Venancio Junior
E
se, de repente, tivesse uma forma de controlar a vida de todo mundo? Tem situações
que o desejo é acelerar a vida para fugir do tédio ou de uma situação
desagradável. Enquanto em outras, o desejo é parar o tempo quando se está em
férias com a família e em todos os momentos agradáveis.
Acredite,
mas, é possível pausar o tempo de todo mundo. Antigamente quando o sinal de tv
era analógico, isto era impensável que haveria alguma possibilidade de
controlar o seu conteúdo. No início do sinal digital ainda não havia esta
possibilidade. Quando chegaram os canais de streamings com transmissão pela
internet, a possibilidade em controlar o conteúdo através de um simples
controle remoto gerou uma falsa ideia de que seria um controle absoluto. O
controle é parcial daquilo que se vai consumir e pausar quando desejar, porém,
o conteúdo disponível jamais poderá controlar.
Imagine
quando pausa uma exibição na televisão? Literalmente, o mundo inteiro foi
pausado. Atrás daquilo que se está vendo há o restante do cenário. Se
avançarmos nesta imaginação, atrás daquele local há paredes, muros, ruas,
pessoas andando, carros transitando de um lado para outro e uma vida inteira do
cotidiano que foi pausada pelo controle remoto. Absolutamente o mundo inteiro
indiretamente está pausado. Não conseguimos enxergar porque o objetivo da
transmissão é restrito aquela cena do programa ou do filme. Numa visão de raio-X
poderia facilmente enxergar o mundo pausado. Mas, quem estava correndo algum
tipo de perigo, o tempo parou e o perigo foi adiado. Quem estava tentando o
suicídio, “ganhou” uma sobrevida na pausa do controle remoto. Aquele acidente
que estava quase acontecendo, não aconteceu e todos os envolvidos ainda estão
ilesos e fisicamente preservados. Quem estava festejando, ganhou um tempo a
mais de comemoração. Aquele tempo gostoso das férias em família foi
momentaneamente prolongado. Era tudo o que se deseja. Quem nunca pensou
“gostaria que o tempo parasse agora” ...ou não.
Imagine
na vida se tivesse um controle remoto? No filme Click de 2006, Adam Sandler fez
o papel de alguém que tentou fazer isto com a sua vida e não deu muito certo.
Ele queria controlar algumas situações de tédio avançando para que passasse bem
rápido e acabou que algumas situações boas com a família avançaram também,
pois, a vida funciona num sistema de tautocronia quando tudo acontece ao mesmo
tempo. Foi uma decisão unilateral e infeliz.
Apesar de que o desejo é, de fato, controlar a
vida, isto, muitas vezes não é possível. Quantas vezes houve ações neste
sentido e, a princípio, deu tudo certo e as coisas caminharam bem, porém, no
final, o resultado não foi exatamente o que se esperava. Um dos maiores
fascínios da vida é o inesperado e a boa surpresa. Lembro-me de algo muito
simples, mas, que reflete muito bem esta situação. Quem não conhece o famoso
vale-presente? Na dúvida se vai agradar ou não, a pessoa adquire um
vale-presente e o presenteado faz a troca por algo que lhe agrade. Legal, né!?
Que nada! Terrível este tal de vale-presente. Onde está a criatividade na
escolha do presente? Conhecendo a pessoa, que tal buscar algo que condiz com o
gosto pessoal? Se a pessoa não gostar, tudo bem, a vida não é perfeita, mesmo
nas coisas mais simples. Este é o problema em tentar controlar tudo na vida
porque não conseguimos ter o controle de tudo. Quem tem filhos e se os pais são
possessivos, a intromissão no destino dos filhos será muito além do necessário
e tenta a qualquer custo livrar os filhos dos infortúnios e das decepções. Não
tem como controlar e isto também faz parte da vida e ajuda na administração das
emoções levando à maturidade. Se tudo na vida fosse perfeito, não teríamos um parâmetro
para diluir e organizar as expectativas. Da mesma forma que nas casas quando
surgiram os aparelhos de tv com esta função em que havia “briga” pelo controle
remoto porque as opções de programa eram restritas aos canais disponíveis.
Muitas vezes assistia aos programas por tabela, pois, a televisão era a forma
de entretenimento mais emocionante diante de um contexto com pouquíssimas
opções disponíveis.
Todos querem ter o controle para definir suas
vidas da forma que desejarem. Nem mesmo a própria vida é possível ter o
controle total. Em tempos de busca de autonomia, ignorar que o mundo digital é
que está com o controle é um erro graxo. Consumimos conteúdo e nos
relacionamentos, muitas vezes, convivemos com pessoas que não queremos. Muitas
situações fogem do controle porque se criou muitas raízes que são impossíveis
de se arrancar ou não se queira arrancar. Por exemplo, no trabalho, o salário é
bom e o tipo de trabalho é o que sempre desejou, mas, o ambiente de trabalho e
as pessoas que se convive são difíceis de diluir para que o emocional não sofra
uma sobrecarga. Mudar de empresa resolveria esta questão, mas, perderia o bom
salário que pode não conseguir outro equivalente e aliada ao tipo de trabalho
de preferência tornaria esta decisão muito arriscada. Não somente o empregado,
mas, também, o patrão pode estar sofrendo este mesmo tipo de pressão, dentre as
dezenas deles, por exemplo, quando precisa melhorar as condições de trabalho
dos seus funcionários em que há o comprometimento financeiro e precisaria fazer
alguns ajustes sem comprometer a produtividade, a qualidade do produto e até
mesmo a estabilidade dos funcionários que sempre gera insegurança. Ainda no
contexto empresarial, quando as decisões dependem também de sócios que
geralmente divergem nos ideais, como manter o controle e canalizar suas
propostas? Neste caso que não se tenha o controle total, é preciso equalizar
cada momento e cada palavra no sentido de serem aliados no suporte diário.
