segunda-feira, 24 de abril de 2023

ESPÍRITO DESARMADO

Venancio Junior

Nos antigos filmes de faroeste, muito popular nos anos 60 e 70 aconteciam cenas de que não era justo atirar em alguém pelas costas ou desarmado o que seria uma covardia. Nenhum pistoleiro queria ter a fama de covarde e a “briga” era resolvida num duelo onde os dois envolvidos na disputa empunhavam uma arma no “coldre” que ficava na cintura e o mais rápido e certeiro sairia vencedor. Neste tempo, a lei ainda não era muito definida e a questão humanitária estava renegada ao núcleo familiar apenas e todos que se encontravam fora deste núcleo eram considerados forasteiros. Cada família lutava pelo seu território e todos possuíam armas para se defenderem dos intrusos invasores.

De certa forma evoluímos nas leis, mas, a questão do tiroteio ainda continua. Infelizmente ainda vemos nos noticiários muitos casos de uso de “arma de fogo” que é um termo popular para armas de todos os calibres e que diferencia da faca, machado ou martelo que são consideradas "armas brancas". A maioria fica sabendo pelos noticiários, mas, boa parte da população que habita os núcleos residenciais ou comunidades geralmente dominadas pelo tráfico de drogas, onde o tiroteio é muito comum e faz parte da rotina, estas notícias é sempre o assunto principal. Uma triste realidade e que, parece que o poder público, principalmente os de segurança, se torna refém (por motivos aparentemente desconhecidos da população) destas forças paralelas.

Mais recentemente, vimos um governo incentivando a população para que se armasse no sentido de se defender da violência urbana. Como nunca teve projetos de investimentos em educação e cultura, a única opção era armar a população e transformar as cidades num verdadeiro campo de guerra. Praticamente voltando ao velho oeste, só que agora, a covardia está em evidência e ninguém se incomoda em atirar em alguém desarmado e pelas costas. O objetivo é eliminar a pessoa não importando se os motivos justificam estes meios brutais e cruéis, por sinal, estúpidos e covardes.

Não somente nas cidades a violência ronda o conforto do lar e das famílias, se dimensionarmos esta violência para o nível de país, a maioria das pessoas sabe que em muitas regiões geográficas do planeta, a guerra tornou-se normal. Principalmente nos países onde o nível social é precário e, para ajudar, os que assumem o poder político são os, como diz o Caetano Veloso, ridículos tiranos que se aproveitam da fragilidade das leis e da ignorância do povo. Inclusive, crianças já recebem sua arma para se defender e futuramente ser recrutado para o exército oficial ou de guerrilha. Ainda vemos ditadores disputando territórios vizinhos como se fossem donos destas terras e destruindo a vida das famílias com extrema violência sem dar qualquer chance em promover um diálogo de paz. Na verdade, a vaidade é a principal motivação destes ditadores que desconsideram que os legítimos donos das terras são os seus moradores. Com isto, investem em armas que estão cada vez mais sofisticadas. Aqueles que chegaram ao poder, seja de forma legal ou ilegal, pasmem, estão em busca de paz, desde que seus interesses não sejam comprometidos. Pelo menos nos discursos a paz está presente, só precisa saber se não está rabiscada no rascunho. A primeira ação que vêm à cabeça é comprar armas para destruir os adversários. Isto é o cúmulo do contrassenso, utilizar armas para construir a paz. São pessoas escravas de suas ambições com o objetivo de ampliar o poder a partir do seu reduto de influência.

Aqueles que defendem o uso literal de uma arma para se defender, precisam de uma nova perspectiva de paz, sequer conhecem o que é a paz sem armas. Jamais teremos paz enquanto o poderio bélico for a única e principal alternativa para se conquistar a paz. Desta forma, o outro lado também terá de se armar, tornando esta relação um círculo vicioso sem fim. Inúmeros acordos de paz foram discutidos e assinados, porém, ninguém teve a coragem de se desarmar que é uma atitude que deixa o “front” vulnerável e exposto a qualquer aventureiro invasor. Não tem outro caminho e os limites e fronteiras precisam ser respeitados. Sempre devemos ter a propensão em demonstrar a paz através do desarme o que abre possibilidades infinitas de se estabelecer um relacionamento pacífico. É arriscado, mas, é o único caminho para que a paz tenha uma chance. John Lennon já cantava “...dê uma chance a paz”. É um convite para se desarmar.

