segunda-feira, 13 de novembro de 2023

JESUS E AS MULHERES MARGINALIZADAS

Venancio Junior

Jesus sempre teve boa relação com as mulheres. Não no tipo de relacionamento que muitos deduzem e constroem uma narrativa própria para gerar impacto nas pessoas. Jesus sempre foi cordial, respeitoso até mesmo com mulheres que perderam a credibilidade na sociedade machista da época. Sempre estava atento às suas necessidades. Curou a hemorragia de uma que estava na multidão. Sendo judeu, conversou publicamente com uma samaritana sobre religião e expulsou demônios de Maria Madalena que, inclusive foi a primeira a saber pelo próprio Jesus que havia ressuscitado e foi logo avisar os apóstolos.

O contexto social das mulheres no tempo de Jesus era muito difícil, sendo quase sub-humano e serviçal dos homens. O patriarca trocava as filhas por bens numa relação conjugal de interesse. As mulheres eram destinadas exclusivamente para as tarefas domésticas.

Esta submissão da mulher é consequência de um tremendo mal-entendido bíblico. Muitos espertinhos se aproveitam disto e maltratam, não somente suas esposas, mas, as mulheres em geral desrespeitando e não dando o devido valor merecido. Os maiores e principais grupos de maus tratos às mulheres são os religiosos. As religiões mais antigas são as que mais submetem as mulheres a um sistema que radicalmente não permitem qualquer ação que as deixem em evidência.

Na bíblia não existe qualquer texto que afirme que a mulher é submissa ao homem. A submissão é no contexto conjugal, porém, um pertence ao outro em igualdade de condições. Vamos ao texto. Exatamente iguais: Gênesis 2:24 “...e se une à sua mulher, tornando-se os dois uma só carne”. Submissão ao marido por causa do pecado. Gênesis 3:16 “...o teu desejo será para o teu marido, e ele a governará”. Em contrapartida, observe que o “castigo” do homem foi que deveria trabalhar para poder comer: Gênesis 3:17 “...em fadigas obterás dela o sustento durante os dias de tua vida”.

É fato que na lei judaica do pentateuco a mulher é subjugada e não tem qualquer papel definido no contexto da família, exceto o de cuidar dos filhos e da casa. Inclusive até na questão da crise conjugal em que se decide pelo divórcio, é o homem quem concede a carta de divórcio. A mulher fica livre para se unir a outro homem. Sem esta carta, ninguém aceitaria uma mulher que neste contexto é repudiada. Engraçado é que desde aquele tempo o homem que se unia a uma prostituta para se satisfazer não era mal-visto. Por outro lado, a mulher solteira que se unisse a muitos homens era considerada prostituta. Atualmente esta triste consideração ainda se mantem.

Estas definições em relação a vida conjugal que trouxeram para o relacionamento social entre homem e mulher foram ratificadas no antigo testamento e Jesus veio para reinterpretar a lei conforme a sua graça quando também redefiniu as atribuições conjugais do casal além da função da mulher na sociedade. No contexto conjugal um pertence ao outro em igualdade de condições e no contexto social homem e mulher tem os mesmos direitos e responsabilidades.

A grande questão após esta breve contextualização é o que será que motiva este comportamento extremamente reprovável de o homem em qualquer circunstância ainda se julgar superior e até mesmo proprietário da mulher? Mesmo sabendo que haverá consequências graves, porque hoje (deve-se considerar que a violência contra a mulher é crime) alguns homens ainda insistem em ter estas atitudes covardes? Será que a mulher assumindo um papel de protagonismo na relação fere o brio masculino? Será que o homem se torna menos homem se for, de certa forma, rejeitado? Será que se a mulher for a maior responsável pelas finanças da família o homem perde sua masculinidade? São questionamentos que não podem ser generalizados. O contexto de cada casal é diferente, principalmente porque as pessoas são diferentes. Independentemente dos motivos em que nenhum deles justifica a violência, não tenho outro adjetivo para classificar a violência contra a mulher senão a de covardia. Ultimamente estas atitudes covardes têm se intensificado e parece que as autoridades não reagem com a mesma intensidade para fazer frente a estas arbitrariedades cometidas por pessoas fracas e estúpidas.

