Venancio Junior
Dizem que o casamento é
uma loteria. Muitos insistem nesta teoria fazendo entender que se trata de uma
“roleta russa”. Será que isto é verdade? Acho que não. Primeiro, sorte
biblicamente “falando” significa possibilidades. Não é algo solto que acontece
por acaso. Segundo, as pessoas são imprevisíveis, caso contrário, acertaríamos
sempre. Não existe uma receita infalível. Sequer receita exista. O que existe
são princípios aplicados na vida individual que afetam diretamente o outro numa
situação de compromisso conjugal. Qual seria, então, o melhor caminho? Na
crise, a decisão certa, muitas vezes, é não tomar nenhuma decisão. Parar,
refletir e deixar que as coisas fluam naturalmente sem perda de controle porque
qualquer “pré-ocupação” gera tensão e, nesta condição, a falta de serenidade
anula a capacidade de optar pelo melhor caminho que, pode não ser o que queira,
mas, o que precisa, mesmo sendo dolorido e traumático. Pode ser que o caminho
ainda não tenha sido encontrado e precise abri-lo na “mata cerrada” do
relacionamento. Estas crises, muitas vezes, acontecem nos primeiros anos do
casamento quando há somente os dois. Assentamento das emoções, adaptação das
personalidades e uma gama de costumes e manias dispostas num ambiente agora
compartilhado. Isto pode ser o começo de uma grande e excitante jornada.
Mesmo casados e já
acostumados com a nova vida, o que nunca deve deixar é o respeito mútuo. Lembro
que respeito não é um mérito, mas, uma questão de educação. Respeitamos porque
somos educados e não porque a pessoa merece. O casamento pode ter sido
circunstancial, conveniente ou nunca fez parte de um processo construtivo e o
resultado, neste caso, não precisará de terapia de casal para detectar onde
aconteceu o erro. Vamos considerar o erro como ações na tentativa em acertar. O
erro não é uma culpa isolada. O casamento é uma relação concomitante. Onde não
há parceria, é impossível ter um ambiente que respire segurança quando tudo
favorece a fragmentação do relacionamento. Numa situação de extrema
insegurança, ao invés de se abrir e viver a verdade a dois, por mais dolorida
que seja, se omitem e buscam soluções fora do núcleo conjugal gerando, desta
forma, mais problemas tanto para o relacionamento e, muitas vezes, traumas
pessoais que se perpetuará na vida individual de ambos. Quando isto acontece,
numa situação emocional em “frangalhos”, o melhor é evitar os ressentimentos
que causam desfiguração em tudo o que foi construído e que, em hipótese alguma,
deva ser descartado como se fosse algo sem importância. A pressa é livrar-se o
mais rápido possível do passado. Ninguém consegue se livrar do passado. O que
precisa é aprender a conviver com ele.
Na vida, de uma maneira
geral, muitas coisas não acontecem conforme planejamos. A frustração surge
quando o que se espera fica aquém daquilo que se idealizou. Isto é normal. Esta
situação será saudável e construtiva se considerar como um momento de rever a
relação se não se tornou algo nocivo à saúde emocional e nada tem acrescentado.
Não existe comportamento padrão generalizado porque cada um tem a sua
peculiaridade que deverá ser administrada de forma que se adéque aos diversos
níveis de personalidades. Não hesite em desabafar, porém, com sabedoria. Evite
o acúmulo de carga emocional, pois, poderá descarregar em hora errada.
O gostoso de qualquer
relacionamento é saber administrar o inevitável. Até mesmo as crises, por pior
que seja, é obrigação comum enfrentar a dois que, quando bem-sucedido, traz
grande prazer fortalecendo o vínculo. O relacionamento conjugal nunca deve ser
assumido como um risco. Pode ser um grande e maravilhoso desafio na vida.
Superá-los juntos ou separados, é uma questão de hombridade. Independentemente
da decisão, o que foi construído juntos deve ser preservado mesmo separados. O
respeito é algo que sempre deve fazer parte da relação por uma questão de
princípios. Como já afirmei, o respeito nada tem a ver com mérito. Tem tudo a
ver com caráter elevado. Perder o respeito é desvio de caráter. Isto é muito
sério. O que seria exatamente a falta de respeito? Na relação conjugal, o pior
deles é a traição. Quem trai, não pode dizer que errou, pois, só erra quem está
tentando acertar e traição jamais será uma tentativa em acertar. Traição é uma
prática do mal. Não precisa ser exatamente um caso extraconjugal, mas, pode ser
também uma simples decisão isolada que infringe diretamente o casal ou a
família. Expor problemas conjugais ou familiares a terceiros. De qualquer
forma, a traição é uma extrema falta de respeito e deve ser banida. Isto se
aplica também na vida social, profissional e outros.