Este mundo armado e extremamente violento assusta muito aqueles que tem o espírito desarmado e a maioria das pessoas não querem a guerra de qualquer espécie. E na questão emocional e social, será que podemos ser considerados como uma sociedade desarmada, quando o autocontrole não é evidente nos relacionamentos? Parece que as pessoas já saem de casa com um porrete na mão buscando motivos (que não precisa ser tão grave) para agredir a todos que estiverem no seu caminho. As pessoas estão com a energia emocional e psicológica em efervescência e, parece que perderam o controle das suas ações e reações. Percebemos isto no trânsito, no esporte, nas campanhas políticas e até nas discussões religiosas. Com ou sem razão, as pessoas já saem de casa armadas e prontas para a guerra. Estas pessoas estão armadas até os dentes e suas armas não precisa ser adquirida numa loja especializada, pois, estão muito bem acomodadas no coração. Que armas são estas? O preconceito, a discriminação, o rancor, o ódio, a indiferença e o desafeto geram uma insensibilidade que anula qualquer tendência ao desagravo. Repito, quem sofre com tudo isto são os pacificadores. Neste caso, não existe um meio termo. Se a pessoa sofre com as injustiças e com a violência presente no cotidiano, então, pertencer ao grupo dos pacificadores é algo natural. Por outro lado, se estas situações que agridem a paz não incomodam, sendo ou não um combatente ativo, a conivência é uma forma de alimentar a violência. Jesus afirmou: "Quem não é por mim é contra mim; e quem comigo não ajunta espalha" (Lucas 11:23). Claramente Jesus, que é o príncipe da paz (Isaias 9:6), indica que quem não é ativo em ajuntar, ajuda a espalhar. Para se ter um espírito desarmado, é preciso ser ativo em destruir as armas que impedem a pessoa em ser pacificadora e fomentar a paz através de suas atitudes. A receita eficaz está contida nas bem-aventuranças discorridas por Jesus que começa falando sobre um espírito desarmado e no decorrer do texto fala como se defende sem armas e guerreia sem violência o “exército” dos agraciados, "Bem-aventurados os humildes de espírito, porque deles é o reino dos céus" (Mateus 5:3). As bem-aventuranças demonstram apenas a característica do espírito desarmado. Nos evangelhos durante o seu ministério, Jesus demonstra a prática daqueles que desejam se desarmar das armas da velha criatura. Por exemplo, uma das atitudes para se desarmar é dar a outra face, "Se alguém bater em você numa face, ofereça-lhe também a outra" (Lucas 6:29). Este é um dos princípios de uma pessoa com o espírito desarmado. O discípulo, por excelência precisa ser alguém accessível, tendo o “front” aberto e mostrar que a melhor arma para se conseguir a paz é não ter armas e revelar que a liberdade proposta por Jesus é não ser escravo de si mesmo. Isto não significa que a velha criatura que produz frutos da carne deixa de existir e insista em colocar em prática aquilo que o escraviza. Cada pessoa tem a sua personalidade e terá de administrar como requer os princípios da liberdade de um bem-aventurado. As bem-aventuranças é um real convite para que se tenha um espírito de paz, livre e desarmado.

segunda-feira, 17 de abril de 2023

AMIGOS MAIS QUE CHEGADOS...

Venancio Junior

Acho muito engraçado quando chega uma notificação de “sugestão de amizade”. Quem disse que eu quero ser amiga daquela pessoa? E quem disse que alguém quer que eu seja amiga dela? É o meio mais banal e raso de se arrumar um amigo. Conheço pessoas que fizeram amizade desta forma e se mantiveram amigas de verdade. Também conheço casais que se conheceram pelas redes sociais e continuam firmes e fortes no relacionamento conjugal e tem até filhos. A maneira como se faz a amizade, de certa forma, é irrelevante, pois, nas extremidades da rede há duas pessoas que não se conhecem e podem tranquilamente desenvolver uma amizade profunda e até um relacionamento afetivo.

Antigamente tinha as festas de família e de amigos, os encontros nas reuniões da igreja e no cotidiano do trabalho que proporcionavam encontros muito interessantes. Acontecem também os encontros casuais. Já aconteceu comigo. Uma amiga de uma amiga estava sem dinheiro para o ônibus e, de repente, lá estava eu pagando a passagem dela e nos conhecemos e desenvolvemos uma boa amizade. Nos dias atuais, ter amigos é muito relativo. Basta acessar o perfil das redes sociais e verificar se alguém está na lista de “amigos”. Na verdade, alguns poucos que são, de fato, amigos. Os demais, a maioria talvez nem seja amigo do amigo do amigo. Muitos querem ter o maior número de amigos nas redes sociais porque este é o principal índice de popularidade e o meio mais eficaz para satisfazer um ego decadente. Pelo menos é esta a impressão que muitos têm de si mesmo. Tentam afugentar o ostracismo social e, muitas vezes, espantar a tristeza e a frustração em não ser popular. Todos buscam ser populares para justificar algo que não fará a menor diferença no seu cotidiano. Ninguém vai perguntar o porquê sumiu das redes sociais. Ninguém quer saber se está bem e se tem algo a confidenciar. Quem confiaria uma confidência a alguém que se relaciona somente nas redes sociais? Por incrível que pareça, tem muita gente expondo os seus males no mundo virtual. Expõe o que é e o que não é de fato. Acontecem muitos suicídios e o máximo que os outros acham é que poderia ter ajudado se soubesse do problema. Tantos outros vivem em depressão e se distraem vendo o sucesso dos outros nas redes e assumem a alegria alheia para si, como se no dia seguinte nada daquela sua condição frágil existiria mais. Muitas solicitações de amizades são aceitas com o propósito de ampliar a vitrine e se expor com verdades e mentiras. Algumas verdades não são para serem expostas porque não interessa a ninguém tudo o que acontece na vida. As mentiras jamais devem ser expostas porque são mentiras e são sustentadas no vácuo emocional. É para abandonar as redes sociais e nada publicar? Não foi isto que quis dizer. Existem as exposições frívolas e outras que faz parte do compartilhar da alegria em ver os filhos crescendo ou de alguma conquista. Pode ser também o aniversário de algum familiar, uma viagem que proporcionou prazeres imensuráveis e até reencontros de familiares e, logicamente, de amigos. O que deve ser também compartilhado são exemplos de vida que faz muita diferença e que poderá ser seguido por outras pessoas não somente nos perfis, mas, aplicando nas suas próprias vidas. Isto deve ser compartilhado se não tornaremos o mundo social insuportável e as redes sociais nos permitem com muita simplicidade utilizar os meios para um determinado fim de forma ágil.

O esforço é muito grande para conquistar pessoas para que sejam suas amigas. Quem não tem amigos, talvez não tenha a extensão de si mesmo. Esta frase revela que afinidades é o que aproxima as pessoas umas das outras. O diferente é interessante, mas, no sentido de inovação e vanguarda não o contraditório. O que nos mantém unidos, não necessariamente juntos é aquilo que gostamos de fazer juntos. Conheço grupo de amigos que se conhecem desde criança e ainda fazem programas juntos. Até mesmo suas novas famílias se tornaram parte do grupo e acampam juntas, viajam juntas e comemoram aniversário juntas. Não conheço familiares que tem esta mesma dinâmica e predisposição. No livro de Provérbios lemos que “há amigos mais chegados que irmãos”. Este termo “irmãos” a que o texto de Salomão se refere é irmão de sangue mesmo. Nesta época ainda não havia o conceito de irmãos de fé.

