segunda-feira, 15 de abril de 2024

BANCO MERCANTIL DA FÉ

Venancio Junior

A fé se potencializa quando se é abençoado? A fé permanece mesmo sem ser abençoado com o que se queira? A fé é uma troca de favores com Deus? Por que Deus diz para que o prove no exercício da fé? Por que ainda existem tantos questionamentos a respeito da fé? Qual seria o maior referencial de fé?

Considerando que o relacionamento com Deus é algo intimamente pessoal, fica difícil caracterizar a fé de forma que se possa demonstrar uma única perspectiva que contemple a todos. A única característica que é comum é a questão de que sem fé é impossível agradar a Deus. Sem a fé é impossível conhecer a Deus e saber que exista. A forma como se aplica é o grande questionamento.

A fé tem sido utilizada até como forma de ápice no relacionamento com Deus. O justo vive pela fé. Este trecho de Romanos 1:17 traz uma suavidade no uso da fé. Quem seria justo ou quem se julga justo? O justo é aquele que foi justificado em Cristo. Até chegar neste ponto, há um longo e penoso caminho a seguir. Tem muitos exemplos de alegria das conquistas pela fé. Neste contexto, não ficaria difícil afirmar que a pessoa abençoada é alguém cheio de fé. O inverso desta situação também é real quando a fé é confrontada e não se enxerga uma luz no horizonte sombrio. As dificuldades emergem de todos os lados e o uso da fé para mudar uma situação trágica não tem surtido o efeito bíblico. Afinal, lemos que a fé é a certeza das coisas que se espera (Hebreus 11:01). A tradução pode estar certa, a interpretação que pode estar equivocada. Quando Deus permite que as coisas aconteçam como desejamos, é desta forma que acontece porque permitiu que assim o fosse. Muitas vezes Deus não (co)responde às nossas expectativas da fé. Por que, então, Deus desafiou para que o provasse (Malaquias 3:10)? Esta foi uma profecia contra Judá e Deus queria manter a relação com o seu povo escolhido que estava se tornando descrente e rebelde. Um grande equívoco que se faz é retirar o texto e aplicá-lo numa situação qualquer que nada tem a ver e ainda acusar Deus de que prometeu abençoar. Não conheço alguém que tenha retirado o texto em que Estevão estava sendo apedrejado e ele se manteve fiel em meio ao sofrimento. Se Estevão questionasse a Deus sobre aquela situação, estaria coberto de razão, porém, estaria utilizando a perspectiva humana da fé. A fé não é mercadoria de barganha que está disponível no balcão como um produto qualquer em que para ser abençoado basta ir à igreja e buscar.

O mundo religioso tem algo em comum, a fé. Todos falam que o exercício da fé é necessário para ser bem-sucedido. Não podemos negar que o mundo atual tem conhecimento da fé cada um do seu jeito e exerce a fé nas mínimas coisas. É um mundo literalmente conectado digitalmente e também pela fé. O acesso às informações trouxe muitas facilidades, porém, aumentou as dificuldades em saber qual é a verdade sobre muitas coisas, incluindo neste pacote, a fé. Não importa qual deus que se creia, a fé é o ponto convergente nas práticas religiosas. Cada segmento religioso fala de um formato diferente de fé e também são diversas as práticas que são aplicadas. Muitos acreditam que, quanto maior o sacifício, maior é a investidura da fé e maior e mais rápido será o retorno daquilo que se busca. Por exemplo, carregar uma cruz pesada por kilometros, caminhar uma longa distância descalço, praticar o auto-flagelo com chibatadas nas costas e tantas outras invenções que são meramente humanas e não estão na bíblia nada tem a ver com fé. Alguns defendem de que as pessoas não são abençoadas porque não utilizam da fé corretamente. Estes apresentam a fé como um produto e que não vem com um manual de instruções legível e se aproveitam disto e da ingenuidade das pessoas para conquistar a confiança. A associação da fé com o dinheiro é o que os oportunistas mais utilizam para atingir os seus objetivos. Eles nunca falam sobre o Reino de Deus porque ignoram o propósito do evangelho e perderiam muitos dos seus seguidores. Até citam alguns trechos isoladamente falando de um reino palpável, porém, a perspectiva é totalmente errada porque não é comida e nem bebida, mas, justiça, paz e alegria do Espírito Santo. Abordam sempre aquilo que as pessoas precisam de imediato, comida, emprego, ficar rico ou deixar de ser pobre e satisfazer os prazeres que a propaganda mal-intencionada induz na mente das pessoas. Satisfação imediata é a palavra-chave para conquistar a atenção e a fé é muito mais do que simplesmente acreditar. Há diversas referências de fé na bíblia. O texto de Tiago 1:3,4 talvez reflita melhor a jornada da fé. "...sabendo que a provação da vossa fé, uma vez confirmada, produz perseverança. Ora, a perseverança deve ter ação completa, para que sejais perfeitos e íntegros, em nada deficientes". Quando se fala em fé, a provação, a princípio, nada tem a ver com receber bençãos. Então, aquele conceito de que a fé é para apenas receber e nunca se dispor é um erro que a maioria dos “fiéis” cometa. Muitos abandonam a fé por causa da frustração em não ser abençoados. A perspectiva humana da fé é absolutamente frustrante. A única prática associada à fé é a perseverança.

