e osso e até Tomé teve de engolir sua arrogância em acreditar somente no que via e viu Jesus ainda com as feridas abertas na mão. O mais interessante de tudo é que mesmo após sua morte e ressurreição, Jesus teve uma conversa na estrada de Emaús com dois daqueles que estiveram no túmulo após a ressurreição, (o texto diz que não o reconheceram sem explicar a causa) e como se fosse um transeunte meramente curioso qualquer perguntou a eles sobre o que conversavam e um deles, Cleopas, respondeu triste e questionou que era (sem saber que era Jesus) o único visitante de Jerusalém que não sabia o que estava acontecendo e continuou afirmando que Jesus era um profeta poderoso em palavras e em obras. Jesus foi do tipo que gosta de saber o que andam dizendo dele por aí. E continuaram falando, a gente esperava que ele traria redenção a Israel, mas, os chefes dos sacerdotes e as autoridades o entregaram para ser condenado a morte e o crucificaram. Este relato confirma que a expectativa de muitos era política e Jesus deveria ser um revolucionário político e foi condenado e morto por motivos políticos. Um dos soldados que guardavam o túmulo, após acordar, correu para avisar o chefe dos sacerdotes que se reuniram com os anciãos para decidir qual providência tomar. Ele deve ter falado que Jesus ressuscitou porque os sacerdotes deram dinheiro para falar ao governador que os discípulos "roubaram o corpo" e não viesse a sofrer nenhuma punição. A ignorância das autoridades em relação a missão de Cristo era evidente porque esta é a versão que ainda acreditam. A atitude dos sacerdotes que conheciam a lei e não foram ignorantes quanto a vinda do Messias foi surpreendente e Jesus ficou muito decepcionado com este comportamento de quem deveria ser um aliado. Jesus sabia das intenções políticas de uma parte dos seus seguidores. Pedro era um representante desta turma e, em alguns episódios, agiu como um guerrilheiro chegando a negar Jesus numa frustrada tentativa em não ser preso para poder pensar numa estratégia que libertasse Jesus da crucificação. Noutro momento em que Jesus estava prestes a ser preso, ele pega a espada e corta a orelha de um dos soldados, sendo repreendido por Jesus que imediatamente coloca a orelha novamente no lugar. De novo Pedro interpelou Jesus quando este afirmou que seria morto e ressuscitaria no terceiro dia e Pedro insistiu que isto jamais aconteceria. Jesus repreendeu a Satanás que estava influenciando Pedro cuja atitude não refletia a Deus, mas, sim, os homens. Um comportamento político. O diabo usando da política para impedir a ação divina.

 

 

Jesus no contexto da missão - O Messias (João 4:26)

 

A finalidade de todos os aspectos antropológicos de Jesus é a sua missão divina. Jesus não veio para fazer parte da história e depois ser lembrado como alguém importante. Jesus não veio para conhecer um pouco mais da cultura e das tradições do povo. Jesus não veio para se socializar e fazer novos amigos e Jesus não veio para fazer uma revolução e assumir o poder político como acreditaram uma parcela influente dos judeus. Jesus é o Messias e veio para cumprir uma missão. Messias significa enviado. Foi enviado por Deus para trazer o evangelho de salvação aos seres humanos. Alguns dizem que Jesus é a segunda pessoa da trindade. Não é o que diz o próprio Deus em Isaias 43:10 a 12: “Antes de mim nenhum deus se formou, nem haverá algum depois de mim, eu sou o Senhor e além de mim não há salvador algum”. Não existe um deus acima e nem abaixo, nem um deus antes e nenhum depois. No livro de João 14:8 Jesus fala para Filipe que Ele e o Pai constitui a mesma pessoa. Jesus é o Salvador, então, é o próprio Deus. Na trindade não existe hierarquia. Jesus é o Messias enviado por Deus para cumprir a missão de resgate através da morte e ressurreição. “Ser enviado por Deus” é o mesmo que se tomar a forma de homem para salvar o homem. É a trindade divina empenhada pessoalmente nesta missão. A trindade, na verdade é a manifestação de um único Deus na carne em Jesus e manifestado no Espírito Santo. Desta forma, podemos afirmar que as características de Deus na sua soberania podem ser definidas como Deus-Onipotente soberano criador da existência, Espírito Santo-Onipresente em todos os lugares e em cada um daquele que o recebe e Jesus-Onisciente que sabia e sabe de todas as coisas que acontecem na nossa vida. Deus se fez humano em Jesus e o enviou para que todos conhecessem o seu Reino. Cinco profetas anunciaram a vinda no Messias, pela ordem na bíblia Isaias 9:6, Jeremias 23:5, Miqueias 5:2, Zacarias 9:9 e João 1:27. Todos sabiam da vinda do Messias, até mesmo as autoridades administrativas e eclesiásticas representadas pelos sacerdotes que, apesar da relutância em acreditar, estes não eram inocentes quanto a vinda do Messias que foi prometido por Deus. Na época do nascimento, quem falou a Herodes sobre o Messias e onde iria nascer foram os próprios sacerdotes e mestres da lei. Conforme os relatos proféticos, ele teria de ser da linhagem do rei Davi. No entanto, quem era da linhagem de Davi era José, o pai adotivo. Será que isto faz alguma diferença ou Deus quis demonstrar que a adoção é legitimamente aceitável? Afinal, também somos filhos adotados de Deus. Nem por isto perdemos o direito à herança do seu Reino. Do que Jesus falava quando se referia ao Reino? Este Reino foi prenunciado por João Batista que foi quem batizou Jesus aos 30 anos no rio Jordão. João Batista foi relutante e afirmou que não era digno. Jesus o tranquilizou dizendo que precisava ser deste jeito. Quem pode manda e quem é inteligente obedece.