O que nos atrai em alguém? No relacionamento afetivo, a aparência, a princípio é o que chama a atenção e o jeito da pessoa é o que mantém a conexão. No caso de amizade, a aparência não importa. É fato que amigo de verdade não se escolhe, simplesmente acontece. Manter a amizade é uma escolha e depende de inúmeros fatores. O bom relacionamento é aquele em que não há cobrança de qualquer espécie. Quem não gosta de estar com os amigos? Eu tenho uma frase relativa a amizade: “Se não existe falso inimigo, será que existe verdadeiro amigo?”. Se for amigo, obviamente o relacionamento é verdadeiro.

No caso dos irmãos de fé, por que a amizade não é automática quando se professa a mesma fé? A comunhão tão incentivada por Jesus não é um grau elevado de amizade? Neste caso, a comunhão exige propensão ao sacrifício sem exigir nada em troca. Mas, a amizade não é assim também? É, mas, a comunhão tem de se conviver e até amar a quem não gosta sem a obrigatoriedade da convivência. Que pena, neste ponto, a amizade vai por outro caminho. Comunhão não deve ter a motivação pelas afinidades como a amizade, com exceção da fé. A amizade é recheada de afinidades, inclusive, constroem-se ou descobrem-se outras afinidades juntos.

Outra questão polêmica, quem não é amigo, então, é inimigo? Muitas pessoas aplicam este conceito, principalmente nos dias atuais em que os relacionamentos se tornaram líquidos. Antigamente se dizia sobre a prática da boa vizinhança. Mesmo morando na casa ou no apartamento ao lado, isto não significa que o relacionamento deva ser o mais estreito possível, sequer precisa ter relacionamento. Respirar o mesmo ar não se subentende que as pessoas devam ser próximas.

Até mesmo Jesus tinha o seu parceiro preferido que nos termos bíblicos ficou conhecido como o “discípulo amado”. Por que Jesus apregoando que não faz acepção de pessoas tinha preferência por alguém? É uma questão de contexto. No contexto de amar em cumprimento a sua missão não há diferença de pessoas. Mas, Jesus veio como ser humano e viveu todas as agruras da sua condição humana. Jesus tinha sentimentos, vontades e preferências. O apóstolo João, provavelmente era o seu confidente. Eles eram tão chegados que no findar da vida na cruz, Jesus falou para que sua mãe cuidasse de João. Será que a predileção de Jesus era recíproca para João? Será que João tinha o mesmo grau de sentimento por Jesus? Conforme o texto de João 13:23 em que os discípulos estavam reunidos com Jesus que falou que um deles iria traí-lo e João estava reclinado sobre o peito de Jesus demonstrando terem uma amizade muito íntima e recíproca, tanto é que Pedro pediu para João perguntar a Jesus que confidenciou a João quem o iria traí-lo. Esta profunda ligação entre João e Jesus levanta uma suspeita e poderia ser considerada como homossexual, porém, sabendo da postura e responsabilidade dos dois, creio ser improvável considerar este nível de relacionamento. Da mesma forma especulativa, também existe a suspeita sobre o nível de relacionamento com Maria Madalena da qual Jesus havia expulsado sete demônios. Alguns afirmam que houve um affair e tudo não passa de especulação. Voltando ao relacionamento com João, a única coisa que se sabe é sobre a declaração de discípulo amado e o episódio do único contato físico conhecido com os discípulos onde houve a revelação de Jesus de quem iria traí-lo.

Por que Jesus escolheu o apóstolo João para ser o seu amigo amado? Não confundir com João Batista que viveu no deserto e depois batizou Jesus. Amigo não se escolhe. É mais fácil escolher quem não se queira como amigo. Por que não escolheu um dos seus irmãos, por exemplo, Tiago que era uma pessoa inteligente e foi líder do templo de Jerusalém? Poderia ser também um outro discípulo. Dizem que Pedro era o mais chegado. Na verdade, Pedro era afoito e este ímpeto o levava sempre a estar com Jesus e por isto que transparecia mais intimidade. Os demais eram mais discretos e reservados. Este temperamento não significa distanciamento, pelo contrário, intimidade tem tudo a ver com discrição e reserva de comportamento. Para que haja confidências, é preciso que não chame muito a atenção. Por exemplo, o temperamento de uma pessoa extrovertida geralmente não consegue guardar segredos. A pessoa extrovertida é muito popular e tem mais pessoas de todos os tipos no seu círculo de amizade o que é um grande risco para confiar segredos. Já a pessoa introvertida não se expõe e naturalmente não expõe o segredo de outros. Ser introvertido não significa incapacidade de se relacionar. O círculo social deste tipo de temperamento é bem mais reduzido e poderia dizer seleto. Saiba que nada disto é regra. 

É quase que impossível descobrir os motivos da escolha de alguém para ser amigo. A escolha de um cônjuge é menos complexa porque envolve razão e coração e a convivência exige um intencional grau de confiança necessário para se viver a dois. A questão da amizade é mais complicada porque não há compromisso de se conviver. A convivência é, de certa forma, esporádica. Como confiar em alguém que não compartilha o mesmo espaço de moradia? Como confiar em alguém sem a obrigação de se confiar e ter algum vínculo? Na relação de amizade, ninguém vai exigir confiança um no outro. Porque o compromisso é espontâneo e depositar confiança é uma entrega muito arriscada.