Antigamente, antes da revolução feminina na década de 60, não se ouvia muito falar neste tipo de violência. Isto não significa que a humilhação e a violência contra as mulheres não aconteciam. Na verdade, as mulheres sofriam caladas porque todo o mundo masculino era contra elas. Por incrível que pareça, a frase “até calada está errada” era muito considerada e para os covardes, ainda está valendo. Conheço casos de algumas mulheres que preferiram se separar (quando possível) a se submeterem mais ainda a uma exposição vexatória de agressão.

Por incrível que pareça, no meio religioso onde os princípios da crença deveriam reger o comportamento de paz e harmonia mesmo em meio ao conflito, também tem acontecido estas atrocidades. Por que alguém decide dar vazão ao seu ímpeto violento? Conheço até pastores que descem do púlpito e descem o porrete na esposa e nos filhos. Falam de amor da boca para fora. Falta integridade que revele caráter elevado propagandeado nos púlpitos.

Contrariando o movimento feminista, ainda considero a mulher como o “sexo frágil”. A força da mulher não está no vigor físico ou nos músculos. Mesmo aquelas que praticam halterofilismo e lutas são frágeis em relação aos homens. A estrutura física feminina é diferente e não inferior ao masculino. O valor do homem e da mulher são iguais no caráter. A mulher deve ser admirada no respeito que ela impõe, na elegância que ela transmite e no charme que ela inspira. Perdendo estas qualidades por qualquer motivo, creio que jamais se reconquiste novamente. São valores da pessoa que pertencem tanto a mulher como também ao homem e devem ser preservados com muito rigor. Estes atributos não pertencem a terceiros e nem devem ser considerados como moeda de troca.

Quanto ao homem, alguns tem tido um comportamento reprovável e que merece todo o desprezo possível. Pensam que se impor como homem é através da violência como exercício de masculinidade. Admiro os homens de verdade que ainda praticam a gentileza em considerar a mulher como uma peça frágil de cristal em que o manuseio tem de ser com delicadeza. Não quis me referir a mulher como sendo um objeto, é apenas uma metáfora no sentido de materializar a fragilidade. Amar a mulher é se submeter a toda esta delicadeza com cuidado, proteção e respeito. O homem deve ter um caráter elevado mesmo que se sinta inferiorizado em algumas situações. Da mesma forma que a mulher, o respeito, a elegância e o charme, assim como também o corpo não devem ser moedas de troca e numa relação conjugal não pertence a si mesmo, mas, ao cônjuge para cuidar e amar. Estas características pertencem à pessoa e não ao gênero.

Violência física, agressão verbal e intimidação são práticas dos fracos e covardes que não conseguem se impor porque estão sempre num nível abaixo. Isto é um recado aos homens, mas, vale também para as mulheres.

quarta-feira, 8 de novembro de 2023

NÃO ERA PARA SER ASSIM...

Venancio Junior

A música conhecida como louvor na maioria das igrejas cristãs tomou proporções gigantescas e ocupa o espaço da música quase na sua totalidade na liturgia dos cultos. Como tudo começou e o que aconteceu com a música sacra e os hinos tradicionais?

Vou falar do meu ponto de vista, considerando que praticamente a minha vida tem envolvimento com a música desde a forte influência da minha família até na participação em alguns grupos.

A música em si, creio que seja divinamente inspirada. Não tem como imaginar outra fonte de inspiração de algo que move a emoção e o sentimento além de trilhões de dólares pelo mundo. Independentemente do estilo, música é música e pessoalmente julgo que só existem dois estilos, a música boa e a música ruim.