Como exercer a fé conforme o texto de Tiago diante de um mundo libertário e libertino, religiosamente pluralista e os mais radicais são categorizados como extremistas fanáticos? Parece que não sobrou espaço que permita um posicionamento sem que as fagulhas deste mundo confuso atinjam o manto da integridade cristã. Optei pelo processo involutivo daquilo que conhecemos como fé. Aqueles que tiveram pela tradição familiar contato com a fé cristã, sempre ouviu falar que o pai da fé é Abraão. Os apóstolos Paulo e Tiago apresentam esta declaração nas suas cartas no Novo Testamento. Na verdade, todos aqueles que tem um relacionamento com Deus podem ser considerados como exemplos de fé. Nenhum destes utilizaram da fé como barganha. Tem alguns episódios bíblicos que tentaram saber quanto custava a fé. Em Samaria, onde João e Pedro evangelizavam havia um mágico por nome Simão. Muitos acreditavam que os seus dons eram divinos, pois, também fazia mágicas travestidas de milagres. Ele creu e foi batizado e acompanhava os apóstolos e se admirava com os milagres que aconteciam nas pessoas através da imposição de mãos. Como ainda faltava um bom caminho para a sua transformação, ficava com inveja desejando os dons perguntando aos apóstolos quando custaria aqueles dons e Pedro logo lhe repreendeu: “Que o seu dinheiro seja destruído junto com você, pois você pensou que com ele poderia adquirir o dom de Deus!” (Atos 8:20). Pedro alegou que o coração de Simão não era reto diante de Deus e não basta frequentar a igreja e ser batizado para se ter fé, é preciso integridade diante de Deus. A fé é o adubo dos frutos do espírito. A fé nunca foi uma moeda de troca para conquistar bens e alimentar a vaidade das pessoas. Ao acessar as redes sociais ou a televisão assistimos centenas de programas religiosos falando de uma fé estranha àquilo que a bíblia ensina. Fé do dízimo, fé da cura de doenças incuráveis, fé de ter a sua casa, fé para se ter uma casa ou emprego melhores, fé para conquistar muitos bens ou fé para ter uma igreja mais cheia. Eu creio em tudo isto, mas, antes de aplicar a fé, precisa saber quais são os pilares desta fé. A primeira coisa que a fé nos exige é reconhecer a soberania de Deus. Diante disto, não faz sentido que a fé esteja ao seu dispor naquilo que lhe convir. A vontade de Deus é soberana, além do mais, é perfeita, boa e agradável. Tudo o que se fala sobre fé tem princípio em amar a Deus acima de todas as coisas. Buscar o Reino de Deus em primeiro lugar e as demais coisas serão acrescentadas. A característica principal e maior da fé é o relacionamento com Deus. Isto não significa que tudo acontecerá conforme a nossa limitada visão. Pessoalmente tenho muitos questionamentos com Deus. Aconteceram algumas coisas que ainda são inexplicáveis e somente pela fé é que se consegue avançar na caminhada. Se eu continuar aguardando, na minha visão, uma resposta clara de Deus, ficarei estacionado. A fé diante da provação, das dificuldades e contrariedades é que me faz crescer no relacionamento com Deus se eu perseverar.

O propósito soberano de Deus é que alcancemos a graça pela fé. Nunca pelo nosso esforço, mas, sempre pela sua iniciativa em ser amplamente gracioso. Sofremos as consequências do pecado que está em nós. Nem tudo o que desejamos alcançamos porque este tudo que precisamos é da graça de Deus. O apóstolo Paulo já disse que bastava a graça de Deus. Ele sofria muito com doenças e espinho na carne que nunca foi revelado o que era. Foi preso, sofreu muitas privações e mesmo assim afirmou com humildade que a graça bastava porque a visão dele era com o Reino de Deus. Muitas vezes se usa a metáfora daquilo que valorizamos para se ter uma noção do que é composto o Reino vindouro. Nada é comparável, pois, as nossas preciosidades são matérias que são consumidas pelo tempo e o ser humano é que colocou valor. Por causa do pecado perdemos o valor e Deus, através de Jesus Cristo ressignificou o nosso valor para que herdássemos pela fé o seu Reino. Alguém, por acaso já ouviu um destes mercadores da fé falar sobre os valores do Reino de Deus? Estes valores não interessam a eles. A contraproposta do evangelho não se compra, pois, é o dom gratuito de Deus que é a vida eterna com Cristo. Todas as promessas de Deus e as propostas de fé apresentadas na bíblia são para alcançar o maior tesouro que é a vida eterna.