Utilize de todos os meios cordatos para fazer amizades, invista nelas e usufrua o melhor que a pessoa pode oferecer e deixe que os outros também usufruam o melhor de você. Caso nada tenha oferecer, reconsidere as amizades e a si mesmo para não gerar fissuras na relação e emocionais. Reflita no pensamento abaixo:

Eu não gosto de ter inimigos, mas, eles são importantes para as minhas convicções”.

quinta-feira, 13 de abril de 2023

SOB A INSÍGNIA DO MAL

Venancio Junior

O título desta reflexão foi dito em outras palavras a milênios pelo profeta João quando afirmou que o mundo jaz no maligno I João 5:19. Mas, o que significa esta expressão e condição a que fomos submetidos? Inclusive, muitos estão abismados com o grau de maldade nos acontecimentos trágicos nestes últimos dias ocorridos em algumas escolas e creches. Talvez a intensa propagação do extremismo ocorrida em anos recentes tenha inspirado estas ações absolutamente reprováveis em todos os sentidos. Por incrível que pareça, este comportamento é considerado uma liberdade de expressão que eles defendem. Qual a principal motivação para estas barbáries?

A violência não é um fato novo. O mal está por aqui já a algum tempo. Diria que, desde o princípio de quando houve a queda do ser humano e tudo foi desconfigurado e o caráter do ser humano desfigurado. Como era antes deste evento que mudou essencialmente a condição da raça humana? Conforme descrito na bíblia, o ser humano vivia numa íntima relação com o criador. Deus visitava diariamente o casal Adão e Eva no jardim do Éden (Gênesis 3:8). Porém, houve a sedução praticada pela astuta serpente. Interessante é que, como o mal estava no paraíso e por onde ele entrou? A única explicação plausível é que, quando Deus determinou que não se comesse da árvore, foi bem explícito que era do conhecimento do bem e do mal. Pronto, o mal foi colocado no contexto do jardim do Éden pelo próprio criador. Esta foi a brecha que o diabo encontrou para seduzir o ser humano e plantar a semente do mal. Poderia dizer que nem tudo eram flores. No jardim já existiam a fonte dos espinhos e das flores murchas. Observo também que Deus foi quem criou também o mal. Ele é a fonte de todas as coisas visíveis e invisíveis. Leia o texto de Isaias 45:7 “Eu formo a luz, e crio as trevas; eu faço a paz, e crio o mal; eu sou o Senhor, que faço todas estas coisas”. Numa outra reflexão afirmei que Deus sem o mal não seria completo. Deus é perfeito, pois, é bondade e composto pela fonte do mal porque é completo.

Afinal, o que é o mal? É uma pessoa ou é um espírito solto por aí? Não tem outra finalidade que não seja trazer malefício às pessoas. Por que Deus criou o mal? Na verdade, quando Deus afirmou que criou, o mal já existia em Deus. Não pense que Deus seja mal por causa disto. A soberania de Deus é absoluta. Se existe o bem, por conseguinte, o mal também existe. Reitero que o bem e o mal não são poderes equiparados. Esta similaridade de poder é restrita ao contexto da criação. No contexto celestial, só o bem prevalece. Deus definiu que o mal não teria mais parte no seu Reino e criou um contexto específico que é o inferno que foi criado exclusivamente para o diabo onde o mal foi manifestado e seus anjos caídos. O inferno não foi criado para as pessoas más. Como Deus expulsou a raça humana da sua presença, então, o único lugar fora do Reino de Deus é exatamente o que chamamos de inferno. O inferno nunca é uma escolha, mas, uma consequência.

O mal tem agido de forma avassaladora na vida das pessoas. Os que não acreditam em Deus, não conseguem responder o porquê o mal existe. O bem e o mal são como o imã onde os polos não se atraem, pelo contrário, se repelem.

Pois bem, qual, então, a influência dos conhecidos discursos de ódio que recentemente ocuparam até os púlpitos onde se deveria propagar as ações do bem? Recentemente houve uma confusão no meio religioso, especificamente o evangélico e quem poderia imaginar que os discursos políticos se tornariam plataforma eleitoral dos evangélicos. Não conseguimos identificar o que seja púlpito e o que seja palanque, pois, ambos são utilizados para campanhas políticas ou falar de um evangelho, por sinal, muito estranho. Usar o púlpito para falar de política é uma grave usurpação. Seria mais útil se utilizassem o palanque para falar do evangelho e nas suas propostas de mudança. Não é isto o que tem acontecido. E o pior é que as pregações evangelísticas dos pastores foram substituídas pelos discursos inflamados com ódio e não se envergonharam desta postura reprovável. Qual a principal motivação? Não muito tempo atrás as pessoas buscavam conforto e apoio nas pregações que aconteciam nas igrejas. Isto abriu um vácuo no ambiente da moral e da ética e que foi ocupado pelos extremistas que disseminam o ódio ultrapassando a fronteira verbal e assumiram a ação da violência até física sem limites. Estas pessoas não estão possuídas, mas, sofrem grande influência do mal. Há uma clara distinção entre ser possuído e ser influenciado. A pessoa possuída pelo demônio não tem controle sobre suas ações e não sabe o que está fazendo. Enquanto a pessoa influenciada vive normalmente e pode até frequentar a igreja, porém, pratica suas maldades de forma pontual. De certa forma, ela não tem consciência e nem controle sobre suas ações, porém, todas elas são intencionais, pois, deseja fazer aquele mal custe o que custar.

