Venancio Junior
Tudo
o que se fala sobre Israel em ser o povo escolhido tem de considerar o contexto
da trajetória do povo de Deus. Particularmente acho muito estranho considerar
que o Israel atual seja considerado ainda como sendo o povo exclusivamente
escolhido. Não vejo desta forma. Os fatos bíblicos não podem ter uma tradução
literal. Caso assim fosse, as afirmações e colocações de Jesus seriam
incompreensíveis. Primeiro que não sabemos o porquê Deus escolheu um povo do oriente
médio para se manifestar e apresentar o plano de salvação. O que foi exposto é
que Jesus teria de ter nascido de forma natural e alguém, obviamente, seria o
privilegiado. Os judeus ainda não eram reconhecidamente uma nação e nem terra
para se estabelecer tinha e saíram do Egito após 400 anos de escravidão em
busca de suas terras baseadas em promessas do Deus que veneravam. O povo
escolhido ainda não era denominado como Israel, mas, como judeus por causa da
Judéia e também como hebreus referentes ao vale de Hebron. Israelitas veio do
fato de que eram os descendentes da família de Jacó que veio a ser posteriormente
a ser chamado de Israel e que era filho de Isaque.
Israel
é o povo escolhido por Deus para iniciar o projeto de salvação da raça humana e
restauração de toda a criação à sua configuração original. Conforme a história,
no seu início antes de ser constituído como escolhido, foi um povo muito sofrido
e até os dias atuais é perseguido principalmente pelos descendentes de Ismael,
os Palestinos que reivindicam também a sua terra prometida, afinal são filhos
do mesmo pai Abraão.
No
Antigo Testamento, Israel foi o povo oprimido profetizado por Isaías 61:1. E no
Novo Testamento, quem é o povo oprimido citado no evangelho de Mateus 11:28?
Tanto
um como outro destes oprimidos representam a igreja dos escolhidos em que Deus
no tempo da graça se envolveu pessoalmente para dar liberdade aos seus fiéis.
Quem não conhece a história do Antigo Testamento da escravidão do povo hebreu
no Egito? Durante 400 anos os israelitas foram oprimidos e submetidos a trabalhos
forçados. Um grupo ou uma pessoa oprimida é aquela em que suas vontades são
tolhidas e submetidas à vontade de outra pessoa ou de um sistema autoritário. O
povo hebreu sofria por fazer trabalhos que não eram para o seu próprio povo e
para piorar a situação, estava fora de suas terras que era uma de suas
principais ambições e até os dias atuais é o principal motivo de conflitos
territoriais. Outro agravante é a questão religiosa. Os hebreus criam e
confiavam no Deus criador de todas as coisas. Enquanto os egípcios tinham os
seus deuses pagãos. Com certeza havia dentre o povo hebreu aqueles que sofriam
forte influência para confiar nestes deuses pagãos. A opressão era constante e
os desafios precisavam ser diluídos com a esperança de que o Deus dos hebreus
um dia libertaria o seu povo escolhido daquela condição. Quando, com muita
dificuldade e luta foram libertos da submissão egípcia, muitos se submetiam aos
deuses pagãos e forjavam os seus próprios deuses porque já estava acostumado e
era mais cômodo. Como esta parcela abandonou o Deus libertador para confiar
noutros deuses desconhecidos? O problema é a opressão emocional. Imagine uma
pessoa que, mesmo na condição que não foi a escolhida por ela e nem a ideal
para usufruir de um mínimo de conforto, de repente foi liberta de uma condição
que havia uma determinada segurança alimentar e agora precisava de plantar sua
comida? O povo hebreu permaneceu nesta jornada por mais de 40 anos motivados
pelo anseio de liberdade quando teria sua própria terra. Muita gente nasceu
durante esta jornada e não sabia de onde estava vindo e nem para onde estava indo.
De certa forma, esta parcela de hebreus não sofria a opressão da história que eles conheceram. Logo que nasciam já eram orientados de que serviam a um
só Deus. A maioria daqueles herdeiros do povo hebreu liberto do Egito, se
dispersou e cada um decidiu pelos seus próprios rumos religiosos enquanto
outros, optaram em permanecer sob as orientações da religião seguindo a sua
tradição.
Chegando
ao tempo do novo testamento, os escolhidos continuavam sendo oprimidos pelo
sistema e pelos reinos tiranos. Quem era provido de fé foi perseguido e até
morto. Não somente o governo oficial oprimia, como se não bastasse, a “igreja
oficial”, o judaísmo, também oprimia aqueles que não se conformavam com a
tradição imposta pelos sacerdotes. Geralmente os oprimidos eram os
marginalizados socialmente, principalmente os pobres, os doentes e as
prostitutas. Em diversos textos bíblicos, o foco era exatamente estes oprimidos
e o interessante é que este grupo não pertencia ao judaísmo e, sim, ao grupo
denominado de gentio que os judeus ortodoxos pejorativamente acusavam. Eram
pessoas cansadas e sobrecarregadas pelos encargos da vida. Muitas vezes não era
uma opção, mas, os infortúnios levavam estas pessoas cansadas a fazerem o que
não queriam e a religião judaica oprimia ao invés de trazer leveza às suas
vidas.
