terça-feira, 23 de abril de 2024

RELACIONAMENTOS ÁCIDOS

Venancio Junior

De cara já derrubo qualquer definição que espalham por aí de que seja possível viver um relacionamento com liberdade e sem a entrega. Não é possível. A partir do momento que se decidiu conviver com alguém, o óbvio é que haja uma entrega, não importando se é em maior ou menor grau. Alguma coisa de si terá de ser doada para o parceiro ou parceira. Quanto mais tempo de convivência, mais intimidade, mais envolvimento e mais entrega. A melhor forma de se relacionar é na teoria e a pior é na prática. O problema é que muitas pessoas ainda continuam no campo da teoria. Alguns para amenizar o sofrimento na prática, mantem um pé dentro e o outro fora. Mais desconfiam do que confiam na outra pessoa. Tem aquelas pessoas que preferem viver sozinhas, mas, mesmo assim não conseguem se relacionar consigo mesma e tratam as outras pessoas com rispidez. Imagine quando “invadem” a sua privacidade? Agem desta forma por insegurança e medo de que queiram algo de si.

A partir do momento que houve a entrega, será que a pessoa que recebeu um “pedaço” de você fará bom proveito? Será que você fará bom proveito do pedaço que lhe foi dado? O sentido de dar, neste caso, não é uma transferência de propriedade. É usufruir e descobrir o melhor da pessoa.

Relacionamento é a melhor e, talvez a única forma de crescimento como pessoa. Digo isto porque envolve mais dedicação ao próximo do que qualquer outra postura no compromisso com o semelhante. Não existe vida social e não existe família sem o processo do relacionamento. Na religião, não existe igreja sem o relacionamento porque a estrutura de formação é ajuntamento e comunhão.

Existem três tipos de relacionamento, sólido, líquido e ácido. Este último, inclui porque percebi que, contrariamente aos dois primeiros, existe um tipo de relacionamento em que a pessoa está envolvida por obrigação com alguém por motivos que fugiram das circunstâncias normais. Os três tipos são aplicados em todos os níveis de relacionamento, seja social, conjugal ou profissional.

O relacionamento sólido é aquele que tem raiz e mesmo diante de dificuldades, se mantêm intacto com objetivos de construir valores para continuar juntos. As pessoas envolvidas têm o mesmo objetivo e isto facilita consideravelmente a relação. Apesar da pulverização do conceito de relacionamento, ainda existem casais, amigos e familiares que se amam. Porém, tudo tem o seu limite, mesmo o relacionamento sendo sólido, não se deve deixar que o coração seja absoluto nas decisões onde mais apanha do que bate. Por outro lado, a razão é necessária para dar equilíbrio e força na construção do relacionamento. Razão e coração devem caminhar juntos e serem parceiros na alegria e na dor.

No relacionamento líquido, há meramente um compromisso, porém, sem se aprofundar não formando raiz. Geralmente a motivação é por algum interesse conveniente. Durante o tempo que permanecem juntos não se aprofundam e permanecem apenas na superfície e se dilui por falta de envolvimento. Este tipo de relacionamento em que não há envolvimento e nem consta na agenda qualquer movimento neste sentido, geralmente é movido por interesses que não visam construir pilares na relação, pois, o objetivo é apenas extrair da pessoa aquilo que lhe satisfaz, nada mais que isto. Muitas pessoas se tornam apenas úteis, inclusive, nos relacionamentos conjugais que, infelizmente, estão se tornando líquidos e quem sofre são os filhos e a sociedade. A esposa é útil porque cuida da casa. O esposo é útil porque paga as contas. Pelo menos antigamente funcionava desta forma. Este tipo de relacionamento mudou muito. A mulher tem adquirido com muito esforço e mérito o seu espaço de vanguarda na sociedade. Tem um outro ponto que, por incrível que pareça, também sofreu mudanças significativas, o ato conjugal no sexo. Alguns casais não eram criativos e se mantinham tradicionalmente em que o homem é ativo e a mulher passiva apenas para procriação. Com esta mudança de paradigma, nem tudo está perdido, ambos agora são, no mínimo, úteis um ao outro porque se descobriram no sexo.

O relacionamento ácido é o pior de todos. Muitos preferem o termo tóxico quando sufoca. Optei pelo termo ácido por causa da corrosão numa condição em que a permanência dentro do relacionamento persiste. Por algum motivo há a obrigação em se manter na relação. Alguns exemplos, no trabalho quando o superior tem um comportamento em se impor à revelia do que seja adequado ao trabalho ou o ambiente é muito carregado pelo mau humor e reclamações, a falta de reconhecimento profissional e a instabilidade no trabalho tornam o relacionamento profissional muito ácido, porém, precisa se manter porque o trabalho é fundamental para o sustento. Na vida social, um vizinho ou um familiar que não coaduna com o tipo de pessoa e que sempre está provocando e qualquer reação comprometeria outros fatores importantes nos contextos da moradia e da família. A polarização política foi o principal motivo de muitos relacionamentos se tornarem ácidos e revelou a acidez de algumas pessoas. Estas pessoas que brigaram pelas redes sociais e nos encontros familiares ainda mantêm o contato, mas, o desgaste é inevitável e não há qualquer perspectiva de uma reconsideração de ambas as partes. Muitos casais, amigos e até familiares cortaram o relacionamento porque se tornou ácido. Optaram em se distanciar a utilizar o bom senso em manter o relacionamento. Quando isto é possível, resolve o problema em não se desgastar emocionalmente que é o que mais sofre.

Outro grande problema no relacionamento ácido que, além da obrigatoriedade no compromisso, foram construídos pilares para que o relacionamento forçosamente se mantenha e a projeção no horizonte está fora de controle. Quem nunca ouviu falar que muitas pessoas, sem saber, dormem com o próprio “inimigo”. O pior deste nível é a confiança depositada o que, nesta condição, espera-se algo em troca. Como já afirmei noutra reflexão, relação é contato, mas, jamais deve ser a nível de agressão física. Nos últimos anos, temos visto nos relacionamentos que se tornaram ácidos muitos feminicídios. Contrariamente ao que se imagina, existe também o “masculinicídio” quando a mulher tem o objetivo de eliminar fisicamente o parceiro. O número é relativamente bem menor porque culturalmente o homem se julga o dominador. É diferente quando acontece por defesa pessoal em que a mulher estava sendo ameaçada. Em todo caso, estes absurdos extremos acontecem porque a relação se tornou ácida. É um termo figurado porque o ácido corrói quando em contato com qualquer superfície. Não existe matéria que resista ao ácido. É um termo apropriado porque relação é contato e não há resistência quando uma das partes perdeu o foco da construção do bom senso que é um dos pilares de sustentação do relacionamento.

