quarta-feira, 25 de dezembro de 2024

A OUTRA FACE NO LIMITE

Venancio Junior

Ano novo, vida nova, novos planos, novas ideias, possibilidade de novos relacionamentos, novos projetos e os velhos e necessários princípios para quem leva muito à sério as boas práticas da espiritualidade. O velho hábito em amar ao próximo como a ti mesmo e a velha mania em dar a outra face dentre outros princípios, mesmo não se colocando em prática, não perderam o seu valor. Pode até ser velho, mas, esta mania na prática, se torna nova a cada desafio. No ano velho nos roubaram a alegria, o prazer, a paz e a esperança e no ano novo estamos maltrapilho ou nu e ainda precisaremos continuar dando a outra face. Estes princípios não mudam, nós é que envelhecemos em nossos pecados. A renovação espiritual não é um delírio e nem emoção que causa arrepios, mas, é retomar o caminho do crescimento que, nem sempre é fácil, porém, necessário. O convite de Jesus em dar a outra face é voltar ao caminho e vai além do sentido literal. Dar a outra face não é um momento de reação aplicada numa situação específica, mas, um estilo de vida. Dar a outra face vai muito além de um momento em que se precisou demonstrar humildade expandindo e aprofundando a atitude de entrega. Doar um “pedaço” de si e caminhar junto não importando a distância são prerrogativas dentre várias outras do discípulo. Talvez o primeiro questionamento que vêm à mente seja, “dar a outra face” não seria fazer papel de trouxa? Aparentemente tudo indica que sim, mas, esta é a ótica da mente de uma sociedade doentia que pensa só em si mesma. Dar a outra face é viver na contramão e romper a lógica de alguém egoísta e quer levar vantagem em tudo. Esta reação é uma contraposição que desperta a mente do outro para aquilo que é honesto e sadio e faz bem ao coração elevando o caráter. Mas, tudo tem limite.

Mateus e Lucas relataram esta parte significativa do sermão do monte proferido por Jesus. Na minha visão, a outra face resume tudo o que foi dito sobre o sermão do monte. A característica do ser humano condizente com as bem-aventuranças propensa a dar a outra face é aquela resgatada pela graça e restaurada pelo amor de Deus. Não se trata de um sentimento de autocomiseração e muito menos de sacrifício de tolo. A outra face não é uma atitude impetuosa, mas, um modo de vida em Cristo como nova criatura. O contexto decadente da nossa sociedade exige como contraponto que é preciso dar a outra face para ser discípulo legítimo, o sal da terra.

A submissão a este processo é continuamente dar a outra face. Conviver com alguém difícil é dar a outra face. Fazer o que não quer, mas, o que precisa é dar a outra face. Fazer o bem a quem lhe faz o mal é dar a outra face. Negar-se a si mesmo como Jesus sugeriu é dar a outra face. Imagine conviver com alguém que te persegue e que emocionalmente te faça mal? De certa forma, é dar a outra face. Coloco assim porque esta situação não é uma regra. De repente, as pessoas sofrem por motivos diversos e permanecer nesta condição nem sempre dar a outra face é a atitude adequada. No relacionamento, cada um tem a sua parcela de "culpa" ou responsabilidade porque a humildade não deve ser sinônimo de sofrimento generalizado. Muitas pessoas demonstram humildade e reagem proativamente sem necessariamente estarem sofrendo algum tipo de assédio moral, físico ou emocional.

Praticar a humildade não se trata de ser arrogante e acordar humilde e permanecer assim a partir daquele dia. Humildade não é uma postura isolada, mas, a postura isolada revela a humildade. É um processo que demanda basicamente renúncia e escolhas. Não pense que quanto mais decisão de boas escolhas e de renúncia a pessoa se tornará mais humilde. Não existe grau de humildade. Por exemplo, afirmar que aquela pessoa é muito ou pouco humilde não existe. O que existe é relativo à personalidade. Tem pessoas que são mais tranquilas que outras e demoram a reagir, enquanto tem outras que são mais explosivas. Tem pessoas minimalistas e tem as vaidosas e gananciosas. Em qualquer situação e independentemente do que a pessoa seja, trago o texto do apóstolo Paulo quando diz que é forte quando é fraco. Ele quis dizer que quando há a consciência da condição de pecador que carece da graça e misericórdia de Deus (sem soberba) é que se está forte não importando o que a pessoa é. Mas, quem deve considerar este valor é somente Deus. Ninguém deve se vangloriar com a humildade, obviamente deixará de ser humilde. O único caminho da espiritualidade é ser humilde em dar a outra face sendo vazio de si e com disposição máxima e contínua em servir ao outro.