Até os anos 60 a música cristã era diferente da “música do mundo” não somente nas letras, mas, também na melodia e nos arranjos. Esta era uma preocupação da liderança pastoral extremamente radical que não permitia que nos cultos tivessem músicas iguais as que se ouvia nas emissoras de rádio que, até a década anterior, os anos 50, os aparelhos de rádio eram proibidos nos lares evangélicos. Lembro de um triste episódio em que um pastor percebendo que seu filho estava ouvindo uma "música mundana num radinho à pilha", tomou-lhe o radinho e espatifou no chão. Se o objetivo era inibir o filho de ouvir estas músicas, esta atitude estúpida o afastou mais ainda dos seus objetivos em "convertê-lo". A música evangélica era distinta e objetiva e em hipótese alguma utilizava um linguajar que refletisse o mundo real que se vivia e o contexto abordado era somente a vida do porvir no céu, os valores do Reino de Deus e a vida na igreja.

No começo dos anos 70 a “música do mundo” começou a entrar na igreja. Não exatamente a mensagem, mas, o ritmo e os arranjos. Os compositores perceberam e começaram a questionar o porquê a música mundana era mais interessante que a tradicional música evangélica que basicamente tinha piano, órgão e violão como acompanhamento. A bateria e a guitarra eram considerados instrumentos do diabo e ainda era difícil desenvolver o mesmo acompanhamento dos hinos com estes instrumentos sem mudar a dinâmica da música. Vou citar apenas o nome de um destes grupos pioneiros, mas, graças a todos eles que hoje temos liberdade em ouvir produções com belos arranjos e letras compreensíveis que abordam o contexto da vida atual. Ainda nesta década, o Vencedores por Cristo ou simplesmente VPC se destacou quando teve duas fases que são considerados divisores de água na música evangélica brasileira. O grupo teve início no final dos anos 60 e gravou diversos LPs e na primeira metade da década seguinte nos anos 70, especificamente em 75, lançou o seu lendário álbum Louvor que foi uma febre nas igrejas. Porém, ainda não havia a cultura do louvor como forma de adoração através da música que atualmente domina a liturgia dominical, pois, os hinos e músicas sacras ainda eram os preferidos da igreja para entoar durante o culto em qualquer ocasião. Tudo era uma questão de tempo e na minha adolescência, como todos na época, estava encantado com esta nova roupagem musical e que falava de Deus. Logo em seguida, em 77, o VPC lançou o melhor álbum da música cristã brasileira de todos os tempos, o inigualável "De vento em popa". Até os dias atuais é insuperável, inclusive por eles mesmos. A princípio, por causa deste álbum, tive de repensar a minha maneira de ouvir a música cristã. Para mim estava perfeito, agora poderia curtir a "música mundana com letras evangélicas". Um álbum recheado de bossa nova tanto nos arranjos como também nas letras. O caminho sem volta estava aberto. Fui um daqueles que ousaram seguir por este caminho. Como naturalmente me envolvi com a mocidade da igreja, fui um dos incentivadores para introduzir o louvor na liturgia dos cultos. Na maioria das igrejas a resistência à este novo modismo (assim que muitos dos mais tradicionais chamavam o louvor) era muito grande e com muito esforço para derrubar as barreiras apoiado pela percepção de alguns pastores de que era uma forma de manter os jovens na igreja, o louvor aos poucos ocupava a cada ano o seu espaço até que avançou demais e caiu no gosto daquela geração que agora era madura e ditava os rumos da igreja. A partir daí, não precisava de muito esforço e longos discursos justificando esta nova era da música na igreja.