Ainda
não havia a teologia que conhecemos, a referência da opressão era a tradição
que foi construída desde os tempos de escravidão no Egito. Jesus chegou
exatamente neste contexto, confrontando a sua própria religião e dedicando a
atenção necessária àqueles que eram subjugados pela religião. Chamava toda
responsabilidade para si e a morte de cruz foi a entrega total aliviando
completamente a carga dos oprimidos das consequências do pecado. Jesus quebrou
diversos paradigmas e tudo para favorecer e aliviar o peso que a religião impunha
às pessoas que ela mesma menosprezava. Jesus pouco se importava se a pessoa era
religiosa ou se seguia as tradições da religião judaica, pois, havia assumido
as dores dos oprimidos surpreendendo até aqueles que o seguiam e eram
religiosos, mas, não sofriam a opressão exercida pelos sacerdotes, pois, mesmo
não se conformando com algumas práticas, eram seguidores fiéis.
Mas,
Jesus chamou não somente os doze para segui-lo, o convite era para todos. Os
doze foram escolhidos para ser a tropa do front, não exatamente para levar o
evangelho que estava sendo escrito também através da história de vida deles
próprios, mas, para serem complacentes atendendo as pessoas aliviando a carga
das suas necessidades emergentes. Muitos passavam fome, outros eram apedrejados
como forma de pagar pelo pecado e tantos outros que eram doentes e não tinham
acesso ao sistema de saúde que os atendessem. Quem era deficiente físico, pobre
e vivia na prostituição, era marginalizado e os doze tinha como uma de suas
principais funções atender a estas pessoas e esta atitude mudava completamente
a visão sobre a religião. Uma dúvida que surgiu e o próprio Jesus foi
questionado de qual era a verdadeira religião. Afinal, Jesus foi perseguido e
tornou-se também uma vítima da religião opressora de seus pais. Muitas vezes
demonstrou reação a esta opressão. Jesus tinha de sofrer todas as dificuldades
e tentações que as pessoas sentiam para que sua contraproposta de vida fizesse
sentido. Jesus mais uma vez confrontou a religião vigente afirmando que a
verdadeira religião é atitude de amparo aos que sofrem a opressão social e não
a instituição (Tiago 1:27).
Mais
recentemente o termo oprimido tomou proporções que vão além desta história. A
religião de todas as vertentes místicas ainda continua oprimindo os seus
seguidores. Prometem vida nova e alívio de suas aflições em troca de algumas
práticas da tradição que os mantem fiéis a religião, inclusive com dinheiro.
Caso não sigam esta tradição, não conseguirão alcançar a liberdade da opressão.
As pessoas se tornam escravas da falsa liberdade apregoada pela religião
institucional. Respeitar a religião do outro é um princípio da ética. Combater
a religião é focar nos efeitos que ela produz sendo que o foco deve ser as
causas que leva a religião institucional a submeter as pessoas a tradições
criadas pelo ser humano. Deus quer que as pessoas se aproximem dEle e não é e
nunca foi através da religião institucional. Toda religião oprime e cerceia a
pessoa humana. Especificamente na religião cristã que não foi criada pelo
Cristo, há três principais vertentes, tradicional/reformada, pentecostal e
neopentecostal. Afinal, qual é a verdadeira? Os reformados se orgulham da sua
tradição, pois, são fiéis oriundos da reforma protestante. Os pentecostais,
cujo movimento teve início no começo dos anos 1900 igualmente se orgulham pelas
manifestações dos dons espirituais e se julgam os seus únicos portadores e até
desdenham dos cristãos reformados. Mais recentemente, os neopentecostais com
início nos anos 60 do século passado estão focados nas bençãos promovidas por
Deus e ignoram até com fundamentos teológicos que o povo de Deus é sempre feliz
e quem sofre qualquer tipo de opressão é porque está “mal com Deus”. Este
último grupo menospreza em suas mensagens os dois primeiros grupos os acusando
de religiosos.
Estes
três grupos representam os fundamentos de todas as vertentes do cristianismo.
Nenhuma delas assume que suas doutrinas pertencem a tradição que foi combatida
por Jesus e são opressoras, pois, exigem práticas para se chegar a Deus que são
meros costumes e, muitos deles, são totalmente desprovidos dos fundamentos do
evangelho. Quem define e impõe estes costumes são os velhos concílios e
convenções de pastores que servem somente para alimentar a vaidade dos seus
líderes e manter a qualquer custo esta opressão. Estas reuniões não é algo
novo. Nos tempos de Jesus, estes líderes eram representados pelos sacerdotes
que também se reuniam em concílio para definir os rumos da religião judaica e
os seus costumes. Os “subversivos” seguidores de Jesus também promoviam suas
reuniões. Um deles era Paulo que discursou no concílio da igreja primitiva em
Atenas (Atos 17:22). Consta na história também o famoso concílio de Jerusalém
onde os apóstolos Pedro e Paulo falaram e colocaram suas posições a respeito
dos gentios e na abordagem final, Tiago que, além de ser o irmão de Jesus era o
principal líder da igreja e sua intervenção foi muito influente nas decisões.