Infelizmente, há relacionamentos em que não se enxerga uma solução para diluir o ácido. Existem muitas pessoas que vivem ou sobrevivem dentro de um relacionamento em que o casal perdeu a sintonia e a sincronia. O motivo em se manter dentro do relacionamento não é mais por amor e o carinho ao outro não faz parte das atitudes de afeto. Isto vale para a amizade também. No caso conjugal, alguns fatores devem ser considerados. Tem relacionamentos que se perdeu a conexão e não estão mais em sintonia. Conexão e sintonia mesmo similares, são coisas diferentes. Para que haja sintonia é preciso ter a conexão. Enquanto sem a sintonia, a conexão perde a razão de ser. Wi-fi é uma conexão que viabiliza a sintonia com as redes socais. Mesmo não sintonizando o conteúdo digital, isto não significa que esteja sem conexão. No relacionamento, o ambiente é a conexão. O propósito é a sintonia. É possível sobreviver num relacionamento ácido porque ainda compartilham o mesmo ambiente, porém, estão fora de sintonia nos objetivos. Resolver esta questão é uma decisão muito pessoal. Cada pessoa deve considerar os ganhos e perdas. Ninguém merece viver uma vida onde as frustrações sejam incessantes. Cada pessoa tem o direito de ser bem-sucedido nas esferas da vida que o envolve. Por isto que falei sobre a razão e o coração, um dando suporte ao outro. Tem situações que, numa eventual e momentânea crise, o coração precisa se antecipar e realinhar o relacionamento. A razão deve entrar em campo quando a situação se tornou insustentável e não se consegue encontrar um denominador comum para que a sintonia seja restabelecida. O desgaste é o pior fator a ser considerado e deve ser interrompido imediatamente ao ocorrido. Feridas estão abertas e as chances no processo de cicatrização serão bem maiores quando se corta o mal pela raiz.

segunda-feira, 22 de abril de 2024

MINISTÉRIO PASTORAL E SUAS IMPLICAÇÕES

Venancio Junior

Que saudade dos tempos em que a figura do pastor era exclusivamente sacerdotal. Sempre procurava saber dos problemas dos fiéis para poder ajudar no que fosse preciso. Literalmente carregava a carga e abastecia a despensa dos pobres, visitava os doentes, visitava também aqueles que estavam presos e se envolvia com a dor do próximo. Ultimamente, muitos pastores se tornaram celebridades, famosos e com evidência nas principais mídias sociais. Quanto maior a visibilidade, maior será a propensão a críticas e difamação (alguns com razão). Muitos deles se tornaram empresários da fé, tantos outros estão envolvidos em escândalos financeiros e sexuais e uma parcela influente destes líderes se empenham em serem militantes políticos radicais.

Como filho de pastor, fico muito tranquilo em relação ao trabalho do meu pai. Conhecendo as suas histórias através de relatos daqueles que presenciaram e das fotos antigas, vi que sua trajetória pastoral foi de muitas dificuldades, passando até fome e, muitas vezes não possuía os recursos para o sustento da família. Morreu sem deixar bens e recebia de aposentadoria um mísero salário-mínimo da previdência porque nunca pensou em si mesmo e ninguém pensou nele também no sentido de ampará-lo quando não pudesse mais exercer a nobre missão do Ide. Ministério significa servir e serviu do começo ao fim da vida sem reclamar e glorificando a Deus. A riqueza do seu trabalho foi servir as centenas de famílias reestruturadas e encaminhadas para também servir a outros com a mesma visão altruísta que sempre lhe acompanhou.

Quando alguém decide seguir a vida ministerial eclesiástica, aqueles que são sérios em suas ambições, não tem um propósito profissional que, muitas vezes nem há esta associação. A mente está focada em servir a Deus ajudando as pessoas nas suas dificuldades. Vida ministerial é o amparo as famílias, não somente na questão do evangelho, mas, também, o fortalecimento na vida social, profissional e psicológica. Independentemente da classe social, todos precisam de apoio de alguém de confiança. As pessoas ainda confiam nos religiosos porque estes se colocam como enviados de Deus. Infelizmente, alguns se aproveitam desta confiança e abusam de forma a favorecer somente os seus interesses. Servir é sempre a dedicação ao outro e jamais as pessoas devem servir ao pastor ou a qualquer outro líder religioso. O sacerdote tem como prerrogativa principal servir a todos sem distinção. Neste processo, diante de tantas dificuldades e sem o apoio necessário, muitos desistem em prosseguir no ministério e tantos outros até cometem suicídio. O índice tem crescido assustadoramente e não tenho visto a disposição das principais lideranças em amparar estas pessoas e suas famílias que sofrem da mesma forma. Os desafios são diários e de grande vultuosidade e não consta na agenda qualquer iniciativa em discutir esta questão com seriedade que o caso merece. Por mais urgente que seja a iniciativa, já chegará com muitos anos de atraso. O problema não é recente. Os pastores também sofrem privações, tem problemas financeiros, emocionais, conjugais e também com os filhos que todos exigem que sejam exemplos.