Atualmente com a facilidade da comunicação presenciamos pessoalmente ou nas redes sociais pessoas (pela reação, não mereceriam serem tratadas como pessoas) que perdem a oportunidade em dar a outra face e fazer diferença no cotidiano. Tenho uma frase que diz: “A vida é simples, basta que cada um faça a sua parte”. Muitos não tem feito a sua parte em dar a outra face e reagem com ódio por motivos banais. Acredite, não é fácil, mas, é libertador conseguir dar a outra face. Precisamos ser libertos da raiva, do ódio, da ira e dos impulsos agressivos que nos aprisionam. Ao invés de exigir aquilo que se julga ser os seus direitos, dê a outra face. No trânsito acontecem as mais difíceis situações em que o desafio em dar a outra face revela o que somos, de fato. No convívio do trabalho também acontecem desafios que colocam em prova a nossa condição de discípulo. Aqueles que são “passados para trás” e são preteridos a uma promoção, como dar a outra face? Na vida social com os amigos onde, ultimamente os valores perderam o ponto comum de compartilhamento e se polarizaram, está muito difícil dar a outra face. Pessoas queridas e muito próximas tem atitudes que exigem um sacrifício inimaginável. Nas reuniões de família houve grandes desfalques porque se esqueceram de dar a outra face. Na igreja, por incrível que pareça, pois, todos teoricamente são discípulos, também existem os desafios para exercer a prática da humildade em dar a outra face. A religião ao invés de unir e reunir, tornou-se motivo de discórdia. E no relacionamento conjugal? Cujo nível é o mais próximo possível e não pode ser de outra maneira e, conforme o tempo passa há um visível desgaste, o relacionamento sofre desafios diários constantes onde tem acontecido muitas agressões e até feminicídios e os motivos não justificam os meios bárbaros porque faltou dar a outra face. Nestes casos de violência doméstica, faltou ao agressor dar a outra face. Uma atitude muitas vezes difícil, mas, um gesto muito simples. Como dar a outra face se uma das partes cede como forma de sujeição e se anula a ponto de subsistir com as suas próprias forças? Qual o limite para isto? Como dar a outra face quando o relacionamento não redunda em afeto, carinho e um se submetendo ao outro? Como dar a outra face quando acontece uma traição? Como dar a outra face quando cada um exige que deva ser satisfeito pelo outro? 

A espinha dorsal do relacionamento é um sustentando o outro. Não existe outro critério. Dar a outra face é o princípio em qualquer processo que envolva duas ou mais pessoas porque vai além dos limites da obrigatoriedade. Porém, devemos observar que, se esta condição se perpetuando sem que a outra parte não reconsidere que deve reagir e se esforçar também para que não se anule uma das partes, dar a outra face deve ser uma excepcionalidade e não uma atitude que seria como “dar murros em ponta de faca” que não trará a solução adequada. Jesus nunca nos disse que devemos ser tolos porque dar a outra face é sempre uma reação. O problema é que muitas vezes esta atitude de humildade não tem mudado a outra pessoa ou a si mesmo e acabamos por ter um comportamento aparentemente de tolo. Eu creio que a atitude em dar a outra face é quando os problemas do relacionamento ainda estão na superfície. Digo isto no sentido de que só existe uma profundidade no relacionamento. É preciso observar o que se encontra nesta profundidade, o amor ou os problemas? Os dois não subsistem concomitantemente. O “romantismo” no relacionamento em qualquer nível ou situação tem limites. Razão e coração deverão caminhar juntos. Onde um está ausente, o outro avança os limites para suprir esta carência. Porém, tudo tem seu limite e o desgaste não pode chegar a níveis de flagelo emocional e uma decisão radical deverá ser tomada. Muitos fatores deverão ser considerados e não pense que não haverá perdas. Sempre há. Dar a outra face no relacionamento é também interromper um processo que tende ao fracasso. Em muitos casos, dar a outra face é renunciar a intensidade de um relacionamento doentio e se projetar no conforto da solidão para se recompor. Não é exatamente se isolar, mas, deixar de exigir que as pessoas supram as suas necessidades. Dar a outra face é como dar um grito no deserto de valores que se tornou este mundo onde poucos sobrevivem, incluindo você mesmo. Resumindo, dar a outra face não é fazer, mas, mostrar com atitude o que o outro tem de fazer.