Na bíblia constam dois exemplos de possessão e influência. Um exemplo de uma pessoa endemoniada é relatado no livro de Marcos 5:2 a 5. Segundo o texto, ele vivia em túmulos gritando e nada podia prendê-lo e se cortava com pedras. Uma pessoa literalmente possessa pelos demônios. Um outro exemplo, agora de alguém que sofre influência, mesmo assim, é preciso que seja expulso quem está influenciando, é relatado também no livro de Marcos 8:33 quando Jesus acompanhado dos seus discípulos indaga-os para saber o que dizem sobre ele. Depois que os discípulos o respondem, Jesus fala sobre a traição, sofrimento, morte e ressurreição e Pedro contraria suas palavras afirmando que isto não aconteceria e Jesus de imediato expulsa a influência de Satanás naquela atitude de Pedro. Ele não estava possesso, apenas sofreu a influência para confundir todo o processo de salvação exposto por Jesus. As ações de satanás começaram quando foi precipitado nesta dimensão. Leia o texto de Apocalipse 12:9 “Foi precipitado o grande dragão, a antiga serpente, que se chama Diabo e Satanás, aquele que engana todo o mundo; sim, foi precipitado na terra, e precipitados com ele os seus anjos”. Perceba que aqui foi lembrado que o diabo e satanás é a mesma serpente do paraíso que engana todo mundo e tentou enganar a Pedro.

Diante deste cenário onde percebemos uma forte influência do mal na vida das pessoas, inclusive daqueles que professam a fé em Deus, há algum indício em que vemos Deus agindo no sentido de que o evangelho chegue até o coração destas e de outras pessoas? Talvez o que saia na grande mídia e nas redes sociais ofusque algumas fagulhas de boas novas que, eventualmente alguém deixe escapar sem qualquer consciência do que esteja querendo dizer. O que quero dizer é que Deus usa quem Ele deseja e da maneira como deseja. Com ou sem sutileza, é possível que Deus aja sem muito alarde na vida da pessoa. É uma característica da ação de Deus. Então, como perceber os verdadeiros adoradores em espírito e em verdade? Creio que o texto de Lucas 6:45 define muito bem como identificamos “O homem bom do bom tesouro do seu coração tira o bem, e o homem mau do mau tesouro tira o mal; porque a sua boca fala do que está cheio o coração”. Temos outro texto de Paulo que fala sobre os frutos da carne e os frutos do espírito Gálatas 5:19 a 23.

Infelizmente, enquanto estivermos nesta dimensão, sofreremos as consequências do mal e devemos cumprir com o nosso dever civil e se precaver utilizando os recursos das forças de repressão e de educação conforme a lei determina e como discípulos, amar as pessoas, interceder por elas e semear a semente do bem contida no evangelho que fala sobre a redenção propiciada por Jesus. Sobre a possessão e a influência, em ambas as situações é preciso expulsar satanás, pois, a sua livre e espontânea vontade é praticar o mal e, se possível, usar as pessoas para este fim. Eu acho que este é o problema, muitas pessoas estão permitindo que o mal influencie as ações. A Igreja é o contraponto neste contexto de um mundo entregue sob a influência do mal.

terça-feira, 11 de abril de 2023

TRADIÇÃO REFORMADA E DOUTRINA PENTECOSTAL NA PERSPECTIVA DO EVANGELHO

Venancio Junior

Desculpe-me pela presunção, mas, este não é um assunto tão polêmico e nem tão difícil de compreender como se julga nas igrejas e nos meios acadêmicos da teologia. Talvez a dificuldade esteja em saber como Deus age e qual o critério de escolha na manifestação dos dons. Com relação as inúmeras linhas de interpretação teológica, trata-se de uma pluralidade criada pelo próprio ser humano. Os dons também são diversos, porém, advindos de uma mesma fonte. Primeiramente devemos considerar que, se partirmos do princípio do evangelho, saberemos que não existem dois ou mais reinos de Deus para abrigar ortodoxos que é uma cisão da igreja católica que aconteceu no início do segundo milênio, os tradicionais/reformados que surgiram com a reforma de Lutero em 1517 e pentecostais que surgiram no começo do século 20 e mais recentemente na década de 60, os neopentecostais. A igreja é composta pelos justificados como um corpo só em Cristo. Diante disto concluímos que os questionamentos são restritos ao entendimento exclusivamente humano. Uma das maiores dificuldades em compreender o evangelho é que toda avaliação parte daquilo que se aprendeu dentro dos dogmas da denominação sem qualquer questionamento. Como o objetivo é esclarecer do ponto de vista do evangelho, então, é preciso, de certa forma, ignorar as diversas doutrinas dos homens. Jesus em Jerusalém, respondendo aos judeus que sempre o questionavam, afirmou "Examinais as Escrituras, porque julgais ter nelas a vida eterna, e elas mesmas são as que dão testemunho de mim" (João 5:39). Examinar é ler as escrituras e absorver o seu significado e, como o próprio Jesus afirmou que tudo se resume nEle.

Pentecoste é uma festa judaica que acontece depois de cinquenta dias após a páscoa que é a comemoração da libertação do povo judeu da escravidão do Egito e ficou muito associado a manifestação dos dons do Espírito relatado em Atos 2. Antes de prosseguir, preciso voltar alguns milênios até o tempo em que Deus conversava tete a tete com Moisés e a maioria acha que o pentecoste aconteceu somente a partir daquele evento de Atos. Pentecoste é manifestação espiritual e não tem forma ou ritual e nem como, quando ou um porquê específico para que o Espírito Santo aja na pessoa, pois, trata-se de relacionamento e intimidade com Deus que, em absoluto, seja um privilégio de alguns poucos iluminados. Óbvio que há na bíblia relações diferentes e pessoais de Deus para com cada indivíduo. Por exemplo, porque tratou a Davi que foi um adúltero como “segundo o coração de Deus”? Isto é muita intimidade. Muito antes de Davi, a relação de Deus com Moisés era como de dois amigos que as vezes até brigavam. Quer mais intimidade numa relação do que uma briga? Não me refiro àquela briga em que um quer destruir o outro, mas, discussão de valores e posicionamento sobre um determinado assunto. Moisés questionava a si mesmo como escolhido para libertar e conduzir o povo israelita a terra prometida que ele próprio não conheceu. Deus se permitiu discutir com alguns dos seus líderes que eram encarregados de conduzir o seu povo. Outro que também foi muito íntimo de Deus foi Jó. Deus se envolveu “pessoalmente” na vida de Jó e ainda por cima, determinou que o diabo não o matasse. É muita intimidade. Apesar de todo sofrimento possível e inimaginável, foi uma profunda intimidade esta relação de Deus com Jó. Todos foram seres humanos limitados e imperfeitos, porém, reconheciam a soberania de Deus em suas vidas. Pentecoste nada mais é que intimamente reconhecer esta soberania de Deus na vida e suas manifestações farão parte do processo de restauração da velha criatura. Em suma, as manifestações dos dons é uma consequência desta postura de rendição ao evangelho, caso contrário, nada fará sentido em termos de espiritualidade. Outrossim, o pentecoste não é um brinde para aqueles que são mais espirituais. A manifestação dos dons sempre existiu, porém, antes não eram conhecidos desta forma e tem o propósito em dar legitimidade à missão. Pentecoste sem a consciência da missão é como o talento infrutífero. Jesus no Ide enfatizou “...recebereis os dons e sereis minhas testemunhas”. Receber o dom e não sair em missão seria como jogar pérolas aos porcos.