O que diz a bíblia sobre o exercício sacerdotal? Jesus designou atribuições aos apóstolos que seria primeiramente lançar os fundamentos do evangelho para composição da igreja. Estas atribuições vão muito além da simples pregação do evangelho o que implica assistir as pessoas nas dificuldades que envolvem qualquer família. Relacionamento, emprego, moradia, saúde e até educação secular. Havia esta preocupação. Meu pai fundou algumas igrejas e em anexo fundava uma escola de alfabetização. Nos anos 40 e 50 havia muitos lugares remotos, principalmente rurais em que a educação pública não chegava e muitos filhos chegavam na idade escolar sem aprender a ler e escrever. Os pais já vinham de uma estrutura de trabalho braçal difícil e muitos eram analfabetos. Este espaço de apoio às famílias era ocupado pela igreja cristã. Porém, a maioria dos pastores não tinham esta visão e se preocupavam tão somente com o ensino religioso. As dificuldades eram muitas e atingia todos os membros da família. O que alguns pastores faziam quando não tinha uma solução, amenizavam com promessas de que Deus proverá e a vida futura no céu não haveria estes sofrimentos. É uma maneira de se desvencilhar da responsabilidade social sem se envolver com o sofrimento. Falar do evangelho para quem tem fome é falta de conexão. Da mesma forma que falar do evangelho para quem esteja sofrendo com dores de alguma enfermidade também não terá o retorno esperado. O evangelho é íntegro e abrange todas as questões que envolvem as pessoas. Leia o texto de Mateus 25:35;36 "Pois eu tive fome, e vocês me deram de comer; tive sede, e vocês me deram de beber; fui estrangeiro, e vocês me acolheram; necessitei de roupas, e vocês me vestiram; estive enfermo, e vocês cuidaram de mim; estive preso, e vocês me visitaram". Jesus falava no templo sobre a parábola das ovelhas e dos bodes. Enquanto as ovelhas desempenhavam a atribuição pastoral, os bodes não se moveram. Perceba que Jesus abrangeu os aspectos básicos da vida humana. Isto é o evangelho puro e simples. Atualmente a contextualização ainda se faz necessária. Existem muitos membros pobres de igrejas ricas. Frequentam as reuniões ordinárias da igreja utilizando transporte público pagando do próprio bolso. Muitas famílias não têm os recursos para uma refeição adequada. Estas famílias possuem um número de filhos fora do normal e vivem com muito sacrifício, inclusive, o esforço em manter a frequência à igreja. O que os pastores têm feito para se atualizar sobre as dificuldades dos seus membros? Não somente na questão social, muitos membros não passam fome e vão de condução própria à igreja, porém, tem outras dificuldades. O pastor deve estar próximo das pessoas, não de forma invasiva, mas, numa posição em que elas não sintam que a liberdade esteja sendo violada.

Jesus não se intrometia na vida das pessoas, pois, o seu envolvimento era “cirúrgico” e intervia diretamente nas dificuldades emergentes de cada um. Jesus não se intrometeu na vida do aleijado que foi curado próximo do poço. Jesus não se intrometeu na vida da família de Jairo e curou a sua filha. Jesus não se intrometeu na vida mulher adúltera e fez o diagnóstico preciso da sua vida. Jesus não se intrometeu na vida de nenhum dos seus apóstolos, mesmo na vida de Pedro em que curou a sua sogra. O foco de Jesus era se envolver naquilo que seria mais difícil e até impossível que é a ressurreição de mortos.

Se fizer uma analogia da vida de Jesus e das atividades desenvolvidas pelos apóstolos, será facilmente perceptível que a vida atual dos pastores mais conhecidos nada tem a ver com ministério. Brigam para não pagarem impostos, sendo que devemos dar a César o que é de César. Afinal, os dízimos e ofertas são oriundos de rendimentos em que os impostos foram recolhidos diretamente na fonte. Igreja não deve ter lucro. A responsabilidade da igreja é expor o evangelho na sua integralidade. O evangelho não serve somente para o Reino futuro, mas, deve acompanhar a vida cotidiana das pessoas e ir de encontro às suas necessidades. A perspectiva destes pastores destas mega igrejas é que as pessoas devem servir a igreja. Já a perspectiva dos pastores sérios e comprometidos com o Reino de Deus é de que a igreja deve servir às pessoas, pois, elas compõem a igreja. Sem as pessoas, não existe igreja. Não se trata dos templos luxuosos, a igreja é formada pelas pessoas e a elas deverão ser dedicadas todas as atribuições que a elas foram incumbidas. Lembrei de um caso em que uma incorporadora comprou um quarteirão inteiro para construir duas torres de condomínios e um dos imóveis era exatamente uma igreja evangélica. Todos os moradores venderam as suas casas que um dia fora um sonho e a vida seguiu seu rumo para cada um destes moradores que venderam as suas casas, com exceção da igreja que não foi adquirida porque o pastor não quis vende-la. Como era minha rotina pedalar naquela região, um dia vi o pastor em frente a “sua” igreja e perguntei se não venderia para a incorporadora, de pronto me respondeu que não venderia a propriedade da igreja. Daí, veio à mente de que o pastor estava preocupado com o patrimônio físico da igreja que poderia sofrer uma grande valorização ou a igreja poderia encher com os futuros vizinhos. Os condomínios estão sendo construídos e a igreja ficou literalmente espremida em meio as duas imensas torres. A igreja não é o prédio e nunca foi as quatro paredes que a abriga. Deus nunca habitou no prédio. O templo é o nosso corpo onde Deus habita. Quem deseja buscar e encontrar Deus deve olhar introspectivamente para si e permitir que Deus o habite. O pastor perdeu a visão ministerial em servir as pessoas daquela incorporadora e dos futuros moradores do condomínio. O templo atrapalhando a configuração do condomínio tornou-se uma pedra de tropeço e os olhares não serão de simpatia aquela decisão egoísta e dificilmente alguém terá interesse em adquirir o templo se houver uma mudança de planos para venda ou se tiver que ampliar a capacidade da igreja. Faltou-lhe a visão ministerial em servir e se limitou a agir conforme a sua visão pseudo-empresarial.