Em qualquer nível de
relacionamento, a atenção e dedicação ao outro deve ser sempre de forma
altruísta. Na relação conjugal o carinho deve ser parceiro constante nas
palavras e nos gestos. Todos nós precisamos de carinho, afeto e atenção. Sem
esta afetuosidade a vida perde muito o sentido e a sua graça. O que devemos
evitar é que a atenção exclusiva das pessoas, filhos ou o cônjuge, se torne uma
exigência. Atenção dedicada é algo espontâneo porque é a única forma de
demonstrar sinceridade. Todo mundo tem alguém com quem quer estar sempre por
mera questão de empatia. O ideal seria o próprio cônjuge porque, quanto mais
presente na vida, mais implica intimidade. Conhecer um ao outro é uma questão
de necessidade e sobrevivência conjugal. Por exemplo, no relacionamento sexual,
não se trata de sobrevivência no sentido de obrigação, mas, quando ambos ainda
estão ativos e não acontece, com certeza, o relacionamento sobreviverá à
mingua. Em I Coríntios 7:5 o apóstolo Paulo foi incisivo, “não vos priveis um
ao outro”. No verso 3 do mesmo capítulo ainda lemos que “marido e mulher devem
cumprir com o seu dever conjugal” e na sequência diz que “nem a mulher e nem o
homem devem se dispor do corpo a terceiros porque um pertencem ao outro”.
Fazendo um adendo, particularmente, no ato conjugal, julgo que a mulher é
passiva e o homem é o ativo. O comportamento passivo da mulher é de ser amada e
protegida na sua intimidade. O comportamento ativo do homem é o de cuidado,
dedicação e proteção a alguém de sua intimidade. Dentro desta conjuntura, não
faz qualquer sentido o relacionamento extraconjugal. A sexualidade é uma entrega.
Assumir um compromisso conjugal é entregar-se também de corpo ao outro que,
teoricamente, é a pessoa de maior confiança. Ninguém entrega o que é seu para
um estranho. No capítulo 6:19 o apóstolo enfatiza de que o nosso corpo é o
templo do Espírito Santo para a glória de Deus e devemos fugir da imoralidade
sexual.
Casamento é uma construção
de valores para favorecimento mútuo. Filhos, por exemplo, valor incalculável.
Ouço muitos casais já desiludidos e até mesmo terapeutas conjugais afirmarem
que filhos não “segura” casamento. Concordo em parte. Os filhos não podem ser
jogados ao acaso quando “ninguém é culpado” por nascerem. "Os filhos são
herança do Senhor para as nossas vidas" Salmos 127:3. Mesmo inicialmente
não fazendo parte do plano original do relacionamento, um filho deve ser
assumido como uma grande conquista. Quando nascem os filhos, a carga de
preocupação se acentua porque a responsabilidade pela formação é dos genitores
que ainda precisam administrar incessantemente a relação. Lembro que o cuidado
para com eles independe da condição do relacionamento. Não amamos os nossos
filhos porque são bons. Da mesma forma que também não amamos o nosso cônjuge
por ser uma boa pessoa. Amar é algo incondicional. Muitos dizem que amor não é
sentimento, mas é atitude. Creio que sejam as duas coisas intrinsecamente
ligadas. O apreço aproxima as pessoas e o amor intensifica a relação pelas
atitudes seja intencionalmente na parceria ou de forma espontânea. No
relacionamento sempre deve haver o compartilhar das ideias, dos planos e,
principalmente, dos sentimentos. Porém no decorrer da vida os relacionamentos
se desgastam e podem perder o sentido e instintivamente tomar rumos ignorados.
O ideal seria que, antes que aconteça este desgaste, reagir no sentido de revitalizar
a relação ou, a grosso modo, cortar o mal pela raiz. Com ou sem crise, o
entendimento deve ser um processo contínuo. O respeito ao outro nunca deve ser
por mérito, pois, respeita-se a pessoa, mesmo que não mereça. Tanto no
relacionamento conjugal ou com os filhos, em meio à uma potencial crise,
deve-se evitar o confronto direto. No caso dos filhos, quando ainda estão na
adolescência que é uma fase difícil até para eles mesmos que, numa busca
incessante de identidade e querem conquistar o mundo, muitas decisões precisam
ser tomadas em pouco espaço de tempo e julgam que já conquistaram o mundo e não
admitem que alguém diga o que eles devem fazer. Entrar em confronto direto para
quem está aceitando todos os desafios possíveis não é uma boa ideia porque a
relação vai minando e chega num ponto que não tem muito o que fazer, tudo o que
os pais disserem não vale e a melhor coisa é exatamente nada fazer e torcer
para que aprendam da melhor forma possível. A maioria dos filhos nesta fase
avançam destemidamente e transpõem todos os obstáculos possíveis. Isto é
causado pela sobrecarga de energia da novidade em decidir pela própria vida.
Não tem limite, até que amadureçam e percebam que precisam retornar, abaixar a
poeira e reconhecer que sem o apoio dos pais nada seria possível porque,
muitos, ainda dependem deles. Não se trata de questão financeira, mas de
sentimento, afeto, apoio nas incertezas e o carinho que qualquer pessoa precisa
principalmente daqueles que são mais próximos.
Não somos perfeitos e temos os nossos defeitos, mas, em algum lugar deve ter alguma coisa de valor em cada um que propicie uma “compensação” e demonstre que vale a pena a convivência. Muitas vezes é difícil encontrar estes valores porque estão sufocados por um comportamento fechado, retraído e egoísta. Geralmente, reagimos de acordo com as circunstâncias e não tomamos qualquer iniciativa em agir conforme as qualidades. Muitas pessoas, mesmo na velhice, quando nesta fase não se exige muito da vida, estão escravizadas pelas suas convicções, ocultando o que tem de melhor. Talvez tenham de ser livres de si mesmas porque a própria vida pode estar fragmentada e que afeta o relacionamento conjugal. Viva a vida a dois sem a marra do ressentimento desfragmentando as emoções.
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