Então, porque existe esta “briga” entre tradicionais que na sua maioria é composta pelas igrejas reformadas e de tradição calvinista e os pentecostais de doutrina arminiana? Os nomes foram “aportuguesados”, João Calvino era um teólogo francês e Jacob Armínio era um teólogo holandês. Não há relato de que nos seus fundamentos houve uma intenção em difundir os seus posicionamentos de forma correlata a doutrina tradicional ou pentecostal. O problema é que temos a necessidade em criar rótulos que nos identificam nos diversos contextos sociais e nas igrejas não é diferente e muitos até se orgulham em serem reconhecidamente tradicionais ou pentecostais. Esta postura nada mais é que valorizar a religião com um claro desvio de função. A igreja não tem o propósito de dividir ou excluir, mas, incluir as pessoas com o evangelho. Se o evangelho que está sendo difundido divide a igreja, este evangelho é essencialmente questionável.

As igrejas históricas tradicionais de doutrina reformada são as mais antigas desde a reforma protestante promovida por Martinho Lutero em 1517. Antes desta reforma, haviam somente duas igrejas cristãs, a católica que significa igreja-mãe e a ortodoxa que se desligou de Roma em 1054. Esta reforma de Lutero poderia afirmar que é fruto de uma manifestação espiritual que pode ser considerado como uma ramificação do pentecoste acontecido no Novo Testamento. A manifestação do Espírito Santo na vida humana é para provocar mudança no sentido de realinhar o caminho da espiritualidade. As igrejas pentecostais se julgam detentoras da legitimidade espiritual por buscar e receber os dons espirituais conforme descrito em Atos 2. Por outro lado, o zelo pela tradição bíblica não qualifica as igrejas oriundas da reforma como as que detêm o privilégio em ratificar as doutrinas descritas no evangelho. Pessoalmente julgo ridículo esta disputa que gerou mais cisão do que união comum e também nada de significativo trouxe a igreja em termos de discernimento espiritual. Os fundamentos do evangelho são para todos os que buscam a verdade que é Cristo. Tudo se resume nEle. Há um só mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo, homem! Há um só Deus pai de todos! Então, como existiria duas doutrinas, duas igrejas ou dois povos escolhidos? Simplesmente não existe!

Não pense que estas linhas religiosas é algo recente. No tempo de Jesus já existiam diversos grupos. Os mais conhecidos foram amplamente citados na bíblia principalmente nos embates com Jesus que veio exatamente confrontar a religião/instituição. Observe abaixo as características de cada grupo:

Saduceus

Este grupo à qual pertenciam os sacerdotes era o grupo mais influente na época de Jesus. Eles controlavam o sinédrio que era a suprema corte, tinham também o controle econômico e político tanto é que influenciaram diretamente a condenação e morte de Jesus.

Fariseus

Este grupo acreditava na ressurreição, nos anjos e aguardavam o Messias. Eram observadores da lei judaica e tinham forte influência sobre o povo a qual pertenciam também os escribas. Eram denominados como legalistas.

Essênios

Este grupo não é citado na bíblia, mas, foi registrado pelos historiadores que se tratava de um povo que decidiu se isolar e viver uma vida em comunidade observando a fé judaica que aguardava a vinda do Messias.

Zelotes

Este grupo era o mais radical de todos se assemelhando aos atuais extremistas guerrilheiros. Mesmo pertencendo ao partido judaico, eles se opunham à dominação romana.