Infelizmente também, muitos dos pastores atuais não sabemos onde foram consagrados e como aconteceu o chamado ministerial. Alguns mais soberbos se autointitulam Bispo primaz e apóstolos como se ordenança ministerial fosse uma hierarquização de títulos. Não basta ser pastor que consideram como algo muito pequeno para as suas aspirações, tem de ter um título nobre que reflita a sua vaidade em se posicionar acima de todos. As redes sociais facilitaram a proliferação destes empresários da fé. Muitos nem tem igreja física e se limitam a conquistar seguidores pelas redes sociais. Hoje em dia a preocupação não é mais quantos membros possui a igreja, mas, quantos seguidores possui a sua igreja virtual. A maioria não tem compromisso com o Reino de Deus e expõem um evangelho para um povo com ausência de senso crítico e que gostam apenas de fazer parte da multidão. Desconhecem a palavra de Deus e a trata como “evangelho Frankenstein”, pegam um pedaço aqui e junta com outro pedaço ali e formam o seu próprio “evangeliquês” completamente desfigurado. Paulo escrevendo a sua carta a Timóteo orientou: "Procure apresentar-se a Deus aprovado, como obreiro que não tem do que se envergonhar e que maneja corretamente a palavra da verdade" II Timóteo 2:15. Resumindo, Paulo afirma que o pastor deve ter uma vida íntegra com um caráter exponencial e conhecimento correto da palavra de Deus para conduzir a igreja. Se procurarmos estas qualidades nos pastores atuais, com certeza, a maioria será reprovado.

segunda-feira, 15 de abril de 2024

BANCO MERCANTIL DA FÉ

Venancio Junior

A fé se potencializa quando se é abençoado? A fé permanece mesmo sem ser abençoado com o que se queira? A fé é uma troca de favores com Deus? Por que Deus diz para que o prove no exercício da fé? Por que ainda existem tantos questionamentos a respeito da fé? Qual seria o maior referencial de fé?

Considerando que o relacionamento com Deus é algo intimamente pessoal, fica difícil caracterizar a fé de forma que se possa demonstrar uma única perspectiva que contemple a todos. A única característica que é comum é a questão de que sem fé é impossível agradar a Deus. Sem a fé é impossível conhecer a Deus e saber que exista. A forma como se aplica é o grande questionamento.

A fé tem sido utilizada até como forma de ápice no relacionamento com Deus. O justo vive pela fé. Este trecho de Romanos 1:17 traz uma suavidade no uso da fé. Quem seria justo ou quem se julga justo? O justo é aquele que foi justificado em Cristo. Até chegar neste ponto, há um longo e penoso caminho a seguir. Tem muitos exemplos de alegria das conquistas pela fé. Neste contexto, não ficaria difícil afirmar que a pessoa abençoada é alguém cheio de fé. O inverso desta situação também é real quando a fé é confrontada e não se enxerga uma luz no horizonte sombrio. As dificuldades emergem de todos os lados e o uso da fé para mudar uma situação trágica não tem surtido o efeito bíblico. Afinal, lemos que a fé é a certeza das coisas que se espera (Hebreus 11:01). A tradução pode estar certa, a interpretação que pode estar equivocada. Quando Deus permite que as coisas aconteçam como desejamos, é desta forma que acontece porque permitiu que assim o fosse. Muitas vezes Deus não (co)responde às nossas expectativas da fé. Por que, então, Deus desafiou para que o provasse (Malaquias 3:10)? Esta foi uma profecia contra Judá e Deus queria manter a relação com o seu povo escolhido que estava se tornando descrente e rebelde. Um grande equívoco que se faz é retirar o texto e aplicá-lo numa situação qualquer que nada tem a ver e ainda acusar Deus de que prometeu abençoar. Não conheço alguém que tenha retirado o texto em que Estevão estava sendo apedrejado e ele se manteve fiel em meio ao sofrimento. Se Estevão questionasse a Deus sobre aquela situação, estaria coberto de razão, porém, estaria utilizando a perspectiva humana da fé. A fé não é mercadoria de barganha que está disponível no balcão como um produto qualquer em que para ser abençoado basta ir à igreja e buscar.

O mundo religioso tem algo em comum, a fé. Todos falam que o exercício da fé é necessário para ser bem-sucedido. Não podemos negar que o mundo atual tem conhecimento da fé cada um do seu jeito e exerce a fé nas mínimas coisas. É um mundo literalmente conectado digitalmente e também pela fé. O acesso às informações trouxe muitas facilidades, porém, aumentou as dificuldades em saber qual é a verdade sobre muitas coisas, incluindo neste pacote, a fé. Não importa qual deus que se creia, a fé é o ponto convergente nas práticas religiosas. Cada segmento religioso fala de um formato diferente de fé e também são diversas as práticas que são aplicadas. Muitos acreditam que, quanto maior o sacrifício, maior é a investidura da fé e maior e mais rápido será o retorno daquilo que se busca. Por exemplo, carregar uma cruz pesada por kilometros, caminhar uma longa distância descalço, praticar o auto-flagelo com chibatadas nas costas e tantas outras invenções que são meramente humanas e não estão na bíblia nada tem a ver com fé. Alguns defendem de que as pessoas não são abençoadas porque não utilizam da fé corretamente. Estes apresentam a fé como um produto e que não vem com um manual de instruções legível e se aproveitam disto e da ingenuidade das pessoas para conquistar a confiança. A associação da fé com o dinheiro é o que os oportunistas mais utilizam para atingir os seus objetivos. Eles nunca falam sobre o Reino de Deus porque ignoram o propósito do evangelho e perderiam muitos dos seus seguidores. Até citam alguns trechos isoladamente falando de um reino palpável, porém, a perspectiva é totalmente errada porque não é comida e nem bebida, mas, justiça, paz e alegria do Espírito Santo. Abordam sempre aquilo que as pessoas precisam de imediato, comida, emprego, ficar rico ou deixar de ser pobre e satisfazer os prazeres que a propaganda mal-intencionada induz na mente das pessoas. Satisfação imediata é a palavra-chave para conquistar a atenção e a fé é muito mais do que simplesmente acreditar. Há diversas referências de fé na bíblia. O texto de Tiago 1:3,4 talvez reflita melhor a jornada da fé. "...sabendo que a provação da vossa fé, uma vez confirmada, produz perseverança. Ora, a perseverança deve ter ação completa, para que sejais perfeitos e íntegros, em nada deficientes". Quando se fala em fé, a provação, a princípio, nada tem a ver com receber bençãos. Então, aquele conceito de que a fé é para apenas receber e nunca se dispor é um erro que a maioria dos “fiéis” cometa. Muitos abandonam a fé por causa da frustração em não ser abençoados. A perspectiva humana da fé é absolutamente frustrante. A única prática associada à fé é a perseverança.