domingo, 22 de dezembro de 2024

O JESUS QUE (AINDA) NÃO FAZIA MILAGRES

Venancio Junior

A vida de Jesus antes do início do seu chamado ministerial é cercada de mistérios. Não existem relatos ou escritos que descrevam o que foi Jesus na infância, adolescência e juventude. Considerei que a juventude acaba nos trinta anos e a partir daí tem início a vida adulta.

Tem alguns escritos que descrevem supostamente alguns episódios da vida inicial de Jesus. Além do livro de Tomé, considerado apócrifo pelos estudiosos por não comprovar a sua autenticidade, existem alguns outros papiros antigos que tentam descrever os milagres acontecidos na infância. Inclusive, recentemente foi descoberto por dois historiadores, um brasileiro e o outro húngaro um recorte de papiro datado no quarto século e descreve supostamente o primeiro milagre de Jesus quando purificou as águas de uma lagoa. Porque eles não relatam a vida comum? Na infância e na adolescência acontece muita coisa. Principalmente que Jesus não era uma pessoa comum e muita gente gostaria de saber o que acontecia no seu cotidiano. Será que Jesus fazia “birra” na infância? E na adolescência, será que contrariava os seus pais e tinha pensamentos reprováveis? Deus enviou Jesus e antes de se envolver no cumprimento da missão a que foi proposto, ele tinha de, não somente viver o contexto da vida humana, mas, também sentir o que o ser humano sentia. “Deus se tornou carne...” João 1:14. Não somente se tornou carne, mas, carregou consigo tudo o que a carne pôde sentir. Jesus não viveu como Deus. Nesta fase inicial da sua vida precisava viver exclusivamente na carne. “...mesmo sendo Deus, esvaziou-se e se tornou meramente humano” Filipenses 2:6,7. Se na tua vida você fosse Jesus, o que será que faria considerando tudo o que te envolve?

Vamos começar por aí, será que Jesus antes do início do seu ministério tinha poder para realizar milagres? O poder de milagre de Jesus não era para brincar de mágica. Creio que Jesus tinha a orientação em utilizar poder a partir do início do seu ministério aos 30 anos logo após ser batizado no rio Jordão. No livro do primeiro evangelho Mateus descreve a afirmação de Jesus na grande comissão do Ide em ter recebido de Deus todo o poder no céu e na terra (Mateus 28:18). Obviamente muitos questionarão o episódio no templo em que Jesus com apenas doze anos confrontou os sacerdotes doutores da lei. Sinceramente, no contexto humano é raro, mas, existem pessoas superdotadas. Jesus pode ter sido um garoto superdotado, pois, estava entrando na adolescência. Seria surpreendente se isto acontecesse quando ainda criança e não sabia falar. Mas, o problema é que Jesus afirmou aos seus pais, que o procuravam desesperadamente, que estava na casa do Pai dele já cumprindo a sua missão em obediência. José era o pai adotivo e Deus é o legítimo pai que, através do Espírito Santo, inseriu a semente em Maria para que engravidasse. Um detalhe interessante é que os doutores se admiravam da sua inteligência. Há uma grande diferença entre sabedoria (postura) e inteligência (conhecimento).  Para se conhecer algo é preciso buscar o saber de forma prática. Jesus, com certeza estudou as leis judaicas e provavelmente possuía o dom excepcional do conhecimento. Lucas 2:47,49

