segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

EMPINANDO PIPA EM MEIO AO CAOS

Venancio Junior

Quando éramos crianças a única preocupação era o que iríamos fazer pela manhã ou à tarde no tempo livre. Lembro dos meus 5 ou 6 anos quando meu pai me deu de presente de natal um velocípede (triciclo) e quando sai na calçada pensei comigo: "agora vou rodar o mundo inteiro". E isto aconteceu de fato. Fui até a praça próxima de casa e rodei o meu mundo inteirinho. O meu mundo era ali, sem perigo e muitas crianças brincando na praça. E na hora do recreio na escola? Brincava, pulava e o mundo era maravilhoso, apesar de todos os problemas que nos cercavam, mas ainda não assimilados pela nossa inocente mente. À noite era literalmente como criança, não nos assustava porque os nossos pais-heróis estavam à espreita para nos proteger de qualquer “assombração”. Na adolescência, o restinho da infância ainda me motivava a brincar, agora empinando pipa. Lembro que esquecia do mundo quando a pipa estava no alto. Meu nariz ainda tem as marcas do sol. Não me importava com almoço, jantar e nem mesmo com as garotinhas que me ligavam para conversar. Esgotei as brincadeiras de infância e aos poucos a vida real foi mudando as minhas motivações e os interesses.

         Tornamo-nos adultos e o que mudou? Tudo mudou, inclusive a nossa inocência tão rica e que nos dispunha sempre a viver e compartilhar a própria vida com os amigos. O mundo real se tornou presente em nossos sentimentos e emoções. Descobrimos que nem todos são filhos de Papai-Noel e que as motivações que insuflavam os nossos ideais infantis não existiam mais. Interessante que, quando eu era criança não queria ser adulto porque não poderia mais brincar e me divertir.

Jesus foi aquele que conhecia a perspectiva de uma criança quando disse em Mateus 18:3 para sermos iguais a elas. Já o apóstolo Paulo demonstra uma aparente contradição com o mestre e diz em I Coríntios 13:11 para que deixemos de ser crianças. Afinal, o que é certo ser ou não ser uma criança? Por que Jesus usou a formação pueril de uma criança como exemplo de condição para se herdar o Reino de Deus? Em Mateus 18:03 está escrito “Quem não for como criança não poderá herdar o Reino de Deus”. Independentemente da situação ou época, criança é sempre criança. Observe os refugiados de guerra, as crianças estão brincando. Outro dia vi numa reportagem no improvisado acampamento palestino que fugiam de Gaza, uma pipa voando em meio ao caos. Quem teria tanto desapego daquele contexto para tranquilamente soltar uma pipa? Obviamente, uma criança. Desta forma que devemos nos chegar a Deus, como uma criança. Deus nos orienta para que tenhamos o olhar de uma criança que consegue soltar pipa em meio ao caos do mundo, inclusive, louvar a Deus como criança que é de onde sai o perfeito louvor (Mateus 21:16). Neste texto Jesus deu como exemplo um lactante, ou seja, uma criança de peito que ainda desconhecia os percalços da vida. Jesus conhece o sentimento infantil e chamou a atenção para o desprendimento dos valores nada inocentes do mundo.

Mas, e o apóstolo Paulo falava sobre o quê exatamente? As cartas de Paulo são na sua maioria voltadas para a maturidade espiritual. Nascemos criança, crescemos e nos tornamos maduros e assumimos os rumos da nossa vida. Paulo enfatizou de que no novo nascimento é a mesma situação. Nasce como uma nova criatura, cresce no conhecimento da palavra e amadurece para que se possa caminhar sozinho sem a dependência de outra pessoa. O contexto do mundo exige que devemos ter maturidade. As oportunidades em ser seduzido por aquilo que nos afasta do Pai é uma realidade que se convive, tal como uma sombra. Onde estivermos, esta sombra estará nos acompanhando. É preciso ter maturidade para dizer não a estas armadilhas. Há na bíblia um provérbio que diz "Há caminho que parece reto ao homem, mas no final conduz à morte" Provérbio 14:12. Somente com maturidade é possível ter a percepção do mal. Um dos princípios da maturidade é se desapegar da falsa segurança em confiar em si mesmo e firmar a consciência no Pai.

Apesar de adultos não podemos nos privar do sentimento infantil cujas ações se equivalem ao propósito do Reino de Deus. O que consiste este Reino? Viver em paz com todos, amar ao próximo como a ti mesmo e sobretudo amar a Deus acima de todas as coisas e se alegrar no Senhor sempre (Filipenses 4:4). Perder estes sentimentos é se distanciar do Reino, o que chega a ser uma estultice porque deixamos de ser co-herdeiros com Cristo e perderemos todos os privilégios do Reino.  Criança no sentimento e adulto na ação. Não pode ser uma situação dispare. O apóstolo Paulo já advertiu que quando éramos crianças agíamos como crianças e agora adultos devemos agir como adultos. Ele se referiu a motivação (sentimento), porém com consciência (ação) e maturidade. Atualmente muitos ensinam errado porque não viveram aquilo que não sabem e inventam fórmulas de se chegar à Deus e alcançar as suas bênçãos, por conseqüência disso não conseguem se desenvolver e ter o espírito desarmado de uma criança. A maturidade cristã não deve ser usada como arma de soberba. Devemos sempre ter a consciência de que somos eternamente crianças dependentes de Deus que é o nosso Pai. A criança, enquanto criança, sempre será dependente do pai. Somos dependentes de Deus Pai. Esta é uma condição da conversão verdadeira. Não podemos ficar dependentes do mundo porque jamais estaremos seguros, é como ficar órfão. Uma criança órfã é profundamente carente, pois, não tem o carinho e o afeto do pai. Uma vez que fomos adotados por Deus, agora temos o Pai que cuida de nós e seremos eternas crianças pela nossa dependência dele e crescendo a cada dia em sabedoria e graça.

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