Como exercer a fé conforme o texto de Tiago diante de um mundo libertário e libertino, religiosamente pluralista e os mais radicais são categorizados como extremistas fanáticos? Parece que não sobrou espaço que permita um posicionamento sem que as fagulhas deste mundo confuso atinjam o manto da integridade cristã. Optei pelo processo involutivo daquilo que conhecemos como fé. Aqueles que tiveram pela tradição familiar contato com a fé cristã, sempre ouviu falar que o pai da fé é Abraão. Os apóstolos Paulo e Tiago apresentam esta declaração nas suas cartas no Novo Testamento. Na verdade, todos aqueles que tem um relacionamento com Deus podem ser considerados como exemplos de fé. Nenhum destes utilizaram da fé como barganha. Tem alguns episódios bíblicos que tentaram saber quanto custava a fé. Em Samaria, onde João e Pedro evangelizavam havia um mágico por nome Simão. Muitos acreditavam que os seus dons eram divinos, pois, também fazia mágicas travestidas de milagres. Ele creu e foi batizado e acompanhava os apóstolos e se admirava com os milagres que aconteciam nas pessoas através da imposição de mãos. Como ainda faltava um bom caminho para a sua transformação, ficava com inveja desejando os dons perguntando aos apóstolos quanto custaria aqueles dons e Pedro logo lhe repreendeu: “Que o seu dinheiro seja destruído junto com você, pois você pensou que com ele poderia adquirir o dom de Deus!” (Atos 8:20). Pedro alegou que o coração de Simão não era reto diante de Deus e não basta frequentar a igreja e ser batizado para se ter fé, é preciso integridade diante de Deus. A fé é o adubo dos frutos do espírito. A fé nunca foi uma moeda de troca para conquistar bens e alimentar a vaidade das pessoas. Ao acessar as redes sociais ou a televisão assistimos centenas de programas religiosos falando de uma fé estranha àquilo que a bíblia ensina. Fé do dízimo, fé da cura de doenças incuráveis, fé de ter a sua casa, fé para se ter uma casa ou emprego melhores, fé para conquistar muitos bens ou fé para ter uma igreja mais cheia. Eu creio em tudo isto, mas, antes de aplicar a fé, precisa saber quais são os pilares desta fé. A primeira coisa que a fé nos exige é reconhecer a soberania de Deus. Diante disto, não faz sentido que a fé esteja ao seu dispor naquilo que lhe convir. A vontade de Deus é soberana, além do mais, é perfeita, boa e agradável. Tudo o que se fala sobre fé tem princípio em amar a Deus acima de todas as coisas. Buscar o Reino de Deus em primeiro lugar e as demais coisas serão acrescentadas. A característica principal e maior da fé é o relacionamento com Deus. Isto não significa que tudo acontecerá conforme a nossa limitada visão. Pessoalmente tenho muitos questionamentos com Deus. Aconteceram algumas coisas que ainda são inexplicáveis e somente pela fé é que se consegue avançar na caminhada. Se eu continuar aguardando, na minha visão, uma resposta clara de Deus, ficarei estacionado. A fé diante da provação, das dificuldades e contrariedades é que me faz crescer no relacionamento com Deus se eu perseverar.

O propósito soberano de Deus é que alcancemos a graça pela fé. Nunca pelo nosso esforço, mas, sempre pela sua iniciativa em ser amplamente gracioso. Sofremos as consequências do pecado que está em nós. Nem tudo o que desejamos alcançamos porque este tudo que precisamos é da graça de Deus. O apóstolo Paulo já disse que bastava a graça de Deus. Ele sofria muito com doenças e espinho na carne que nunca foi revelado o que era. Foi preso, sofreu muitas privações e mesmo assim afirmou com humildade que a graça bastava porque a visão dele era com o Reino de Deus. Muitas vezes se usa a metáfora daquilo que valorizamos para se ter uma noção do que é composto o Reino vindouro. Nada é comparável, pois, as nossas preciosidades são matérias que são consumidas pelo tempo e o ser humano é que colocou valor. Por causa do pecado perdemos o valor e Deus, através de Jesus Cristo ressignificou o nosso valor para que herdássemos pela fé o seu Reino. Alguém, por acaso já ouviu um destes mercadores da fé falar sobre os valores do Reino de Deus? Estes valores não interessam a eles. A contraproposta do evangelho não se compra, pois, é o dom gratuito de Deus que é a vida eterna com Cristo. Todas as promessas de Deus e as propostas de fé apresentadas na bíblia são para alcançar o maior tesouro que é a vida eterna.

segunda-feira, 8 de abril de 2024

SEXO E FÉ SEM COMPROMISSO

Venancio Junior

O sexo sem compromisso todo mundo conhece e muitos praticam a cada dia esta forma de se satisfazer sem aquela obrigatoriedade do relacionamento que envolve mudanças no estilo de vida. Qualquer mudança exige sacrifício de ambas as partes. Relacionamento exige que se entregue no mínimo um pouquinho a outra pessoa. Não tem como ser bem-sucedido no relacionamento, caso não haja esta entrega. Porém, muitos se entregam quase de corpo e alma gerando uma total dependência. É uma forma de se acomodar e deixar as preocupações com o outro(a).  A forma que encontraram para não gerar esta dependência é exatamente manter aquilo que gostam de fazer juntos sem a obrigatoriedade do compromisso. Tem casais que tem um relacionamento aberto em que cada um pode fazer sexo com outros, independentemente do gênero. Alguns ainda se mantem parcialmente “conservadores” e exigem fidelidade a dois somente. O problema é saber o que o outro fará com aquela parte de você que foi entregue.

A sensualidade é um dos sentidos mais sedutores na composição da natureza. Quem pensa que somente seres humanos e animais praticam sexo está enganado. A vegetação se reproduz também através do ato sexual. Cada espécie do seu jeito conforme a sua estrutura natural. Esta forma de reprodução e prazer foi criada por Deus. No livro de Gênesis lemos Deus ordenando “Sejam fecundos...”. noutras palavras seria o mesmo que dizer “Façam sexo...”. não tem como ser fecundo sem o ato sexual. O sexo é uma benção. Chega a ser um envolvimento espiritual porque a sensação do orgasmo é inexplicável.