A crença de que Jesus já nasceu com poder nunca foi questionada. Muitos creem que Jesus é semelhante a Hércules que, quando criança, brincava com as serpentes e fazia outras estripulias revelando a sua força. Eu creio que Jesus tinha poder na infância, mas, só seria “ativado” em consonância com o conhecimento. Na adolescência ele buscou o conhecimento das leis e da vida tendo demonstrado sabedoria no controle da sua divindade. Na juventude eu creio que Jesus não deu vazão aos impulsos da sua idade e, tipo, se anulou porque tinha plena ciência da sua missão e não fazia sentido sair pela vida fazendo milagres a revelia. Se tivesse acontecido, o alvoroço e a notícia se espalhariam. Naquela época seria um evento marcante porque todos estavam de olho em Jesus para ver o que iria acontecer. Ele foi anunciado como o Messias, o Salvador da humanidade e o seu nascimento foi cercado de expectativas pelos judeus. Jesus não realizou milagres que poderiam ser conhecidos porque o seu poder tinha um propósito com começo, meio e finalidade. Não há registro nesta fase inicial da sua vida, pois, nada aconteceu de relevante porque Ele quis assim.

terça-feira, 10 de dezembro de 2024

JESUS, O FILHO DE JOSÉ

Venancio Junior

“E o mesmo Jesus começava a ser de quase trinta anos, sendo filho de José...” (Lucas 3:23).

Porque será que Jesus nunca questionou sua descendência? Jesus não era filho biológico de José que era, de fato, o legítimo descendente de Davi. Então, porque era reconhecido como pertencente a sua linhagem familiar e não a de Maria sua mãe biológica? Algumas interpretações forçam o parentesco biológico de Maria com a linhagem de Davi, porém, não há qualquer texto que evidencie esta conexão. A interpretação mais provável é que Maria tornou-se uma só carne com José, agora fazendo parte da linhagem de Davi conforme o texto de Lucas 2:4,5 "...por ser ele (José) da casa e família de Davi, a fim de alistar-se com Maria, sua esposa, que estava grávida". De qualquer forma, a linhagem tem alguns episódios trágicos e sombrios que envolvem tramas de assassinato, estupro e prostituição. O mais conhecido é o de Davi e Jesus sabia do triste episódio envolvendo o caso com Bate-Seba ou Betsaida, viúva de Urias e a mulher com quem Davi cometeu adultério. Posteriormente Bate-Seba se tornou esposa de Davi e veio a ser a mãe do rei Salomão. Mas, antes disto, tem alguns questionamentos, Bate-Seba sabia que no local onde tomava banho ficava muito exposta à visão do rei? Porque Bate-Seba se expôs a Davi? Se os banhos neste local eram frequentes, será que Davi manteve a postura real e evitava observar? Se não era um lugar comum onde tomava banho, será que Bate-Seba queria provocar Davi? Esta virtual provocação era por causa de um problema conjugal com Urias? Ele era um fiel comandante do rei. Por diversas vezes optou em permanecer subjugado às suas atribuições militares e até “desobedeceu” ao rei que deu ordem para que fosse para casa e fizesse sexo com a sua esposa que já estava grávida de Davi. Baseado nisto, será que Urias não estava negligenciando o relacionamento conjugal com a sua esposa e isto frustrava Bate-Seba que se permitiu ser observada porque sabia que o rei Davi esporadicamente observava a cidade daquela varanda? Mas, a pergunta que ninguém ousa fazer: Será que, se Davi não fizesse aquela “emboscada” com Urias para que morresse e não soubesse da traição da sua esposa Bate-Seba, não teria nascido Salomão e o próprio Jesus seria de outra linhagem que não fosse a de Davi? Quando Maria foi a escolhida, ela já estava prometida a José que descendia desta "grande família".  Deus poderia tranquilamente falar com Maria que arrumaria outro marido porque a família de José era problemática e não gostaria que Jesus tivesse uma descendência que "manchasse a sua honra". Deus não mudou o que já estava preestabelecido e ainda legitimou a adoção de Jesus por José e também não relevou as maldades humanas a uma condição que comprometesse os seus planos.