Assim começou o ministério de Jesus sendo batizado com água e com o Espírito Santo cumprindo com submissão a vontade do Pai. João no seu livro primeiro dos evangelhos, logo no verso 1 do capítulo 1 afirmou que Jesus estava com Deus na criação e veio para o que era seu, mas, os seus não o receberam. Apesar de toda esta magnitude, Jesus não era prepotente e arrogante. Todas as vezes que precisava mostrar quem era, o fazia com muita sabedoria. Como não se sentir inferior diante de Jesus? De fato, somos incomparavelmente inferiores, mas, não humilhava ninguém e demonstrava um afeto muito grande pelas pessoas que percebiam a necessidade em depender de alguém de confiança. Um grande exemplo foi com o oficial do rei em Cafarnaum (isto aconteceu logo depois do primeiro milagre em transformar água em vinho). O filho estava quase morrendo e o oficial pediu a Jesus que intervisse e respondeu que o filho não morreria. Jesus disse que “se não virem sinais e maravilhas, nunca creriam”!

Como humano, Jesus demonstrou tristeza e frustração porque os que o rejeitaram foram os chamados para servir. Porém, criaram sua própria religião com suas tradições e rejeitaram os mandamentos de Deus. Esta era uma missão árdua para Jesus, será que estava animado para cumpri-la? Eu acho que não, inclusive, até tentou “negociar” com Deus esta possibilidade. Leia o conhecido texto de Mateus 26:42 “Meu Pai, se não for possível afastar de mim este cálice sem que eu beba, faça-se a tua vontade”. Jesus estava temeroso e triste, conforme Ele mesmo diz no verso 38 que “estava profundamente triste, uma tristeza mortal” como qualquer humano ficaria diante do que viria. Só fica nesta condição de tristeza alguém que esteja convicto de que a missão será cumprida. Na verdade, quem agia no Jesus humano em carne e osso era o Espírito Santo que o mantinha focado no objetivo da missão.

Após a ressurreição como últimas palavras, Jesus confirmou e findou a missão dizendo: ”...o Cristo haveria de sofrer e ressuscitar dos mortos no terceiro dia e que em seu nome seria pregado o arrependimento para perdão de pecados a todas as nações, começando por Jerusalém. Vocês são testemunhas destas coisas e envio a vocês a promessa do meu Pai”.