O maior problema do relacionamento sexual é que atualmente os seres humanos se relacionam tal como os animais. Deu vontade e se há desejo mútuo, então, está valendo. Alguns malfeitores praticam o sexo sem consentimento que é o estupro. Uma agressão absurda e que merece toda a punição possível para quem a pratica. Observo que intimidade não é para ser compartilhada com qualquer pessoa e de qualquer jeito. Há muita coisa a se considerar e também preservar principalmente quando se envolve compromisso.

Da mesma forma que o sexo, a fé não existe se não houver relacionamento e também requer compromisso. Relacionamento em que não há comprometimento se torna algo vazio sem propósito e sem construção de valores. Perde-se totalmente o sentido quando isto acontece desta forma. O mundo se perde a cada dia por causa desta falta de compromisso tanto do sexo como em relação a fé. Esta fé que a maioria pratica hoje em dia é vazia e despropositada do real sentido em que não há entrega quando se exige sacrifício. A fé é uma construção onde há fundamento e propósito com alguém que é o princípio e o fim de todas as coisas. Deus é o criador tanto do sexo como também da fé. Acreditar, crer e confiar são pilares sem algum ou com determinado grau de envolvimento. Se alguém acredita que Deus exista, ela se limita apenas ao saber da existência sem qualquer envolvimento. Crer já é um pouco mais avançado em que precisa haver algum tipo de envolvimento para conhecer os possíveis de Deus. Já confiar é acreditar que Deus existe, crer que pode todas as coisas e fazer a entrega de si para os seus desígnios da vida. Acreditar é uma fé sem construção. Crer é apenas uma fé com desejo de construir algo. Confiar é desejar que algo sólido e inabalável seja construído na vida. A fé é a única forma de se chegar a Deus. "De fato, sem fé é impossível agradar a Deus, porque é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe e que recompensa os que o buscam". Hebreus 11:6. Observe que neste texto não cita em alguém que acredita que Deus exista. Quem quiser se aproximar de Deus tem de crer que Ele existe. Outro detalhe importante, a fé com propósito e fundamentada tem o retorno do próprio Deus mediante a fé. Não me refiro a fé mercadológica que tem sido disseminada por aí. Os usurpadores da fé têm ficado milionário vendendo uma fé vazia e sem compromisso que deveria construir um relacionamento sólido com Deus. Muitos são enganados porque não conhecem as escrituras e não tem compromisso com o autor da fé. O interesse é somente as bençãos de Deus. Mais recentemente surgiu um grupo de religiosos que exercem uma fé estranha. Pois, são violentos, desconhecem os fundamentos do evangelho e não aceitam que outros pensem diferente. Invadem e depredam prédios públicos e cantam hinos religiosos como triunfo de vitória. Por causa da fragilidade da fé, engolem sem questionar tudo o que os seus líderes falam. Tanto os líderes deste grupo quanto os seus liderados perderam totalmente a referência do que seja a fé descrita nos evangelhos e lutam na carne em nome de Deus, porém, em favor dos principados e potestades do mal. 

A fé não é exclusivamente para ser abençoado ou para conseguir alguma coisa com Deus. A fé não tem e nunca teve o propósito em facilitar as coisas com Deus. A fé tem o propósito nobre de construir valores para o Reino de Deus. A fé é que nos faz chegar ao caminho (Jesus) que nos conduz (uma vez aprovados) a eternidade com Deus. O processo do relacionamento com Deus pela fé não é simples e nem ”romântico” como ouvimos em algumas músicas e pregações. O relacionamento com Deus num contexto em que foi perdida a configuração original tornou-se algo muito profundo em que é preciso ter discernimento espiritual. A fé exercida hoje é mais conhecida pelas propostas contrárias às preferências pessoais do que aos valores que ela proporciona e edifica. Fé não é cumprir à rigor as doutrinas da religião. Fé nada tem a ver com religião. Fé implica reconhecimento de quem é o autor e o consumador, compromisso com aquele que prometeu a vida eterna e entrega de si para alguém de extrema confiança. Guardada as devidas proporções e, por incrível que pareça, o sexo seguro dentro de um contexto conjugal também implica reconhecimento de quem é a pessoa, compromisso com quem fará o ato conjugal e entrega a quem se pretende compartilhar confidências íntimas.

Uma vida sem compromisso é aquela em que a pessoa não sabe de onde veio e sabe menos ainda para onde vai. O compromisso liberta porque vivemos num contexto social onde quase tudo é compartilhado e, principalmente, precisamos uns dos outros. O compromisso pela fé é para suportarmos a jornada árdua que temos de atravessar. Se temos compromisso, então, somos amparados e reconduzidos a presença de Deus pela fé. Tanto no relacionamento sexual como na caminhada pela fé, Deus não impôs limites para viver e explorar a fascinação que é viver a liberdade que ambos proporcionam.

quinta-feira, 4 de abril de 2024

ACUMULADORES - ENTULHO OU TESOURO

Venancio Junior

Será que alguém já parou para pensar sobre o que foi acumulado até agora na vida? Entulho ou tesouro? Após alguns anos este acúmulo é inevitável. O mais importante não é tentar identificar do que seja composto o que foi acumulado que muitas vezes nem se lembra, mas, o que fazer com ele. Sendo uma montanha de entulho, então, não tem muito o que pensar. A não ser que muitos objetos estejam lá indevidamente, do contrário, são coisas de valor que com o tempo, se desgastou e perdeu a sua utilidade. Outros, mesmo ainda tendo valor, não servem mais. Mas, há muitas coisas que, de fato, não tem valor mesmo e o entulho é o melhor lugar para esquecê-las. O entulho foi o destino adequado naquele contexto. Por que, então, foi guardado? O problema é que este entulho ainda incomoda e atrapalha a normalidade da vida. No entulho o que foi acumulado e que precisa ser aniquilado não deve fazer mais parte da vida. Traumas, tristezas, mágoas, decepções, frustrações, desânimo e dores são os entulhos acumulados e de alta periculosidade para a estrutura emocional. Tenho a impressão de que tudo que um dia ocupou algum espaço, continua em menor ou maior grau. A questão é que precisa ser administrado para que não esteja no “front” das decisões. Ter esta consciência é a melhor forma de controlar as emoções. Não tem como ficar feliz num momento triste ou ficar animado quando tudo reforça o desânimo. Isto não deve se tornar uma carga difícil de carregar.