Este não foi o único escândalo na família de Davi. Tem o triste episódio da relação de Tamar com o filho primogênito de Davi, Amnon que acabou sendo assassinado por seu outro filho, Absalão por ter estuprado sua irmã Tamar por parte de pai. Esta é uma outra longa história das tragédias desta família. E os escândalos não param por aí. Na genealogia de José ainda consta Tamar (não é a filha de Davi) que se fingiu de prostituta e se engravidou do sogro. Tinha Raabe a prostituta que escondeu os espias hebreus e Rute que seduziu Boaz para melhorar a vida da sua sogra pobre. O machismo era tão forte que nos relatos bíblicos lemos que o pai gerou o filho. O autor teve o cuidado de incluir estas mulheres que eram citadas como sendo a mãe de alguém que o pai gerou. Não nesta ordem. O pai gerou e depois falava quem era a mãe. Com exceção de quando chegou em José, não se lê que ele gerou Jesus, no evangelho consta que era marido de Maria que gerou Jesus sendo a única citação de uma mulher que gerou um filho e foi o único motivo em ter sido incluída na genealogia. Esta é a família que os judeus consideram ser da descendência de Jesus.

No evangelho de Mateus logo no primeiro capítulo que consta esta genealogia de José que inclui Jesus como sendo o seu filho adotivo. Jesus como ser humano tinha de ter um pai. A questão familiar na época de Jesus era algo muito importante por causa da herança, não somente dos bens, mas, da linhagem cultural. Nesta época a escolha do marido para a filha era motivada principalmente para estabelecer a linhagem familiar. Pouco ou quase nada importava a questão sentimental até mesmo do homem e o sucesso emocional no relacionamento conjugal era algo secundário. Na maioria das vezes nem era considerado. O homem ainda na sua tenra idade não escolhia a sua mulher e esta, por sua vez, escolher alguém era uma utopia, sofria calada e submissa. Esta é uma condição imposta pelo gênero masculino e não é mandamento de Deus. Não chega a ser uma “conivência divina” de tudo o que acontecia. Eu acho que Deus não queria complicar ainda mais o contexto da vida humana. Então, José era o herdeiro da linhagem de Davi. Com exceção do texto de Lucas que, por razão desconhecida relatou a genealogia de Maria, na maioria das vezes as mulheres nem eram relacionadas na genealogia. Em hipótese alguma é uma desvalorização do gênero feminino. Por sua vez, os homens não aceitavam nenhuma submissão à mulher. Não podemos considerar que a descendência de Maria era todo mundo “santinho”. A própria Maria, mesmo Deus tendo escolhido para ser a mãe de Jesus porque encontrou virtudes, era pecadora como qualquer outro que foi expulso da presença de Deus. Se Maria não reconhecesse a sua condição de pecadora e não cresse em Jesus, seu próprio filho como o seu Salvador, o seu destino estava selado como o dos demais seres humanos. O fato de ter sido escolhida para ser a mãe de Jesus não há nenhum privilégio ou garantia da salvação. Algo que se deve ser esclarecido e, que Maria em alguns episódios esquecia é que ela era mãe de Jesus e não do Messias. Jesus por diversas vezes dizia a ela: "Mulher, o que tenho eu contigo?" João 2:4. Com o avanço atual dos recursos tecnológicos, se fizesse um exame de DNA em Jesus, não encontraria algum gene de Davi. Ele não era da família de Davi, pois, Maria tinha outra vertente genealógica.

Porque, então, há várias exclamações “Jesus, filho de Davi!”? Primeiramente foi uma promessa de que o Messias viria da descendência de Davi. É uma questão também cultural por causa da herança familiar e Deus também demonstrou que a adoção de filho é também legítima. O filho adotado poderia herdar os bens e compor a genealogia. Deus respeitou a questão cultural e Jesus era o filho adotado pela linhagem de Davi. Apesar de que, quando José soube que Maria estava grávida, não se atentou de que era do Espírito Santo e ficou muito chateado. A princípio, qualquer um ficaria. Talvez porque era algo difícil de se conceber. A maioria daqueles que criam, conhecia ou, pelo menos, ouviu falar nas ações do espírito de Deus. José não compreendeu, mas, aceitou, como também, adotou Jesus como sendo o seu filho e o trouxe à linhagem de Davi mantendo uma relação normal de pai e filho tanto é que ensinou a sua profissão ao seu filho Jesus. Este comportamento de José fez toda a diferença no contexto da religião judaica da época que igualmente aceitou esta adoção e Jesus era conhecido como sendo da linhagem de Davi. 