Jesus disse: 

"Missão cumprida!" (João 19:30)

"Vou, mas, volto!" (João 14:28)

sexta-feira, 8 de abril de 2022

JUGO CONJUGAL

Venancio Junior

Esta reflexão não tem como objetivo principal apresentar uma receita infalível para o relacionamento conjugal. A intenção é expor apenas um pilar que deve reger as relações humanas em qualquer nível que é o respeito (mesmo que um ou outro não mereça) e que deve acompanhar também após um virtual distanciamento, pois, trata-se de uma questão de educação e não de mérito. Creio que seja a única forma de se preservar um mínimo de cordialidade. A princípio, o título dá-se a entender que esteja me referindo ao peso do relacionamento conjugal. É muito utilizado neste sentido, mas, jugo é aquela peça de madeira que vai no carro de boi para que os bois andem juntos, alinhados e olhando somente para frente. Este jugo dos bois no relacionamento conjugal seria como a aliança firmada no altar quando as promessas em olhar somente para frente e no mesmo alinhamento são publicamente conhecidas pelos presentes. Afinal o que antecedeu o compromisso assumido é o que ambos igualmente sonhavam mesmo antes de se conhecerem que sempre foi o de serem felizes com alguém. Este alguém agora estava ao lado e, a frente, agora há um longo caminho a percorrer, ou não porque ainda são desconhecidas todas as diferenças um do outro. Estas diferenças podem levar ao jugo desigual durante o percurso quando duas pessoas começam a pensar diferente, caminhar em rumos também diferentes e decidirem por coisas diferentes. Existem casais que estão juntos, mas, pensam diferentes. Por outro lado, existem casais que pensam iguais, porém, estão separados. Convivência é um dos grandes mistérios da vida. Até mesmo Deus foi, de certa forma, condescendente na questão da separação para não "complicar" as coisas. Leia em Mateus 19:8 o que Jesus afirmou quando foi questionado sobre o divórcio: “... por causa da dureza dos vossos corações, vos concedeu separar-se de vossas mulheres.”. Muito antigamente quem se separava era o homem da mulher. Não há uma citação sequer sobre a mulher se separando do homem. Era uma cultura absolutamente machista. Graças a Deus que isto mudou.

A bíblia, provavelmente, teve a primeira menção do termo jugo desigual e que se refere a princípios diferentes porque, conforme neste mesmo trecho de Mateus 19 o próprio Jesus fala que o objetivo do casamento é tornar-se uma só carne. Na bíblia também tem outra aplicação do jugo que é a opressão que o povo hebreu sofreu no Egito o jugo da escravidão. Os cristãos no começo da igreja sofreram o jugo dos romanos por recusarem a imposição do império. Até mesmo Jesus utilizou esta metáfora afirmando que "...o meu jugo é suave e o meu fardo é leve" Mateus 11:30. Jesus estava se referindo exatamente ao carro de boi. Leia o contexto: "Vinde a mim todos os que estão cansados de carregar suas pesadas cargas, e Eu darei descanso. Tomai seu lugar em minha canga (carro de boi) e aprendei de mim (alinhamento), porque sou amável e humilde de coração, e assim achareis descanso para as vossas almas. Pois meu jugo é bom e minha carga é leve”. Em qualquer um dos casos conceituais do jugo, cada pessoa ou grupo tem a sua sobrecarga, porém, têm-se a opção em aceitar o melhor caminho ou não. No relacionamento conjugal tem os dois sentidos de jugo, tanto como uma peça que mantém os dois na mesma direção como também o peso da responsabilidade da vida a dois.

Então, vamos as vias de fato. De repente, duas pessoas se encontram, aspiram seus anseios e começam a fazer planos. Será que já se amam? Será que ambos já têm consciência do que está porvir ou o que este compromisso significa? A maioria das pessoas já nascem num contexto familiar em que o exemplo dos pais no tocante a estabilidade financeira e conjugal é o suficiente para uma vida a dois perfeita e que logo é idealizado na prática para os planos futuros. Crescer e amadurecer eram antecipados pelo desejo do convívio a dois. Primeira coisa é encontrar alguém que assimile as mesmas ideias. O convívio social favorece este encontro de pessoas que pensam iguais. Na teoria, o padrão de uma vida ideal não tem segredo. Basta juntar dinheiro e o resto se pensa depois ou a dois. Este era o pensamento normal, por sinal, muito simplista. Até a década de 60, principalmente as mulheres, não tinham opções quanto ao futuro, crescer e casar era o padrão preestabelecido. Lógico que as mulheres no seu íntimo, muitas vezes, tinham outros planos e desejos. Para o universo feminino, os planos pessoais ficavam apenas nos sonhos acordados porque no contexto social era secundário até ser descartado pela sua inviabilidade. As mulheres eram "formatadas" e pensar fora do que planejavam seria um erro com retaliações gravíssimas da própria sociedade. Quando ainda na fase pré-adolescente, com certeza naquelas conversas de cochichos no quarto, os pais jamais imaginavam que as meninas tinham os seus próprios desejos. Na verdade, as meninas nem cresciam direito com suas silhuetas ainda em formação e já estavam com o enxoval pronto. Nem isto elas escolhiam. Literalmente subjugadas a um sistema que não permitia liberdade de escolha.