Interessante é que no início deste “modismo” os músicos eram bem limitados, porém, bastante criativos. Atualmente, parece que inverteram os papéis, os músicos são muito bons e em grande quantidade e pobres em criatividade seguindo a mesmice da cantoria popular nas igrejas. Isto é muito evidente nos cultos online e quase todo final de semana estou navegando pelos cultos e os louvores são exatamente iguais com raríssimas exceções de alguns que querem fazer algo diferente e com músicas diferentes. Já questionei alguns líderes de louvor e a resposta é a mesma, parece uma cartilha, “a igreja não gosta de cantar música diferente porque está acostumada com este tipo de música”. Existem dois grupos de louvores nas igrejas, um que canta as músicas que pertencem aos hits da moda e de autoria de alguns compositores contemporâneos e o outro que se mantém saudosista e cantam à exaustão e, sem exagero, as mesmas músicas de décadas atrás. Algumas destas melodias e harmonias são excessivamente pobres e junto com as letras sem poesia, pessoalmente nem consigo dedicar a Deus esta falta de criatividade. Infelizmente, muitas destas letras até contradizem o evangelho. Falta teologia nas letras e as pessoas cantam porque existe uma profunda ausência de senso crítico que não é "privilégio" do mundo evangélico, a música secular sofre também deste mal. No caso da música evangélica atual, há um evidente descrédito nas letras que deveriam enaltecer à Deus e utilizam "frases chavões" para provocar emoção nas pessoas. São movidos por uma emoção vazia de consciência. O Deus criador é infinitamente criativo e concedeu graciosamente o dom para desenvolver a criatividade em toda expressão artística. A arte é algo sublime porque mexe com a consciência e a emoção. No Salmo 33:3 diz que se deve tocar com arte. Não é para tocar sem a alma e o talento, mas, ambos envolvidos numa execução sublime. A arte está na melodia, na harmonia, no acompanhamento e na poesia da letra.

Não era para ser assim quando decidi lutar pelo nosso espaço de louvor nos cultos. Não era para ser assim, o louvor substituindo os cânticos tradicionais da música sacra e dos hinos. O louvor tem o seu espaço por direito, pois, pertence a igreja e são executados e entoados pela igreja, porém, deve ser mais uma forma de adoração e não ser colocado como a única e exclusiva forma de adoração na liturgia. O louvor enquanto propósito é um mandamento de Deus para todos os seres que tem fôlego de vida "Todo ser que respira louve ao Senhor" Salmo 150:6. Obviamente que louvar não é somente com música, pois, trata-se de expressão da vida e os seres humanos, os animais e toda a natureza que possuem vida louvam a Deus. Mas, quando se ensoberbece e se orgulha adotando-se nos cultos como a única forma não permitindo que outros também participem com a sua arte específica, torna-se, além de egoísta, meramente um ativismo mecânico. A liderança da igreja deve ter a responsabilidade em incentivar a música como um todo e jamais privilegiar um determinado grupo em detrimento dos demais grupos da igreja. Se há possibilidade de se formar orquestra, coral, madrigal (coral resumido e mais dinâmico) e até mesmo músicas com apresentações avulsas, isto deve ser incentivado porque enriquece a musicalidade da igreja. Uma das formas mais eficazes é ter aulas de música e instrumentos e promover seminários de música para despertar a atenção daqueles que são dotados de talento e tenham espaço para democraticamente também louvar a Deus com a sua arte. Nas centenas de milhares de igrejas, com certeza, existem dentre os seus membros e frequentadores pessoas capacitadas e que não recebem o incentivo necessário para expor a sua habilidade. Por que não promover festivais de músicas como aconteciam antigamente? Eu mesmo participei de 04 festivais. Por que os cultos devem seguir o mesmo padrão sempre? Muitos cultos são bem chatos e não atraem as pessoas que Deus deve ficar bocejando de tédio. O culto será diferente se você fizer a diferença. Muitas igrejas estão envelhecendo, não na faixa etária, mas, na falta de criatividade. Estão envelhecendo porque falta criatividade ou falta criatividade porque estão envelhecendo? São jovens com mentes velhas que se alinharam a um sistema engessado e que não permite que se exponha a graça de Deus na sua melhor forma. Deus não está parado no tempo e a sua infinita criatividade é a melhor prova disto e não nos deixa envelhecer. "Sejam transformados, renovando a sua mente" Romanos 12:2. Este texto vale para a criatividade também.

Todas as músicas são inspiradas por Deus, não importa se é cristã ou não cristã. A inspiração é despertada quando se “consome” aquilo que abre os ouvidos e a consciência. Consuma boa literatura e boa música para despertar a poesia e a canção da alma. Louve a Deus com o Jazz, com a Bossa Nova, com a MPB, com a música Clássica/Erudita, com o Rock, com a poesia e com todas as expressões artísticas. Mesmo não tendo o talento para executar algum instrumento ou para algum tipo de expressão artística, saberá apoiar e, principalmente apreciar a boa arte de Deus!