Provavelmente já tenha ouvido nos tribunais “tudo o que disser será usado
contra você”. Ser tardio em falar é uma forma de manter o controle da situação
e utilizar somente aquelas palavras em que poderão acrescentar valores numa
futura discussão. Lembrando que desenvolver ações que visam unicamente obter o
controle total pode ser algo muito perigoso, inclusive, até mesmo ter o
absoluto controle pode não ser algo construtivo. Qualquer que seja a decisão
deve se ter a consciência de que afetará a vida de cada um dos envolvidos, seja
o empregado ou o patrão e os seus sócios. A melhor postura é ter o controle dos
seus ímpetos e nos momentos favoráveis não se exceder na euforia e nas
contrariedades não deixar que a frustração e a mágoa assumam o controle. Nesta
condição, qualquer decisão será desastrosa, pois, tem raiz na dor.
Trazendo para outro contexto, o da família,
onde a intimidade gerou raízes e quanto mais íntimo, mais profundas se tornam e
o controle está totalmente fora do alcance? A proximidade no contato é algo
natural da mesma forma que os atritos que são inevitáveis. Por diversas vezes
se procura o controle da situação, seja, um filho que tomou uma decisão errada
ou o cônjuge que decidiu se livrar de algumas frustrações fazendo algo que iria
agravar mais ainda o relacionamento já instável e este leque pode ser ampliado
para o contexto dos demais familiares, seja o pai, a mãe, irmãos e irmãs,
depende muito do grau de proximidade que se esteja vivendo. A frustração, mágoa
e outros sentimentos desta natureza são profundamente nocivos à saúde emocional
e precisa ter uma atenção dedicada no sentido de diluir o seu acúmulo. Repito
porque é muito importante que, qualquer decisão nesta condição não terá uma
construção sólida porque é fundamentada na dor e muitas vezes, o sentimento que
gera vingança assumirá o controle e o desastre será “incontrolável” trazendo
perdas que não poderão ser reconquistadas.
E
na igreja, será que existem pessoas que querem controlar a vida das pessoas?
Será que existem pastores que trabalham para controlar o seu dinheiro e sua
vida para que se dedique mais a igreja em detrimento da família? Sem esquecer
que existe aquele grupo influente que controla quase todas as decisões da
liderança. Infelizmente, o poder de coação utilizando a influência religiosa é uma
realidade crescente em nossas igrejas. Quanto mais poder, menos unção. Isto é
fato, pois, as ações estão bem distantes dos fundamentos do evangelho. Pregam
um evangelho que amedronta as pessoas com o inferno e o virtual "castigo", ao invés de focar no amor
de Deus. Fazem isto quando percebem que assumiram o controle total do
sentimento das pessoas. Justificam o sacrifício como se fosse dedicado à Deus.
A única pessoa que deve ter o total controle da nossa vida é o Espírito Santo
quando Jesus, logo que ressuscitou afirmou que nos deixaria um outro consolador
que, na verdade, era ele próprio. Por que Jesus falou isto? Jesus é onisciente
e sabe de tudo o que acontece e se perdesse o controle da sua missão sem
concluir, tudo o que foi conquistado estaria fadado a ser controlado pelo diabo
que anda ao redor de cada pessoa pronto para destruí-la. O principal objetivo
da missão de Jesus é assumir o controle total do destino de cada um que se
rende ao evangelho promovendo a verdadeira liberdade. Muitos líderes usurpam do
chamado e falam em nome de Deus numa tentativa de assumir o controle da vida
das pessoas. Devido a isto, acontecem tragédias prenunciadas como aconteceu com
o Reverendo Jim Jones e seus seguidores em que muitos cometeram suicídio numa
justificativa de que o governo norte-americano estaria conspirando contra eles.
A maioria das 918 pessoas que estavam sob o seu controle cometeu suicídio e
outras foram assassinadas e ele próprio também cometeu suicídio. Uma das
maiores tragédias envolvendo a religião porque alguém assumiu o controle
daquelas vidas.
Jamais tenha atitude que agrida a normalidade sensata e se perca o controle da situação. É preciso estar atento e ter iniciativas que combatam vícios e maus costumes que escravizam e tornam a vida sem controle no sentido pejorativo. Por outro lado, ter uma vida sem o controle remoto dos aparelhos digitais despertaria o interesse por outras atividades sadias que se perderam pelo caminho e diluem as más energias do cotidiano. Ter uma vida religiosa de dedicação às pessoas e uma liderança que esteja sintonizada nas propostas do evangelho e ser alguém que faça diferença na vida das pessoas no contexto familiar, social e profissional são fatores preponderantes para que se tenha um controle com sabedoria.
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