Este conclave teve como principal assunto debater se os gentios que eram repudiados
pelos judeus, deveriam seguir também as leis de Moisés (Atos 15:5). A diferença
das reuniões atuais é que estes primeiros concílios estavam debatendo os
fundamentos do evangelho. Nas reuniões atuais, a liderança quer reescrever o
evangelho impondo suas próprias considerações com os seus costumes. Cada um dos
representantes destes grupos não quer ser confundido um com o outro. O
reformado não admite ser um pentecostal que é considerado por eles como um
“sub-cristão” e o pentecostal não quer ser confundido como um reformado
tradicional qualquer. O tradicional reformado aceita os dons, mas, dentro dos
limites da tradição reformada. O pentecostal aceita a reforma, porém,
“temperada” com a manifestação dos dons espirituais.
Mas,
e a religião do povo hebreu, o que aconteceu? Ainda mantem as mesmas tradições?
O judaísmo é uma das religiões mais influentes no mundo atual. Porém, há muitas
vertentes, inclusive, o judaísmo messiânico que reconhece e crê em Jesus como o
Messias. O judaísmo ortodoxo ainda espera pelo Messias e mantem irretocável
suas tradições. Uma das vertentes do judaísmo é o Islamismo que é radicalmente
ortodoxa mantendo suas tradições da mesma forma a milênios. O judaísmo que
conhecemos é da tribo de Isaque, enquanto o islamismo é da tribo de Ismael.
Ambos são filhos de Abraão, respectivamente filhos de Sara e da sua serva Agar.
Tanto o judaísmo como o islamismo são religiões radicais que ainda são
incrustadas de muita tradição e que oprimem principalmente as mulheres. As
vestimentas tanto masculinas como femininas mantem o padrão e são facilmente
identificados os seus seguidores. Já falei sobre a questão da submissão da
mulher. Os mais espertos se aproveitam de uma brecha no mandamento de Deus e
submetem a mulher ao homem e, na verdade, a submissão da mulher é em relação ao
marido e jamais foi determinado que a mulher fosse submissa ao homem.
Após
milênios e o surgimento de milhões de outras religiões, a função de cada uma
delas ainda continua a mesma que é a de oprimir os seus seguidores. Jesus veio
para combater a religião opressora que inventa doutrinas de acordo com as
conveniências de seus líderes. É natural e perfeitamente legítimo a necessidade
do ser humano em se conectar com uma divindade que faça sentido as suas buscas
que preencham o seu vazio espiritual existencial, porém, o torna uma “presa
fácil” porque assume uma busca desenfreada. Sempre que abordo um tema que
envolva liderança me lembro que muitos dos líderes são frutos desta fragilidade
do ser humano em discernir entre o bem e o mal travestido de religião. Muitas
vezes as causas de uma religiosidade frágil é consequência da falta de senso
crítico dos liderados que não questionam e engolem qualquer doutrina sem
mastigar. A bíblia coloca a falsa doutrina como algo maldito (Gálatas 1:9),
pois, mesmo que a pessoa tenha boas intenções, esta palavra maldita tem o
inferno como destino certo. Estas pessoas vivem no engano e são oprimidas pelas
práticas da religiosidade meramente humana. Pelo mundo afora observamos nos
noticiários e muito difundido atualmente pelas redes sociais as causas de uma
religiosidade fora do evangelho. Isto não significa que a religião cristã é a
certa. De forma alguma. Primeiramente, Deus não criou nenhuma religião e Jesus
não veio para convencer as pessoas para que vivesse a religião humana. Pelo
contrário, Jesus foi confrontado, acusado, julgado e morto pela religião
humana. Ele próprio demonstrou na prática qual era a verdadeira religião em que
Deus se agrada que são atitudes que supra a necessidade das pessoas carentes
independentemente de quem seja e nem de qual classe social ou religião
pertença, Jesus mostrou que devemos amar as pessoas e levá-las ao conhecimento
de Deus. Não é o deus de qualquer religião porque não existe outro deus. Em
Efésios 4:5,6 Paulo conforme revelação que lhe foi dada, afirma que "Há um
só Senhor, uma só fé, um só batismo; um só Deus e Pai de todos, que é sobre
todos e por todos e em todos".
Diante desta afirmação não faz qualquer sentido o pertencimento a uma linha teológica reformada ou pentecostal e também não faz sentido afirmar que Deus está nas religiões e que todas tenham o mesmo destino. Deus não pertence a nenhuma religião e se envolveu pessoalmente para trazer a verdadeira liberdade sem a opressão da religião através de Jesus Cristo. “Se, Jesus te libertar, sereis realmente livres” (João 8:36).
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