Quem já ouviu falar em parasita ou sanguessuga? O parasita causa males internos e o sanguessuga adere a pele de tal forma que não é possível retirar rápido, pois, causaria feridas doloridas. O entulho emocional causa males internos e até males físicos externos. Tem milhões de pessoas que carregam um fardo pesado porque ainda não conseguiram destinar o entulho emocional de forma correta e definitiva para que não seja como um parasita ou o sanguessuga. Primeiramente é preciso conhecer a si mesmo. Este processo inicia ainda na infância quando os pais e educadores desenvolvem uma dinâmica para que a criança conheça seus limites e suas qualidades. Desta forma é possível, já na fase adulta, reagir adequadamente a cada situação. Não existe métodos infalíveis porque ninguém é perfeito e isto deve ser muito considerado. Humildemente reconhecer os erros e não se vangloriar com os acertos é uma postura de equilíbrio que será fundamental nos momentos em que o emocional é exigido.

Um dos principais fatores que fragiliza a estrutura emocional é a estafa da rotina. Imagine uma estrutura de concreto, aparentemente sólida e, caso não haja alguma intervenção, não sofrerá qualquer dano que comprometa a estabilidade. Agora pegue uma talhadeira e todos os dias raspe um pouquinho daquele concreto. Chegará um dia em que haverá uma cavidade causada pelo desgaste. Assim funciona a rotina, a cada dia deixe que a rotina intervenha na estrutura emocional. Após um tempo não muito longo, a estrutura emocional estará desgastada e não suportará um mínimo de pressão. A rotina pode ser um entulho mal canalizado ou um reforço, depende muito da perspectiva se é uma visão periférica ou esotérica quando é de dentro para fora. A perspectiva periférica enxerga o todo confuso sem um começo e muito menos um fim. A perspectiva esotérica tem uma visão do núcleo da situação em que, além do começo e do fim, se enxergue o propósito. Isto é muito importante saber para que se tenha o controle e a dosagem emocional correta para se obter o máximo de resultados positivos e do nível de qualidade elevado.

Até agora, a teoria funciona maravilhosamente. Na hora que entra em campo para o jogo da vida, parece que algumas decisões certas estão trazendo resultados errados. Pode ser que o momento não seja adequado para uma determinada decisão. Como já afirmei, ninguém é perfeito e erros podem ser cometidos, porém, sem traumas. Não se culpe e não tenha receio em continuar no objetivo. A expectativa em não tentar novamente pode ser pior que a frustração do erro. Somos seres humanos desajustados, frágeis e limitados. Ninguém é melhor porque tem dinheiro, tem grandes conquistas no amor, carreira profissional em ascensão ou qualquer outra qualidade que a maioria das pessoas não possuem. Não devemos olhar para estas pessoas e se autoflagelar considerando como um fracasso pessoal. Cada pessoa tem o seu valor. É fato que, aparentemente algumas pessoas tenham melhores oportunidades que outras. E também é fato que algumas pessoas tenham mais infortúnios que outras. Conheço algumas pessoas com este perfil. Não se deve ter como referência nem que esteja pior ou melhor que estas pessoas. Cada um deve definir o seu ideal e construir a sua vida favorecendo a si mesmo e a todos os familiares.

O que seria o tesouro propriamente dito? Particularmente acho que uma das grandes virtudes do ser humano é se superar em meio as crises. Frustrações e mágoas criam fissuras profundas e tem de estar preparado para que não se aprofunde. Sair ileso de uma situação adversa é um grande tesouro. Este tesouro irá valorizar mais ainda se houver feridas emocionais e forem superadas. Permanecerão as cicatrizes, porém, a estrutura se mantem inabalada com alguns arranhões apenas que não comprometem a estabilidade emocional. Constituir família, ser honesto na vida profissional, alguém que goste da companhia dos amigos, administrar conflitos internos e externos, sempre demonstrar equilíbrio no contexto familiar, no trabalho e na vida social são riquezas que não se adquire com dinheiro ou posição social. São tesouros que ninguém pode roubar. Este tipo de tesouro é possível compartilhar para que outros sejam igualmente ricos.

Alguns princípios poderão ajudar a (re)começar neste novo caminho ou pode ser o mesmo caminho que esteja com mato alto e a pavimentação esteja desgastada. Enfim, por mais que o mundo insista que a internet e o celular é o novo modo de vida que trará felicidades e satisfação, eu digo que não é. Reconheço muitas das facilidades digitais, mas, alguns limites serão necessários impor para que o tempo precioso não seja roubado. Sendo bem pragmático, calcule o conteúdo que vale a pena investir tempo e que traga valores a serem considerados. Sinceramente, quase zero de conteúdo fará alguma diferença na vida. Um tempo sem agenda e sem nada a fazer trará um benefício muito importante para a estrutura emocional. Os conteúdos digitais, na maioria, são entulhos que ocuparão a cabeça e atrapalhará o sono e a disposição e o bom senso necessário durante o dia. Quanto mais atividades lúdicas manuais, melhor será para o equilíbrio interior. Nos finais de semana, prefira atividades de lazer e esportivos. Durante a semana, ocupe um tempo com boa leitura. Com a facilidade da televisão interativa, prefira programas e filmes com conteúdo saudáveis. Periodicamente saia de casa e deguste um alimento diferente e, obviamente saudável. Quando possível, faça programas exclusivos para aquele dia com os amigos livres de horários e compromissos.