Apesar de todo este contexto da época já bastante confuso e dividido, a missão de Jesus foi exatamente quebrar estas barreiras e mostrar o verdadeiro caminho que era ele próprio. Mesmo assim, aqueles que seguiram a Jesus foram rotulados de cristãos. Jesus não criou nenhum grupo nominalmente e até criticou aqueles que insistiram em inserir o cristianismo numa religião e Jesus mais uma vez demonstrou que a verdadeira religião é atitude e não uma instituição. Mesmo com este claro exemplo, a instituição ocupa até os dias atuais o lugar que deveria ser ocupado pelos exemplos de Jesus. O evangelho é muito específico sobre as manifestações espirituais que se encontram na atitude e não na instituição. Diante disto, seguir e defender uma linha teológica como forma de legitimar a espiritualidade é sobrepor a instituição acima da atitude que revela a fé essencial. Pessoalmente defino a instituição apenas como uma conveniência social em que cada indivíduo se identifica e vive a sua espiritualidade nas atitudes e jamais naquilo que a denominação classifica como a fé legítima. Por isto que surge a grande dúvida de qual a verdadeira religião? Do ponto de vista da instituição, cada uma se julga a verdadeira. Do ponto de vista da atitude, nenhuma instituição é verdadeira. As atitudes em relação ao próximo revelam a verdadeira religião independentemente da comunidade que se frequenta. Partindo deste princípio, o pentecoste faz todo sentido e as manifestações espirituais serão legítimas no sentido de gerar frutos para o Reino de Deus que, como já afirmei, existe somente um Reino e um só Deus que se manifesta em nós através do teu Santo Espírito. Para enxergar a verdadeira religião e a verdadeira igreja é preciso viver estas manifestações nas atitudes fazendo diferença na comunidade que frequenta. A comunhão é uma das manifestações do pentecoste. O amor ao próximo também é uma das manifestações do pentecoste. Considerar os outros superiores a si mesmo também é uma das manifestações do pentecoste. Amar a Deus acima de todas as coisas é o princípio de todas estas manifestações espirituais. O próprio Jesus foi confrontado pelos fariseus/religiosos para saber o que era mais importante que a religião. Observe o texto “Mestre, qual é o grande mandamento da Lei? Respondeu-lhe Jesus: Amarás a Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento. Este é o grande e primeiro mandamento. O segundo semelhante a este é: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo. Destes dois mandamentos dependem toda a Lei e os profetas”. Mateus 22:36 a 40. As demais doutrinas dependem absolutamente em tudo destes dois mandamentos. Os sacerdotes tentavam compreender esta perspectiva daquilo que eles já conheciam legalmente, pois, também tinham fome espiritual porque uma mera tradição não era o suficiente para saciar esta fome. As pessoas têm fome, não somente de comida física, mas, de saciar a fome espiritual. O que podemos concluir neste texto? “Declarou-lhes Jesus: Eu sou o pão da vida; o que vem a mim, de modo algum terá fome; e o que crê em mim, nunca jamais terá sede”. João 6:35. Logo após a multiplicação dos pães, a multidão procurava Jesus porque tinha fome, mas, não de pão, pois, já estavam saciados, mas, buscavam saciar a fome espiritual e não encontraram na religião dos judeus com os seus rituais da tradição que era conhecida por todos. Ainda faltava alguma coisa que estava muito além da religião e Jesus se apresentou como aquele que trouxe a legitimidade da tradição e do pentecoste.

Todos que se rendem ao evangelho são tradicionais/reformados. Mas, e os pentecostais, como se classificam neste contexto? A tradição nada mais é que a doutrina do mesmo evangelho dos pentecostais onde se encontram as manifestações espirituais. Todos os que são pentecostais, também o são tradicionais reformados. Não tem como dissociar um do outro, pois, os fundamentos de ambos são análogos. 

Para finalizar em grande estilo, creio que o texto de Paulo resume tudo o que se refere a atitude em relação a Deus e ao próximo: "O amor jamais acaba; mas havendo profecias, serão aniquiladas; havendo línguas, cessarão; havendo ciência, desaparecerá;" (I Coríntios 13:8). Este pequeno trecho aborda tanto a crença dos pentecostais com manifestação de dons de profecias e de línguas e também dos tradicionais reformados na questão do conhecimento bíblico e o amor está acima de tudo e supera ambos os conceitos. Tanto a doutrina pentecostal como também a doutrina reformada, são apenas teorias dos homens. Amor não é teoria, é atitude correlacional e se revela na comunhão.

segunda-feira, 3 de abril de 2023

LADRÃO DE FELICIDADE

Venancio Junior

Diante de tanta aglomeração urbana o que causa efeitos sociais negativos profundos, somos submetidos a todo tipo de violência, no trânsito, no roubo a residências, nos carros e nas ruas, as tragédias previsíveis causadas pelas chuvas e a ocupação desordenada. A onda de criminalidade cresce a cada ano cujo índice é consideravelmente maior que o crescimento econômico e social. Nossos gestores públicos, na prática, parecem que não se importam em nada com isto e investem somente em seus projetos pessoais. Nos discursos de campanha ouvimos promessas e mais promessas de que tudo vai melhorar caso sejam eleitos. No final das contas, são mentiras infindas e continuamos na esperança de dias melhores, ao que parece, nunca vai chegar.

Chega o próximo pleito e os discursos não mudam e a cada dia o crescimento desordenado tornam-se “currais eleitorais” e ninguém é capaz de mudar a realidade, nem mesmo os próprios moradores. Pobreza, falta de saneamento básico que afetam diretamente a saúde, desemprego que causa instabilidade nos relacionamentos familiares e todo o caos possível que são consequências dos discursos mentirosos que prometeram mudar para melhor a realidade das pessoas. A classe melhor favorecida, com medo (e com razão) de que sua vida e da sua família sofram as consequências desta insegurança quase que se refugiam nos condomínios. A princípio, é seguro e confortável o que em tese, é possível desfrutar da felicidade que os anúncios prometeram.

Acreditar em propaganda e em político é tão inútil quanto ensacar vento. São os verdadeiros ladrões de felicidade. A felicidade não está no anúncio que promete vida nova e nem nos discursos políticos, mesmo que se cumpra à risca tudo o que foi prometido. A felicidade está em qualquer lugar. Os fatores externos é apenas o contexto e não a essência.

Além destes relatados, existem outros ladrões de felicidade. Os maus sentimentos são os principais ladrões de felicidade. A frustração do anúncio de vida nova e da propaganda mentirosa dos políticos talvez sejam os maiores ladrões de felicidade. A mágoa causada por alguém próximo também é um ladrão de felicidade. Pior que, quanto mais próximo, mais desprovido de felicidade se torna. Hoje em dia as famílias se tornaram um sumidouro da felicidade. Os casais não se entendem, os pais não se entendem com os filhos e os filhos não se entendem com os seus irmãos. Se ampliarmos o leque, os sogros e os avós não se entendem com os seus genros e netos e os tios e tias não se entendem com os seus sobrinhos. Neste contexto, a mágoa é o principal elo de sentimento predominante na família. Consequência disto, a felicidade foi totalmente roubada pela mágoa. A tristeza causada por algo que aconteceu com alguém também rouba, e muito, a felicidade. A morte de alguém querido ou a tristeza de pessoas queridas também roubam a felicidade.