Para os homens era um pouco diferente. Mesmo com certa liberdade para fazer o que queriam, eram também submetidos ao sistema social porque, como dizem atualmente "pensar fora da caixa" os deixavam à margem da sociedade e seriam tratados como "pessoas sem respeito". A única similaridade com as mulheres é que mal estavam em formação com a voz ainda engrossando e os pais já "empurravam" para a filha de alguém como se casar fosse a decisão mais importante do mundo. O jugo se tornava quase uma opressão propriamente dita por causa do peso da responsabilidade em prover a moradia e o sustento e para a mulher era a limpeza da casa, feitura da comida, gerar e cuidar dos filhos. Este era o padrão do relacionamento conjugal que as pessoas julgavam perfeito. Por incrível que pareça, a maioria dos casais eram felizes, mesmo que o começo não fosse como e com quem gostariam. É aquela sina de se adaptar e fazer o melhor para que tudo dê certo. A maioria dava certo enquanto outros casais, um suportava o outro. Não em dar suporte, mas, em ter muita paciência mesmo.

Quando abaixava a poeira e o inesperado agora presente no dia a dia, fechava-se a porta principal (muitas vezes era a única), a vida a dois começava de fato.

Estamos agora no tempo contemporâneo. O que mudou na vida a dois? Muita coisa em que poucas décadas atrás era inimaginável que fosse mudar desta forma. A vida a dois avançou no mínimo uns 15 anos na idade para homem e mulher tomar esta decisão da vida a dois. Agora a mulher tem direitos iguais, pensamentos iguais e poder de decisões iguais. A vida a dois não é mais exclusividade de sexos opostos, mas, ainda é maioria, porém, deixou de ser absoluta. No caso do jugo, não importa, independentemente do sexo, devem adotar os mesmos princípios na convivência a dois.

Mesmo com todas estas mudanças, inclusive com o tipo de parceiros, os problemas no relacionamento continuam a todo o vapor e ninguém, com raras exceções, se arrisca a ficar sozinho e quer muito encontrar alguém que faça a sua vida positivamente diferente. Por falar em "diferentes", quem não se lembra da frase utilizada exclusivamente na relação conjugal em que "os opostos se atraem...? e mais tarde foi acrescentada "...e se traem". Este "complemento" é uma brincadeira de coisa séria que surgiu devido ao alto índice de traição nos relacionamentos. Dentre os principais motivos estão a insatisfação e insegurança quanto ao futuro e acrescento o ciúme e estes principais e prováveis motivos podem assumir o controle da relação sem que se perceba. Um exemplo recente aconteceu entre "a dama e o mendigo", ocorrido no distrito federal quando a esposa de um personal trainer fez sexo dentro do carro com o primeiro cara que encontrou na rua, no caso, o mendigo. Porque ela teve este comportamento absurdo onde, não somente o seu casamento estava em jogo, mas, principalmente a sua dignidade? Insatisfação ou ciúme? O mais provável é que tenha sido um ataque de vingança. Nos dias atuais todos os casais correm este risco. Esta insatisfação é porque a pessoa tornou-se muito diferente da expectativa e a traição foi uma atitude isolada e involuntária? Difícil responder. Será que há mesmo uma atração maior entre aqueles que são diferentes? Será que o mendigo, de repente, tornou-se um fetiche? Faz muito sentido ser atraído por alguém diferente, mas, jamais deve ser considerado como uma regra. Uma pessoa diferente, mas, que pensa igual é até normal. Acho que depois de muito tempo convivendo juntos, o casal parece que se torna um igual ao outro e, alguns dizem que se tornam iguais até na fisionomia. A rotina diária de casa é quase preenchida com as mesmas atividades. Onde está um, o outro está também. Acho que ambos eram diferentes e a convivência foi moldando até que ficaram bem parecidos. O inverso também é possível quando a convivência os torna mais diferentes. De repente, parece que se tornar iguais seja a melhor receita para que tudo dê certo na relação.