quinta-feira, 5 de dezembro de 2024

ESPINHO NA CARNE

Venancio Junior

O espinho na carne é muito dolorido. Esta metáfora foi utilizada por Paulo para demonstrar a dor profunda que estava sentindo e o pior é que ele não seria liberto daquela dor. Leia o texto de II Coríntios 12:7b e 10b "...foi-me dado um espinho na carne, a saber, um mensageiro de Satanás, para me esbofetear, a fim de não me exaltar...Porque, quando estou fraco, então, sou forte". Ele pedia que o libertasse, mas, aquele sofrimento o mantinha em comunhão com Deus. Será que Paulo parou de pedir a Deus que o libertasse daquele sofrimento? Afinal, não adiantava orar, pois, o sofrimento era permitido para que se mantivesse a comunhão com Deus. Outro questionamento, será que foi um desabafo Paulo afirmar como força de expressão que aquele sofrimento era um mensageiro de satanás para demonstrar a sua irritação? Muitas vezes sofremos uma dor terrível, por exemplo, dor de cabeça que chegamos a dizer que é uma “dor infernal” o que, na verdade, não é. É uma forma aparentemente cruel e diferente de tudo o que se diz por aí sobre a comunhão com Deus e, conforme o texto, o sofrimento era a única opção. Naquele contexto, a dor desconstruía Paulo. Deus conhecia o coração característico de Paulo. Não podemos afirmar que se tratava de uma dor física. A única certeza é que aquela situação era profundamente desconfortável e angustiante para Paulo. Obviamente que esta não é uma forma padrão para Deus manter os seus filhos na comunhão. Apesar de que lemos de que Deus disciplina a quem ama (Hebreus 12:6). Acredite, tem pessoas que não precisa de um sofrimento qualquer para se manter na comunhão com Deus. Conheço muitas pessoas que são bem resolvidas nesta questão e se mantêm fiéis a Deus.

Mas, o espinho na carne não é somente aplicado como uma dor física ou emocional. Existem situações em que pessoas ou condição que são verdadeiros espinhos na carne. Quem não vive uma situação no trabalho em que somente pela graça é possível se manter? Existem também pessoas que são verdadeiros espinhos na carne. Quanto mais próxima, a dor se acentua e se aprofunda. Imagine alguém que te aborrece e não te respeita? Mesmo esta condição que justifique uma decisão em romper os laços, Deus diariamente coloca no coração de que é necessário a convivência para que os seus planos não sejam frustrados. Como Deus permite este tipo de situação tóxica, desgastante e que consome a alegria, o prazer e a motivação no planejamento da vida? Isto acontece no trabalho, na igreja e até mesmo no relacionamento conjugal. No trabalho é mais comum surgir contrariedades, porém, a questão da sobrevivência é o que mais pesa e a submissão forçada é o espinho na carne. Chefe que faz assédio moral e colegas que desejam que seja prejudicado para benefício deles e constantemente falam mal da sua pessoa que chega um momento que o sentimento de que esteja fazendo tudo errado domina suas emoções. Pior é que nada muda. Este é um profundo espinho na carne. Na igreja, por incrível que pareça, também existem contrariedades que com o passar do tempo criam fendas no relacionamento. Disputas de poder, traição, corrupção, adultério, ganância, orgulho, vaidade e soberba são alguns dos problemas que acontecem. Nestes casos, o espinho na carne não está em quem tem tais práticas abomináveis, mas, naquele que não se conforma com a podridão sendo obrigado a conviver com estas pessoas. Como servir a este tipo de pessoa? Porque, então, Deus não envia uma legião de anjos para colocar um fim a estas atrocidades morais? Deus poderia jogar uma faísca que pusesse um fim a tudo isto. Pois bem, da mesma forma que não correspondeu aos anseios de Paulo, Deus pode não fazer do nosso jeito e, geralmente, não o faz. Tem situações que se perpetuam e parece que nunca vai mudar por mais errado que seja o comportamento das pessoas. O sofrimento em não se conformar é o espinho na carne porque gera também quebrantamento.