Onde mais que existe o roubo da felicidade? No trabalho, a frustração em ser preterido a algum cargo de promoção é um fator que rouba a felicidade. O relacionamento profissional também é algo que rouba a felicidade quando se percebe que os colegas estão mal-intencionados nas suas aspirações e falam mal do colega e esquece deles quando a situação traz vantagens profissionais. Na igreja também existem fatores que roubam a felicidade. O que se acredita e o que os líderes religiosos sempre defendem é que na igreja podemos encontrar a felicidade, não uma simples felicidade, mas, a felicidade plena e absoluta. Qualquer pessoa vai à igreja em busca da felicidade. Qualquer um tem aquele momento de solidão emocional e recebe uma mensagem religiosa de esperança e quer encontrar pessoas que a faz feliz. A frustração é precedida pela esperança. Quanto maior a esperança, maior é a frustração. Quando depositamos a esperança nas pessoas, a frustração é o muro onde será uma barreira, muitas vezes intransponível. A frustração tem uma ramificação no fator surpresa que pode ser positivo ou negativo. Surpreendente é aquilo que brota no caminho do inesperado e não tem raiz. Posso até classificar este adjetivo como um oximoro quando os significados entre si estão juntos na mesma frase, porém, os significados são antônimos, tanto pode ser de felicidade ou de infelicidade.

É sempre um risco ser feliz. Para avançar na vida o risco será sempre iminente. Ilude-se quem procura sempre ser feliz e faz de tudo para não ser infeliz. O problema da felicidade roubada é que para ser feliz tem de sair da defensiva e manter a guarda aberta. Isto é totalmente arriscado. Para os padrões humanos a que estamos acostumados, isto seria um absurdo. Mas, existem outros conceitos de felicidade que não é exatamente o que se busca considerando o que foi aprendido desde criança de que o importante é ser feliz.

Vamos buscar na bíblia outros conceitos de felicidade, muitas vezes surpreendentes. A bíblia fala sobre a igreja, mas, não fala que na igreja qualquer pessoa será feliz. A bíblia fala sobre diversos tipos de relacionamento, mas, não categoriza que nas relações humanas em qualquer nível se encontra a felicidade. É surpreendentemente absurdo quando lemos na bíblia que “Há maior felicidade em dar do que em receber” (Atos 20:35). O apóstolo Paulo afirma que foi Jesus quem fez esta afirmação. Não há nenhum relato bíblico sobre Jesus fazendo uso destas palavras. Paulo, na verdade, se referia as bem-aventuranças que foram apresentadas pelo próprio Jesus e que é um contrassenso absurdo daquilo que nos foi ensinado sobre a felicidade. Feliz e bem-aventurado são sinônimos. Por exemplo, bem no começo, na segunda exposição das bem-aventuranças Jesus afirma que felizes são os que choram porque serão consolados!? É uma felicidade surpreendente, que, neste caso, é positiva ou negativa? Jesus fala sempre em se doar ou se entregar a uma causa altruísta, daí, no final, encontra-se, enfim, a felicidade tão almejada. Muitos farão aquela cara de “sério Jesus que isto é a felicidade prometida?”. O que nos foi prometido que vai gerar em nós plena felicidade “os olhos ainda não viram e nem os ouvidos ouviram” (I Coríntios 2:9). O foco de Jesus não era e nunca foi a busca da felicidade na terra, mas, no Reino de Deus. Alguns textos bíblicos nos trazem algum indício das práticas que geram esta felicidade focada no Reino de Deus, que não é uma felicidade passageira como a que vivenciamos, mas, é uma felicidade eterna. Na vida terrena a felicidade é relativa. Estamos felizes quando não estamos tristes. Como saberemos o que vem a ser a felicidade se no contexto do céu não existe tristeza? A promessa é de Deus, então, Ele sabe o que está falando e quem é capaz de dizer o contrário?

Primeira coisa, segundo a bíblia, para ser plenamente feliz é preciso agradar a Deus em tudo. Colossenses 1:10 lemos "...vivam de maneira digna do Senhor e em tudo possam agradá-lo". Dá-se a entender de que Deus é que precisa receber algo para se sentir feliz. Agradar a Deus, de certa forma, é fazê-lo feliz. Mas, e nós como ficamos na história? Onde exatamente está escrito de que seremos felizes com esta atitude de devoção? Já lemos que Jesus afirmou que muito melhor dar do que receber. Dedicamos tudo a Deus e o fazemos feliz. Deus não precisa que o façamos feliz. Todo o processo em busca da felicidade é por causa de nós e não por causa de Deus. Lembrando de que estamos num contexto de vida que foi essencialmente desconfigurado e foi preciso implantar um processo de reintegração do ser humano com Deus. Não foi algo fácil para Deus que se dispôs pessoalmente na pessoa de Jesus Cristo para que a esperança da felicidade fosse real novamente em nossas vidas. A felicidade genuína e absoluta é aquela em que não há oximoro quando felicidade e tristeza são antônimos entre si e não compõem a mesma frase ou, neste caso, a mesma dimensão.

É apenas uma suspeita ou Deus quer demonstrar com isto de que devemos nos esvaziar de nós para sermos cheios da sua felicidade? Então, podemos afirmar com plena convicção de que o Deus que é a fonte da felicidade tem todo o interesse por nós a ponto de nos oferecer a felicidade eterna.

Quando pensarmos em nós mesmos, lembremos de Deus de que tudo é para sua glória e honra. Este é o único processo eficaz que nos torna esvaziados de nós mesmos e cheios da sua graça. A graça de Deus é inviolável e ninguém consegue roubar a felicidade propiciada por Ele a nós.