Tem pessoas que convivem muito bem com a rotina, então, mude a si mesmo. Outras não conseguem, então, mude a rotina. A vida na perspectiva de quem deseja viver pode ser um desafio fascinante e no final do arco-íris sempre há tesouro. A vida na perspectiva de quem cansou de viver, não tem desafios, somente entulhos que se tornaram um fardo muito pesado.

terça-feira, 2 de abril de 2024

EVANGÉLICOS SEM EVANGELHO E EVANGÉLICOS PROGRESSISTAS

Venancio Junior

Tenho insistido neste tema de que há declaradamente um considerável grupo de evangélicos sem evangelho. Como assim, são evangélicos que creem no quê? A bíblia não utiliza estes termos, mas, infelizmente há os crentes nominais ou mascarados. Jesus combateu a tradição da religião que é o cenário destes falsos cristãos. Nos últimos anos este grupo, que já existia, se manifestou com muita força e com grande influência nos poderes políticos, judiciários e empresariais que são os três pilares principais para quem deseja exercer o controle da sociedade. Muitos ou a maioria não se declaravam cristãos, mas, se aproveitaram da força crescente deste grupo e, no caso político, conquistam votos, no judiciário influenciam nos julgamentos criminais e, no caso dos empresários, existem aqueles que ainda possuem o ranço ideológico da ditadura de que o comunismo está invadindo o Brasil e são incapazes de respeitar quem pensa diferente. Este grupo não tem projeto político. A ideologia é completamente vazia sem fundamentos que provoquem um debate. A bandeira que defendem é apenas cortina de fumaça porque o objetivo é ganhar a confiança deste grupo influente para viabilizar os interesses de pessoas poderosas. Muitos dos seus seguidores, sequer sabem disto porque são presas fáceis pela falta de senso crítico.

O que o evangelho aborda sobre este assunto? Vou utilizar o texto que acerta na veia da questão. "Jesus, porém, respondendo, disse-lhes: Errais, não conhecendo as Escrituras, nem o poder de Deus". Mateus 22:29. Jesus estava respondendo a questionamentos diversos e foi incisivo de que não conhecer o evangelho e nem ter a experiência pessoal com Deus invalida todos os argumentos e ações mesmo que se fale em nome de Deus. Uma mera questão de falta de integridade. Este comportamento é um perigo porque, de tanto insistir nesta falsa crença que se torna uma verdade cegando a consciência eliminando o senso crítico e o discernimento espiritual.

A caminhada cristã é uma longa e difícil jornada de renúncias diárias. O contexto cultural/religioso são os principais referenciais que influenciam substancialmente a fé. Por sinal, a fé é sistematicamente desafiada e questionada. Os absurdos são muitos e tão intensos que chegamos a questionar quem, de fato, esteja errado. Imagine um povo mal doutrinado? A perda de referência daquilo que seja o certo se tornará algo normal. Além do mais, sem o correto discernimento, o Espírito Santo não age na pessoa para corrigir. Cada um é responsável pelos seus atos diante de Deus. Sofre-se as consequências por causa disto. Desrespeitar, roubar, mentir, discriminar e cometer crimes em nome de Deus tornou-se algo normal. O crime organizado tem legalizado dinheiro abrindo igrejas nas comunidades e tem evangélicos infiltrados nas milícias. A bíblia demonstra o contrário destas posturas. Primeiramente exorta para que não se use o nome de Deus em vão. Segundo, pode-se fazer tudo, caso não tenha amor, nada vale e Deus não considera mesmo que seja bem-intencionado.

Existe um outro grupo antagonicamente radical que até conhecem e também utilizam o evangelho nas suas posições. O problema é que alguns pontos em que acreditam, o evangelho é distorcido e até adaptado para que haja legitimidade. Eles abraçam a todos os religiosos sem distinção. O amor de Deus inclui a todos também sem distinção para que haja arrependimento. A diferença é que ser amado por Deus não ratifica ser escolhido de Deus que deseja que todos sejam salvos. O que não se deve é ignorar o contexto dos mandamentos e das doutrinas. Adotaram um cristianismo conveniente. O filtro de todo pensamento e consideração deve ser o evangelho. Constam na bíblia textos que precisam de contextualização, enquanto outros o sentido é literal mesmo. Não há margens para outras interpretações. É neste ponto que este grupo conhecido como cristãos progressistas se valem para incluir as pessoas sem a devida transformação de vida. Deus incluiu a todos através do amor incondicional. Deus não selecionou as pessoas para amar, pois, todos são chamados, mas, seleciona os escolhidos que decidiram ter uma vida íntegra diante dEle. Para isto, é preciso renúncia da vida pregressa de pecado que gerou consequências incompatíveis com a justificação em Cristo. O pecado deforma e a justificação em Cristo reforma para que se torne uma nova criatura. Viver em Cristo e render frutos é a premissa da transformação. É contraproducente dizer que é cristão e que tem o evangelho como regra de fé e ter atitudes que não revelem a transformação. Não existe um meio termo, negar-se a si mesmo e cada um carregar a sua cruz significa não seguir os seus próprios desígnios ou convicções.

Diante deste cenário evangélico espinhoso, como ser identificado como cristão e não ser confundido com os evangélicos sem evangelho fundamentalistas e nem com os evangélicos progressistas que falam de amor e inclusão, mas, engasgam-se quando o assunto é renúncia da velha criatura?

A velha criatura é um termo para identificar aqueles que se mantem em pecado sem a justificação em Cristo. Esta justificação é que nos aperfeiçoa porque no Reino de Deus não entra a sujeira do pecado. Isto não significa que após a conversão nos tornamos perfeitos. Absolutamente não! A justificação acontece no momento do arrependimento. Quando acontece o arrependimento, entende-se que o esforço em se manter conectado a Deus é maior para construir uma fé sólida. Mesmo em meio a lutas e dificuldades, esta fé é inabalável. Não por mérito do esforço, mas, porque a fé é em alguém que mantem fortalecidos aqueles que confiam em Deus. Quando se fala em fé, geralmente associa-se a uma sensação positivista. A fé não é algo que sente agora e depois não sente mais. Fé é uma construção solidificada em Deus. Mesmo que se sinta vazio, é possível ter fé.

Para os fanáticos fundamentalistas radicais o evangelho que acreditam é uma ideologia sem conteúdo. Para os progressistas, o evangelho é ecumênico e recheado de teorias liberais em que Deus abraça a todos sem que os abraçados tenham alguma responsabilidade em seguir os princípios que desconstrói a velha criatura. Para os discípulos que decidiram viver na total dependência de Deus, o evangelho vai de encontro às pessoas imperfeitas revelando, através do teu Santo Espírito a real condição da velha criatura convertendo-os a Cristo e transformando em uma nova criatura frutificando em todas as ações para o Reino de Deus. Quem é de Deus fala das coisas de Deus contidas no seu evangelho em palavras e ações. Quem não é de Deus se limita somente às palavras ou tem atitudes com obras de uma fé morta.