Na vida conjugal também há o espinho na carne. Conheço casamentos em que as atitudes de um dos cônjuges provocava um espinho na carne do outro. Era uma pessoa, apesar da aparência que não levantasse suspeitas, tinha uma má índole e não conseguia reconhecer o seu comportamento corrosivo. Os problemas são diversos, desde a escravidão a algum tipo de vício até o envolvimento extra conjugal. Tem outros casos que, talvez, sejam piores em que tudo parece aparentemente caminhar bem, mas, o comportamento ácido nas palavras direta ou indiretamente quando as críticas ultrapassam a fronteira do núcleo familiar ou conjugal é o cotidiano da casa. As atitudes também podem se tornar ácido em que não há propensão em reconstruir o relacionamento e ainda a pessoa se coloca como vítima. Deus permite que se permaneça nesta situação e o contexto é um verdadeiro espinho na carne para aquele que é temente ao soberano. A outra parte está virtualmente “destruída” e na bíblia lemos que é desta forma que se é forte. São os mistérios de Deus que jamais serão revelados. 

Não queira viver uma vida certinha conforme se crê. Muitas vezes o espinho na carne é necessário para que a visão de Deus permaneça na vida daqueles que buscam uma vida de quebrantamento e reconstrução diária da fé para que a comunhão com Deus seja irretocável. Repito que o espinho na carne não é um padrão que Deus utiliza para manter os seus escolhidos em retidão. Cada situação é ímpar e carece de discernimento e oração onde se inclua a busca por sabedoria.

terça-feira, 3 de dezembro de 2024

JESUS NÃO ERA FILHO DE PAPAI NOEL

Venancio Junior

Que lindo! Todo mundo na igreja cantando em minha homenagem. Muita música, poesia e teatro recheiam a programação. Pelo jeito, todos gostam de mim e depois do culto não será difícil visitar a casa destas pessoas onde a comemoração vai continuar com muita comida e bebida e, eu, é claro. Afinal, sou o principal personagem da festa e será uma honra para aqueles que me receberem. Daqui a pouco vai chover de convites e ficarei rodeado de pessoas querendo que eu vá a casa deles. Vai ser difícil escolher qual casa irei. Qual família que vou visitar primeiro? Depois destas apresentações, todos vão para as suas casas continuar a festa junto com os familiares e até amigos. Estou muito ansioso. Este ano será diferente. Lembra das promessas que me fizeram dizendo que seriam pessoas diferentes? Já que sou tão importante, o culto já terminou e as pessoas estão se abraçando de alegria e logo alguém virá me convidar para ir a sua festa. Olha só, até agora a família do pastor da igreja é a mais assediada. Alguns “mais amorosos” até dão presentes. Muita gente vai perceber que estou aqui e com certeza vai me convidar para a festa na sua casa. Vou ficar muito feliz também em saber que as pessoas me amam e desejam que o meu amor ocupe espaço no coração e que cada um inspire outros para que a vida seja mais leve. Mas, agora me leve para a sua casa. Quero participar da festa também. Aos poucos vai diminuindo o número de pessoas na igreja. Cada um está eufórico para as novidades no cardápio e não faltará fome para saborear. Alguns alimentos só aparecem no final de ano. Agora só tem uma meia dúzia de pessoas e alguns são os responsáveis em desligar as luzes e fechar a porta. E agora, se fecharem a igreja, eu fico do lado de dentro no escuro seguro ou do lado de fora na rua vazia? Percebi que ninguém me percebeu e nenhum convite surgiu. Será que não sou filho de Papai Noel? Quem diria que eu, “o famoso” Jesus, o principal nome lembrado nas comemorações, foi esquecido de verdade. Estou com fome, pensa na quantidade e variedade de comida neste momento? Além do mais, a noite será longa, mesmo sendo verão, a madrugada sempre é fria. Ninguém se lembrou de convidar alguém que faria diferença na festa. Quem sabe transformar a água em vinho, curar alguém doente ou até mesmo ressuscitar algum morto vivo. Mais uma vez fiquei de fora da festa. As pessoas se acostumaram a causar uma boa impressão usando o meu nome, porém, não me acolheram. Desejaram uma vida próspera a todos, mas, me deixaram nu. Parece que o valor que tenho só vale nas comemorações da igreja. Nas casas não tenho valor e não sou bem-vindo. Pelo jeito, o filho de Deus não é filho de Papai Noel.