A vida, mesmo só, não é perfeita. Agora imagine conciliar no mesmo teto e na mesma cama as diferenças naturais de cada pessoa. Absolutamente ninguém é igual ao outro por mais que a convivência desenvolva um alto grau de assimilação. Melhor que seja assim. Dependendo do ponto de vista, talvez seja fascinante observar as diferenças das pessoas, principalmente daquelas com quem se tem de caminhar juntos. Qualquer relacionamento em todos os níveis é passível de desgaste. Isto é normal. Ter consciência dos defeitos e limitações de cada um é fundamental para evitar o desgaste nas palavras mal colocadas e na falta de ação positiva para evitar decisões equivocadas.

Até agora ainda estávamos na lua de mel onde o "romantismo" teoricamente supera qualquer dificuldade e o tratamento ainda é de "amorzinho" ou "benzinho".

Creio que um dos grandes segredos da vida a dois é não se distanciar. Muitas coisas ajudam neste distanciamento, agenda, rotina que diminui o tempo a dois e as pessoas envolvidas na vida social e até familiar, dentre outras, são os principais fatores que ajudam no esfriamento da relação. Nesta situação, o necessário abraço não será tão caloroso, sequer vai acontecer nos reencontros diários. O que leva um ou os dois a se distanciarem entre si? Eu acho que já mencionei que não existe receita eficaz na vida a dois. O que deve existir sempre é o respeito, sendo este, talvez, a única base sólida que resiste a crises e ajuda muito a superá-las. O respeito não é um mérito e nem deve ser exigido e também não se impõe. Só faz uso do respeito quem é educado e tem como princípio valorizar a si mesmo a partir do outro. E não pode ser o contrário, valorizar o outro a partir de si mesmo não faz sentido, isto é egocentrismo. É um princípio que vale para todos os tipos de relacionamento e faz uma diferença muito grande no convívio com as pessoas. Preservar um ao outro também é um dos princípios do respeito. Imagine na vida onde duas pessoas convivem intimamente e as fragilidades e "defeitos" são expostos? Esta exposição tem limites dentro dos parâmetros consensuais. Mesmo neste nível de liberdade, o respeito é também peça-chave e deve ser aplicado constantemente na relação conjugal, com a família, na vida profissional e com todas as pessoas do convívio social.

Um comportamento que também "esfarela" o relacionamento é o de subestimar o parceiro(a). Pessoalmente, mesmo que a pessoa não valha alguma coisa, o respeito exige que ela seja considerada nos limites da educação. O silêncio ou não emitir opinião sobre a pessoa pode ser também uma forma de a respeitar. Não se manifestar reconhecendo as suas qualidades também pode ser um agravante que fragiliza a conta-gotas a consideração ao outro. A vida de ambos deve ser preservada mesmo que a decisão seja em não continuar juntos. Faz parte da vida e ninguém é obrigado a conviver com quem perdeu a sintonia.  Pode até continuar a ter afinidades, mas, a relação perdeu o fôlego. Isto deve ser aceito sem traumas e sem reações que causem transtornos.  Amar é também respeitar a decisão mútua ou parcial. Mas, continuando juntos, também deve ser vivida intensamente sem limites, porém, com respeito e consenso. Em I Coríntios 7:5 o apóstolo Paulo recomenda: "Não se recusem um ao outro, exceto por mútuo consentimento e durante certo tempo...".

Relação duradoura não significa que durou muito tempo, mas, que é ou foi uma relação sólida, mesmo assim, não é sinônimo de que foi utilizada uma "receita infalível". Da mesma forma não se pode adotar um autoflagelo se sentindo culpado e se perguntando "...onde foi que eu errei?" ou culpando o outro. Quem está fora sempre terá uma visão míope e não pode se intrometer incentivando ou não as decisões. Com exceção, nos casos extremos em que a integridade física e psicológica esteja em situação de risco. Muitas coisas deverão ser consideradas. Na maioria dos casos, muitos consideram de que o que foi construído deva ser preservado, principalmente a segurança emocional dos filhos (caso os tenha) e a relação deva passar por um processo de reavaliação. Noutros casos, o desgaste é tão grande que não compensa reconstruir. Deve ser "demolido" e construído sobre uma nova estrutura. Recomeçar é fundamental na vida para que haja o realinhamento futuro. É a famosa "roda viva" e começa tudo de novo porque o jugo desigual é o risco a ser evitado e o jugo conjugal deve ser sempre o ideal a ser perseguido.